Quase um quinto dos acordos salariais firmados em janeiro resultou em redução de jornada e salários para o trabalhador. É o que mostra o “Salariômetro”, estudo elaborado desde 2007 pela Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas (Fipe). O levantamento aponta que houve um salto no número de negociações com imposição de perdas: de dois, em janeiro de 2015, para 50, de um total de 261 negociações firmadas no mês passado. Destes 50, 39 utilizaram o Programa de Proteção ao Emprego, criado pelo governo federal em 2015. A proposta permite a redução da jornada de trabalho em até 30%, com a respectiva diminuição do salário.
— De janeiro de 2015 a janeiro deste ano, foram feitos mais de 300 acordos com redução salarial. É um número pequeno no universo de 20 mil acordos coletivos que são feitos por ano, mas esse crescimento verificado entre os meses de janeiro mostra que há uma tendência de alta. A maior parte dos acordos de redução é na indústria metalúrgica, mas a tendência já está se espalhando para outras indústrias e agora para serviços — explica o economista Hélio Zylberstajn, professor da Universidade de São Paulo (USP) e coordenador do estudo.
Reajuste médio de 10%
Com o poder de barganha afetado pela recessão, que já extinguiu 1,5 milhão de vagas formais nos últimos 12 meses, os trabalhadores começaram o ano com dificuldades para obter ganho real nas negociações salariais. Segundo Zylberstajn, mais da metade dos 261 acordos coletivos negociados em janeiro não conseguiram sequer obter a reposição da inflação. O “Salariômetro” indica que a mediana dos reajustes com vigência em janeiro foi de 10%, 1,3 ponto percentual abaixo da inflação acumulada nos 12 meses anteriores, que foi de 11,3%, segundo o INPC, que serve como base para essas negociações.
— Durante mais de dez anos, observamos aumentos reais nas negociações coletivas. As empresas repunham a inflação e davam algo a mais. Mas, com a recessão que estamos vivendo, elas não estão conseguindo nem repor o INPC. O resultado é trabalhadores ganhando menos do que um ano atrás em termos reais. Há um ano, a negociação começava com a taxa de inflação e a negociação do ganho real. Agora, é quanto a menos vão ganhar. Hoje, o jogo é esse — ressalta o coordenador do estudo.
É o terceiro mês consecutivo em que, na média, os trabalhadores não obtêm aumento real. Há um ano, a realidade era exatamente oposta: como as expectativas para a economia eram menos pessimistas e a alta de preços, menor, os trabalhadores tiveram, em média, reajuste real de 1,3% sobre uma inflação acumulada de 6,2%.
Como as empresas estão pressionadas por aumento de custos e queda da demanda, o trabalhador fica sem alternativas e sem poder de barganha, complementa Zylberstajn:
— Quando as coisas estão bem, o trabalhador pressiona, e a empresa pode dar, porque está vendendo. Mas, agora, ela tem de cortar os custos. A posição da empresa é essa: ou vocês concordam com um ajuste mais modesto, ou vamos ter de demitir. Esse é o jogo na mesa da negociação. Infelizmente.
Reversão só com crescimento
Para o economista, a trajetória de queda do ganho real ainda está longe de ser revertida:
— Isso é consequência da situação da economia. Essa tendência só se reverterá quando a economia voltar a crescer. Daí as empresas vendem, contratam. Mas isso não é imediato. Para a gente ver essa reversão, o primeiro ponto é o Brasil voltar a crescer.
Ainda de acordo com o estudo da Fipe, a mediana dos pisos com vigência em janeiro de foi R$ 940 (6,8% maior que o salário mínimo, de R$ 880).
Fonte: O Globo
Texto: Daiane Costa
Data original da publicação: 23/02/2016