O economista e professor Antonio Corrêa de Lacerda, da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP), criticou as medidas de ajuste fiscal propostas pelo governo e disse que, em vez de tirar recursos de benefícios dos trabalhadores, o Executivo deveria estimular a realização de uma reforma tributária complexa no país. As observações foram feitas durante palestra de abertura do seminário da CUT sobre política econômica e reforma política, que acontece durante todo o dia de hoje (4), no Senado.
Para Lacerda, o grande mote do ministro da Fazenda, Joaquim Levy, no sentido de implementar os ajustes, é o resgate da confiança no país pelo mercado. Segundo o economista, existe atualmente um conjunto de fatores que justificam, de fato, a realização de um ajuste fiscal no Brasil, mas ele vê “um ponto fora da curva” nas medidas adotadas até agora, “quando se fala em corte de benefícios sociais de R$ 18 bilhões e se tem entre R$ 15 bilhões a R$ 16 bilhões saindo pelo ralo em taxas de juros”. A referência foi sobre medidas provisórias (MPs 664 e 665) editadas no final do ano passado e atualmente em discussão no Congresso, que dificultam acesso a benefícios previdenciários e trabalhistas.
“Deveríamos ter a tributação de grandes fortunas e de heranças e não dos trabalhadores”, ressaltou Lacerda. Arrecadamos muito pouco, por exemplo, de Imposto de Renda na fonte das pessoas mais ricas. Uma reforma tributária para valer teria que cuidar destas grandes questões”, acrescentou.
Perda de qualidade
O professor ressaltou também que, em sua avaliação, não está convicto de que as medidas de ajuste trarão o resultado que se espera. A seu ver, o governo precisa criar formas de estímulo à produção industrial e à capacitação dos trabalhadores do setor produtivo. “Quando a gente abre o Caged (cadastro de empregados formais do Ministério do Trabalho), vê que a elevação da taxa de empregos registrou uma perda de qualidade nos empregos gerados nos últimos anos. Os melhores salários estão no setor que está desempregando, que é a indústria”, reclamou.
De acordo com Lacerda, o Brasil tem uma das melhores economias do mundo, mas a produção industrial ficou estagnada – e essa situação, a seu ver, não está associada à capacidade física do setor. O problema central, apontou, está nos juros altos e nas condições desfavoráveis, além da incapacidade de competitividade com os produtos importados observada nos últimos dez anos.
Para o professor, enquanto a produção industrial cresceu muito pouco nas últimas décadas, o consumo expandiu muito e quem cobriu essa diferença para atender à demanda foram os produtos importados. Isso deu conforto aos consumidores brasileiros, mas por outro lado, retirou empregos do país. “Esse processo tem levado à desindustrialização. A nossa indústria de transformação está perdendo qualificação, enquanto na maioria dos países em desenvolvimento acontece o contrário, há um processo de fortalecimento da indústria.”
Crise aguda
Lacerda lembrou que houve também, nos últimos anos, aumento da participação dos componentes importados e do próprio produto importado finalizado no país, o que levou a uma dependência das importações de produtos básicos. “Sem uma reversão desse processo, poderemos chegar a uma crise aguda futuramente”, frisou.
O seminário organizado pela CUT conta com a participação de representantes de entidades diversas, deputados e senadores, que se encontram no auditório Petrônio Portela, do Senado. À noite, a central realizará um ato para marcar o lançamento do seu 12º congresso nacional (Concut), programado para 13 a 16 de outubro, em São Paulo.
A mesa seguinte, sobre os rumos da economia brasileira, reune Alexandre Conceição, da coordenação nacional do Movimento dos Trabalhadores Rurais sem Terra (MST), o economista Marcio Pochmann, presidente da Fundação Perseu Abramo e a deputada Jô Moraes (PCdoB-MG), tendo como moderador o diretor técnico do Dieese, Clemente Ganz Lúcio.
Fonte: Rede Brasil Atual
Texto: Hylda Cavalcanti
Data original da publicação: 04/03/2015