A agência de emprego Work Global Brazil (nomes fantasia: “Governantas Filipinas” e “Global Talent”) e os empresários Leonardo Oscelavio Ferrada e Aguilar Noel Muyco, foram condenados pelo juiz Luis Fernando Feola, da 5ª Vara do Trabalho de São Paulo, ao pagamento de indenização por danos morais no valor total de R$ 9,8 milhões por agenciarem esquema em que trabalhadoras filipinas eram contratadas por famílias brasileiras para servirem como domésticas em regime análogo a de escravo. Cabe recurso da decisão, portanto, pode haver modificação da sentença até o trânsito em julgado.
A decisão judicial foi resultado de investigação do Ministério Público do Trabalho, que ajuizou ação civil pública em face dos réus e levou em conta os casos de 70 imigrantes filipinas que teriam sido trazidas ao Brasil agenciadas pelas empresas e que sofreram ameaças, tiveram seus documentos retidos, foram impedidas de sair das casas em que foram alocadas para trabalhar e ficaram meses sem descanso previsto em lei e no contrato de trabalho.
Além da multa, os réus ficaram proibidos de agenciar, aliciar, alojar ou acolher qualquer pessoa de nacionalidade estrangeira, com a finalidade de prestar serviços no Brasil sem o respectivo visto de trabalho. Além disso, devem fazer constar nos contratos firmados com os empregadores obrigação de respeitar a legislação trabalhista e previdenciária brasileira, inclusive quanto aos direitos do trabalhador doméstico, entre outras obrigações determinadas pelo juízo.
Ficam também proibidos de deduzir dos salários ou impor aos trabalhadores ou tolerar que seja imposto por terceiros, direta ou indiretamente, o pagamento de honorários e despesas de passagem por qualquer modo para ingresso e repatriação. O juiz determinou, ainda, que devem se abster de intermediar trabalhadores para cobrir ofertas de emprego no setor de serviços com países para os quais o Brasil não possua acordos bilaterais ou multilaterais para prevenir abusos e práticas fraudulentas em matéria de recrutamento e colocação em emprego, nos termos do que preceitua o art. 8.2 da Convenção 181 da OIT, e abster-se de utilizar visto de refugiado ou de turista para a inserção de trabalhadores estrangeiros no país com a finalidade de trabalho doméstico.
O valor da indenização será revertido para entidades sociais e para programas e campanhas de esclarecimento acerca dos direitos dos trabalhadores estrangeiros e de prevenção do tráfico de pessoas. Veja a sentença aqui.
Relembre o caso
São Paulo, 31/07/17 – Força-tarefa que uniu Ministério Público do Trabalho (MPT) em São Paulo e demais órgão parceiros investiga esquema de agenciamento de pessoas para trabalho doméstico em residências de alto poder aquisitivo no Brasil. As agências Global Talent e SDI são apontadas como responsáveis pelo aliciamento de trabalhadores em investigação que começou no MPT em 2014 contra a primeira empresa.
Segundo os documentos obtidos em diligência da força-tarefa nos escritórios das empresas, as estrangeiras são aliciadas nas Filipinas, em Chipre, Hong Kong, Dubai, Cingapura e no Nepal com falsas promessas de trabalho doméstico em residências de alto padrão em São Paulo.
As trabalhadoras pagam taxas de mais de U$ 2.500,00 (mais de R$7.000,00) à agência para serem trazidas ao Brasil, após serem enganadas por anúncios oferecendo vagas com salário de U$700,00 (cerca de R$2.200,00) e benefícios como décimo terceiro e bônus de horas extras. Ao chegarem, são conduzidas, sem contrato formal de trabalho ou qualquer garantia de direitos, a famílias dispostas a pagar mais de R$10 mil à agência em troca das trabalhadoras.
Nas residências, sofrem maus tratos e são submetidas a jornadas que podem ir das 6h da manhã às 8h da noite, de domingo a domingo. Há relatos de mulheres obrigadas a ficar à disposição dos patrões 24 horas por dia. Segundo documentos obtidos na fiscalização, 180 pessoas foram trazidas ao Brasil através dessas intermediações. Muitas delas não mantêm mais qualquer contato com a agência e vivem no Brasil sem identificação ou documentos regulares de imigração.
A Global Talent (na época chamada Domésticas Internacionais CMIS Brasil) está na mira do MPT desde 2014, após denúncia anônima encaminhada naquele ano pela Secretaria da Justiça de São Paulo (via Disque 100).
Segundo a denunciante anônima, quando chegou ao Brasil vinda das Filipinas teve seus documentos retidos, recebeu valor bem abaixo da remuneração prometida foi constantemente ameaçada de deportação caso tentasse denunciar.
Naquele mesmo ano, a Global Talent firmou Termo de Ajuste de Conduta (TAC) com o MPT comprometendo-se a formalizar ou auxiliar a formalização do contrato de trabalho de estrangeiros cuja mão-de-obra tivessem intermediado. Além disso, deveria regularizar documentos de trabalhadores contratados antes da entrada no território nacional, com obtenção de concessão de autorização de trabalho fornecida pelo Conselho Nacional de Imigração (CNIG) e também de visto temporário ou permanente fornecido pelo Ministério das Relações Exteriores. O acordo foi encaminhado ao Conselho Nacional de Imigração, Ministério do Trabalho e à Polícia Federal.
Em 2017, fiscalização do Ministério do Trabalho, a pedido do MPT, constatou que a Global Talent continuava intermediando mão de obra sem as devidas formalizações, o que reabriu as investigações. No mesmo ano, 3 filipinas fugiram das residências onde trabalhavam e recorreram à Missão Paz, que fez a denúncia formal ao MPT. Na mesma semana as trabalhadoras foram ouvidas pessoalmente no MPT-SP, sendo constatadas condições degradantes de trabalho. O Ministério do Trabalho participou da audiência no MPT em que ficou decidido que os órgãos, em conjunto, realizariam diligência nos escritórios dos denunciados.
Com informações da Assessoria de Comunicação do Ministério Público do Trabalho em São Paulo.
Fonte: Justificando
Data original da publicação: 24/05/2018