Envelhecimento desafia empresas

Brasil está envelhecendo. A prova é que o número de profissionais com mais de 45 anos de idade vai mais do que dobrar nos próximos 30 anos no Brasil. Segundo um levantamento realizado pela consultoria PwC em parceria com a Fundação Getúlio Vargas (FGV), 57% dos profissionais em idade ativa terão ultrapassado os 45 anos em 2040. Hoje, eles correspondem a 24% da força de trabalho brasileira, que é composta, em sua maioria, por trabalhadores com idade média entre 30 e 44 anos de idade.

Embora seja uma tendência dos países em desenvolvimento, o envelhecimento da força de trabalho ocorre de forma acelerada no Brasil e esconde um grande desafio para as empresas, que precisam se preparar para lidar com essa nova realidade, mas demonstram resistências para contratar profissionais mais velhos. Para especialistas, essa postura tende a agravar o problema da falta de mão de obra qualificada e comprometer o crescimento das companhias. “Não há base científica que comprove a redução da produtividade do trabalhador mais velho. O que as empresas precisam é de uma gestão eficiente capaz de aproveitar o que esses profissionais têm de melhor, que é experiência e o conhecimento”, afirma João Lins, líder de Gestão do Capital Humano da PwC Brasil.

Contradição

Mesmo com a bagagem e o potencial dos profissionais mais velhos, a pesquisa aponta que 63% das empresas não enxergam essa força de trabalho como uma alternativa ao apagão de talentos e 70% delas acreditam que eles custam mais caro. E as restrições ao fator idade não param por aí. Metade das empresas prefere profissionais mais jovens quando a ocupação do cargo se dá por trabalhadores desempregados. Na disputa de vagas em condições de igualdade, os mais novos também levam vantagem.

Por outro lado, 94% das organizações reconhecem que o lado mais positivo da contratação de profissionais mais velhos é a transmissão de experiência e conhecimentos úteis para os mais jovens. Para 86% dos empresários, os profissionais acima de 60 anos são melhores em solucionar problemas. Além disso, são mais confiáveis; mais organizados e comprometidos no trabalho; mais equilibrados emocionalmente; e mais fiéis à empresa.

Para que a valorização dessa força de trabalho se traduza em ações práticas, primeiro as empresas precisam superar essa contradição. “Como no Brasil esta tendência é recente, é necessário considerar desde já práticas de gestão de idade. Se fala muito em Geração Y, mas não sobre o envelhecimento dessa geração no país”, alerta Maria José Tonelli, vice-diretora acadêmica da Escola de Administração de Empresas de São Paulo da Fundação Getúlio Vargas (FGV-EAESP). “Entendo que essa preparação inclui olhar práticas bem sucedidas em outros países que já contam com uma força de trabalho mais madura”, diz ela.

Mais da metade das empresas observa o fator idade na seleção

O diploma em um curso técnico e as mais de três décadas de experiência em um laboratório de medicamentos animais não foram suficientes para manter o gerente administrativo Jorge Luiz Cichon no cargo. Aos 52 anos de idade ele foi dispensado, nove meses após a aposentadoria. “Foi inesperado, porque eu já tinha 36 anos de casa. Em menos de um mês, eu e os outros três funcionários mais antigos da companhia fomos demitidos sem explicações”, lamenta Cichon, que durante um ano bateu à porta de mais de dez empresas até conseguir uma nova colocação.

A dificuldade de Cichon em voltar ao mercado de trabalho revela um cenário que ainda é predominante no Brasil: o empresariado não é muito receptivo a profissionais mais velhos na hora de contratar. O estudo da consultoria PwC e da FGV aponta que 58% das empresas consideram a idade um fator relevante para a seleção dos candidatos.

Mas, enquanto é empecilho para uns, a idade pode ser uma vantagem para outros. Aos 43 anos, Marcelo Vieira foi contratado pelo laboratório de biotecnologia da Novozymes, uma multinacional com unidade em Araucária. “A vaga era para um cargo de gerência e o perfil que eles procuravam era por um profissional experiente. Levei vantagem em relação aos candidatos mais jovens”, conta.

Apesar de não ter um programa específico para contratação de funcionários mais velhos, 24% dos empregados da Novozymes têm 45 anos ou mais. O presidente da multinacional na América Latina, Pedro Luiz Fernandes, explica que a idade não faz nenhuma diferença no currículo. “Contratamos quando as habilidades do candidato atendem às nossas necessidades, e nada mais”.

Embora a pesquisa aponte para restrições das empresas com relação ao fator idade, as informações que vêm do mercado mostram o contrário. “As empresas que nos procuram em busca de profissionais dificilmente impõem limite máximo de idade”, garante Thiago Sebben, gerente do escritório de Curitiba da Hays, consultoria de recrutamento de média e alta gerência.

Mas Sebben afirma que são poucas as empresas que adotam políticas específicas para inclusão destes profissionais. “Muitos empregadores fazem esforços para incluir pessoas com deficiência em seus quadros, mas nenhum reserva cotas fixas para funcionários acima de determinada faixa etária”, observa.

Faixa etária segue área de atuação

Um quadro de funcionários pode ser mais jovem conforme a área de atuação da companhia. É o que diz o gerente da consultoria de recrutamento Hays, Thiago Sebben. “O perfil da empresa está ligado diretamente à idade dos funcionários. Empresas de tecnologia da informação, por exemplo, exigem habilidades que a maioria dos profissionais das gerações passadas não possui”, explica. Das 20 melhores empresas para se trabalhar no Paraná em 2012, segundo o ranking da consultoria Great Place to Work Brasil, apenas quatro (Novozymes, Saraiva e Rezende, Rivesa e Apetit) têm mais de 20% do quadro de funcionários composto por profissionais acima de 45 anos.

No outro extremo da lista, as três empresas que têm menos pessoas nessa faixa etária são a DB1 (empresa de TI), com 1,9%, CISS (firma de Software), com 1,5%, e a Companhia Athletica, uma academia de esportes, que tem apenas um funcionário acima de 45 anos entre os 83 que compõem seu quadro (1,2%).

Previdência “agradece” retenção

Para o líder de Gestão do Capital Humano da PwC Brasil e coordenador da pesquisa, João Lins, além de ser “uma alternativa para a escassez de mão de obra especializada e para a sustentação do crescimento econômico”, a atração e retenção de profissionais também é uma saída importante para o equilíbrio das contas da previdência social.

Com a queda na taxa de crescimento da população brasileira e o envelhecimento da força de trabalho, a tendência é que haja uma sobrecarga no sistema de seguridade social, com o aumento expressivo do número de aposentadorias. A permanência de profissionais mais velhos no mercado, com medidas de incentivo por parte das empresas, poderia adiar o fim da carreira, já que 80% dos profissionais da geração Baby Boomers desejam continuar ativos no mercado de trabalho mesmo após aposentadoria.

Para isso, as empresas precisam fazer a sua parte, repensando suas práticas de gestão, oferecendo oportunidades de carreira e ações que incentivem a permanência desses profissionais. Hoje, mais de 70% das companhias não fazem nada disso.

Fonte: Gazeta do Povo
Texto: Cínthia Junges
Data original da publicação: 22/05/2013

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