Greve mobiliza milhares na França para exigir aumento de salários

“Se não paramos, não nos escutam”, entoavam os grevistas, que exigiam um aumento salarial para compensar a inflação e denunciavam a resposta do governo à paralisação nas refinarias.

Na parte da manhã, na Gare de Lyon, uma estação ferroviária no leste parisiense, os usuários se armaram de paciência para pegar o trem. “Normalmente levo uma hora e meia. Hoje terei duas ou três pela frente”, disse Yera Diallo à AFP.

Frédéric Mercier Hadisyde, auxiliar de enfermagem, participou da marcha em Paris. “Temos que resistir. Todos os direitos estão sendo atacados. Se não fizermos nada, não conseguiremos nada”, disse à AFP.

Mais investimentos em escolas, hospitais e previdência social, abandono das reformas do seguro-desemprego e da mudança da aposentadoria de 62 para 65 anos e reajustes salariais estão entre as principais demandas.

No entanto, a gota d’água para quatro sindicatos e várias associações foi que o governo fez a requisição de funcionários em greve nas refinarias para aliviar a escassez de combustível nos postos de abastecimento.

Valérie, funcionária pública de 54 anos e membro da central sindical CGT, protesta “em solidariedade aos trabalhadores das petroleiras”. “Se as pessoas são requisitadas, onde está o direito de greve?”, questionou.

Estudantes, funcionários públicos, comerciantes, trabalhadores do setor de energia e dos transportes, entre outros, foram convocados para defender o direito à greve e exigir aumento salarial.

A paralisação, três dias antes de duas semanas de férias escolares, teve uma adesão desigual. Nos transportes, a região de Paris registrou os maiores distúrbios, ainda que moderados.

Salário de € 2.000

A greve que, de acordo com uma pesquisa do instituto privado Elabe, 49% da população desaprova, chega em um contexto social tenso e anuncia um outono e inverno quentes para o impulso reformista do presidente Emmanuel Macron.

O medo de perder poder aquisitivo foi a principal preocupação dos franceses durante o último ciclo eleitoral de abril a junho e o apelo para economizar energia para evitar apagões no inverno torna o ambiente ainda mais hostil.

Quando a França começava a virar a página da pandemia, a Rússia invadiu a Ucrânia, o que, juntamente com a resposta de Moscou às sanções ocidentais, fez disparar os preços da energia e dos alimentos.

Com a experiência do protesto social dos “coletes amarelos”, cujo estopim em 2018 foi o aumento dos preços dos combustíveis, o governo do presidente liberal Emmanuel Macron aprovou rapidamente medidas para limitar a alta dos preços da energia.

A França, segunda maior economia da União Europeia (UE), registrou em setembro a menor taxa de inflação harmonizada da zona do euro, 6,2%, abaixo de outras economias como Alemanha (10,9%), Itália (9,5%) e Espanha (9,3%), segundo o Eurostat (serviço de estatísticas do bloco europeu).

“Pedimos um salário mínimo de € 2.000, o que equivale a um aumento de € 300”, disse o secretário-geral da CGT, Philippe Martinez, na rádio RTL, defendendo ainda um reajuste de acordo com a inflação.

A demanda por um aumento de 10% motivou a greve da gigante energética TotalEnergies que começou no final de setembro e que causou, junto com a já cancelada greve da concorrente Esso-ExxonMobil, uma escassez de combustível.

A primeira-ministra francesa, Élisabeth Borne, garantiu à Assembleia Nacional que menos de 25% dos postos de abastecimento continuam a ter problemas, contra 30% no fim de semana, e pediu o fim da greve. 

“Superlucros”

Os grevistas da TotalEnergies rejeitam o acordo alcançado com uma maioria sindical de um aumento de 7% em 2023, que consideram insuficiente já que a empresa obteve mais de US$ 10 bilhões de lucro no primeiro semestre de 2022.

Ao se recusar a tributar esses “superlucros” em nível nacional, Macron colocou o governo “no campo dos grandes patrões, em total desconexão com grande parte dos franceses que sofrem com a inflação todos os dias”, segundo um editorial do jornal Libération.

O Executivo se dispõe até mesmo a recorrer a um polêmico método parlamentar, “provavelmente” nesta quarta-feira, segundo seu porta-voz. O chamado 49.3 permite aprovar o seu orçamento para 2023 sem a necessária votação da Assembleia Nacional (câmara baixa).

Com essa medida, o presidente corre o risco de reforçar sua imagem “autoritária”, apesar de ter prometido mudar após sua reeleição em abril, e tensionar ainda mais o ambiente antes da chegada da explosiva reforma previdenciária no início de 2023.

O atraso na idade de aposentadoria de 62 para 65 anos que Macron deseja implementar colide com a oposição frontal dos sindicatos, da esquerda e da extrema direita.

Sua primeira tentativa em 2019 e 2020 também gerou protestos massivos nas ruas, mas o líder de 44 anos, que fez dessa reforma um de seus cavalos de batalha, chegou a ameaçar dissolver a Assembleia, onde tem maioria simples, se não for aprovada agora.

Fonte: RFI
Data original da publicação: 18/10/2022

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