Representantes da Justiça do Trabalho e do Ministério Público avaliaram que será necessária uma mudança cultural para erradicar o trabalho infantil no Brasil. Essa posição foi apresentada, na quarta-feira (6), em audiência pública da comissão parlamentar de inquérito (CPI) que investiga o trabalho infantil.
Uma juíza e uma promotora relataram histórias de crianças e de adolescentes trabalhando em lixões, carvoarias e em casas de família para ilustrar casos mais facilmente denunciáveis, geralmente associados às desigualdades sociais. No entanto, elas lembraram que o trabalho ilegal de menores de 16 anos também ocorre com o incentivo dos pais, sem se dar conta de que estão explorando os filhos.
São casos ligados a crianças que ajudam no orçamento doméstico por necessidade de sobrevivência ou por mera tradição familiar ou cultural. Mesmo nesses casos, a representante da Associação Nacional dos Procuradores do Trabalho (ANPT), Valesca do Monte, ressaltou que o “pátrio poder não é ilimitado” e que o Estado deve incentivar a evolução do padrão cultural do País.
“O pai e a mãe não estão autorizados a fazer tudo o que eles consideram correto. Os padrões culturais não são imutáveis e devem evoluir, como evoluem as normas jurídicas e uma sociedade contemporânea”, disse Valesca do Monte. “Existe trabalho infantil com explorador, sem explorador, no seio familiar, na cultura indígena, em diversos segmentos. Sobre cada um deles, nós temos de aplicar um olhar especial, porém atento à norma constitucional, que não podemos transigir neste estágio civilizatório em que nos encontramos. É só isso que eu peço: que a gente não abra exceções.”
Definição de limites
Diretora da Associação Nacional dos Magistrados da Justiça do Trabalho (Anamatra), a desembargadora Silvana Ariano afirmou que há um frágil limite entre trabalho infantil, que é ilegal, e uma atividade laboral sem exploração. Segundo Silvana, esses casos são comuns principalmente nas áreas desportiva e artística. Ela citou uma recente proibição de desfile de modelos com menos de 16 anos no São Paulo Fashion Week.
“Aqui, além das determinantes econômicas, demográficas e institucionais, a questão cultural e a questão da ascensão social estão mais presentes. Como as meninas tão talentosas e bonitas podem ser alijadas de um evento como esse, só porque não têm 16 anos? Nesse aspecto, nós nos batemos com interesses econômicos muito poderosos”, disse Silvana Ariano.
A desembargadora defendeu a aprovação de um projeto de lei (PL 4968/13, do deputado Jean Willys – Psol-RJ) que permite trabalhos artísticos com menores de 16 anos, mediante pleno acompanhamento dos pais, bom desempenho escolar e assistência médica, entre outras condições.
Segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), o Brasil possui cerca de 3,5 milhões de crianças e adolescentes trabalhando ilegalmente. Minas Gerais, Bahia, São Paulo e Pará lideram a lista.
Ação da CPI
A relatora da CPI do Trabalho Infantil, deputada Luciana Santos (PCdoB-PE), reforçou a intenção de interromper o ciclo de exploração perpetuado por gerações. “Em um primeiro momento, estamos com o esforço de fazer o diagnóstico, mas o objetivo é erradicar e não permitir que nenhuma criança exerça o trabalho infantil, devido às repercussões que isso tem no seu futuro e no futuro do próprio País”, afirmou a deputada.
Entre as primeiras sugestões apresentadas pelos deputados na CPI do Trabalho Infantil estão o aprimoramento do sistema de “lista suja” de empresas que empregam menores de 16 anos e o fomento à educação em tempo integral associada à garantia de renda para a população carente.
Fonte: Agência Câmara Notícias
Texto: José Carlos Oliveira
Data original da publicação: 06/11/2013