A desigualdade mundial de renda ameaça a viabilidade social e econômica, afirma um documento do Banco Mundial divulgado no dia 10 de abril, insistindo em uma nova mas poderosa retórica que também procede do Fundo Monetário Internacional (FMI). Enquanto as duas grandes instituições financeiras internacionais com sede em Washington realizam suas reuniões anuais, do lado dos ativistas antipobreza se reclama de ambas que coloquem essa retórica em prática.
“O presidente do Banco Mundial, Jim Yong Kim, e a diretora-gerente do FMI, Christine Lagarde, se manifestam abertamente contra o perigo de uma desigualdade disparada, mas há um longo caminho a percorrer”, disse à IPS o ativista Max Lawson, da organização Oxfam Grã-Bretanha. “Não há concessão entre crescimento e desigualdade”, acrescentou seu colega da Oxfam Estados Unidos, Nicolas Mombrial, para quem “não haverá crescimento inclusivo se a desigualdade econômica continuar fora de controle”.
Esta e outras organizações estão cobrando do Banco Mundial e do FMI que adotem ações concretas para enfrentar os problemas associadas com a desigual distribuição da riqueza em todo o mundo. As políticas do Fundo são especialmente criticadas por seus impactos negativos nas comunidades pobres e marginalizadas. “Nos agrada ver o FMI reconhecendo que as políticas drásticas de consolidação fiscal são um peso para o crescimento, algo que os sindicatos estão falando desde 2010”, afirmou Sharan Burrow, secretária-geral da Confederação Sindical Internacional.
“A destruição pelo FMI das normas trabalhistas e das negociações coletivas em vários países europeus, por exemplo, já apresenta importantes impactos na distribuição da renda e é possível que se intensifiquem daqui em diante. Pedimos uma urgente revisão e grandes mudanças nas políticas do Fundo sobre mercado de trabalho”, ressaltou Burrow.
Por seu lado, Lawson se referiu a três áreas que deveriam concentrar a atenção do Banco e do Fundo. “Em primeiro lugar, é preciso desenvolver uma medição mais adequada da iniquidade da renda. Há a necessidade de se examinar não só a renda dos 40% mais pobres, mas também os fluxos de renda dos 10% mais ricos”, pontuou. Por sua contínua e influente interação com os governos, o FMI está muito bem situado para impulsionar uma medição mais adequada da desigualdade.
“Em segundo lugar, deve-se reformar os sistemas de impostos”, continuou Lawson. “Não é justo um multimilionário pagar uma porcentagem de impostos menor do que a paga por um motorista de ônibus. E, em terceiro lugar, é essencial proporcionar cuidados na saúde e educação universal”, acrescentou.
A Oxfam afirma que os governos devem enfrentar de maneira mais enérgica a evasão fiscal e o sigilo financeiro. Junto a outras organizações, reclama também uma meta mundial para acabar com a extrema desigualdade nos debates sobre os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável que devem entrar em vigor a partir de 2015. Segundo a Oxfam, “não podemos esperar o triunfo na luta contra a pobreza sem enfrentar a desigualdade. A injustiça crescente está criando um círculo vicioso no qual a riqueza e o poder se concentram cada vez mais em poucas mãos, deixando o resto lutar pelas migalhas que caem da mesa”, destacou.
A desigualdade se converteu em tema destacado nos debates internacionais nos últimos anos, em parte porque no final da crise econômica mundial de 2088 os ricos se recuperaram muito mais do que os pobres, ampliando, portanto, a brecha da desigualdade. Uma nova lista de multimilionários publicada pela revista Forbes revela o alcance do problema. Segundo esses dados, apenas 67 pessoas possuem tanta riqueza quanto os 3,5 bilhões de pessoas mais pobres.
Nas reuniões do ano passado, o presidente do Grupo Banco Mundial, Jim Yong Kim, anunciou a meta da instituição de eliminar a pobreza extrema até 2030. Contudo, no dia 10, alertou que o crescimento econômico não é suficiente para conseguir esse objetivo. “Mesmo se todos os países crescessem com a mesma taxa que o fizeram nos últimos 20 anos, e a distribuição da renda se mantivesse igual, a pobreza mundial só cairá 10% em 2030, com relação aos 17,7% de 2010”, acrescentou.
Segundo Kim, “se queremos acabar com a pobreza extrema precisamos uma mira com raio laser para fazer o crescimento mais inclusivo e dirigir mais programas para ajudar diretamente os pobres”. Essa advertência foi destacada no documento publicado no dia 10 pelo Banco Mundial.
“Em países onde a desigualdade estava caindo, a redução da pobreza conseguida com uma determinada taxa de renda foi maior. Mesmo se não há mudanças na desigualdade, o poder redutor da pobreza que tem o crescimento econômico é menor em países que são inicialmente mais desiguais”, afirma o documento.
O informe insiste em que os governos e os doadores não podem perseguir somente o objetivo de tirar as pessoas da pobreza extrema, mas devem assegurar que as pessoas “não permaneçam presas à linha de pobreza por falta de oportunidades que as impede de progredir e obter melhores rendas”.
“A desigualdade persistente, na qual os ricos estão sempre em vantagem e o resto luta para se manter à tona, leva muita gente à frustração com o sistema”, disse à IPS a acadêmica Carol Graham, da Brookings Institution, um centro de pensamento com sede em Washington. Em recente comentário em um blog, Graham e outro pesquisador vinculam os recentes protestos no Chile, Brasil, Rússia, Turquia, Venezuela, Ucrânia, e inclusive a Primavera Árabe, à crescente diferença na renda.
“Os manifestantes não são pessoas que não têm nada a perder, mas pessoas de idade média, de renda média e com mais instrução do que a média da população, que estão descontentes pela injusta vantagem dos ricos e pela falta de oportunidade para os pobres”, afirmam os autores. Os descontentes “prototípicos” são “triunfadores frustrados”, acrescentam, ressaltando que “a extrema desigualdade é especialmente perigosa em países que estão em transição econômica e política”.
Fonte: Envolverde, com IPS
Data original da publicação: 14/04/2014