Com a virada do ano, cidadãos de Romênia e Bulgária – países que entraram na União Europeia há sete anos – ganharam o direito de viver e trabalhar em qualquer Estado-membro do bloco. A novidade despertou temores, sobretudo entre os mais conservadores, de que, ante uma eventual migração em massa, búlgaros e romenos possam representar uma ameaça ao mercado de trabalho e ao sistema de seguridade social da Alemanha.
Coautor de um estudo sobre imigrantes dos dois países, o pesquisador Herbert Brücker, do instituto alemão IAB, rechaça tal possibilidade. Em entrevista à DW, ele diz que não se trata de uma migração da pobreza, mas de uma chance de lucro para os cofres públicos da Alemanha.
“A maioria dessas pessoas vai trabalhar, pagar seus impostos e obrigações fiscais. E a economia do país vai ganhar com isso”, afirma.
Deutsche Welle: Por que o senhor acredita que as preocupações com relação à livre circulação de trabalhadores não se justificam?
Herbert Brücker: Não se trata de uma ampliação das possibilidades de obter benefícios sociais. Nesse quesito nada vai mudar. Trata-se da criação de novas possibilidades de ocupação: até agora, os romenos e búlgaros só podiam trabalhar na Alemanha com contratos temporários e se fossem aprendizes ou universitários recém-formados. Agora, o mercado de trabalho está aberto para todos. Esperamos um fluxo migratório de 100 mil a 180 mil pessoas da Bulgária e da Romênia para a Alemanha. A maioria dessas pessoas vai trabalhar, pagar seus impostos e obrigações fiscais. E a economia do país vai ganhar com isso.
De que forma?
As pessoas que vêm para cá para trabalhar contribuem, sobretudo, para os sistemas de previdência e segurança social, mas também para as seguradoras de saúde e outros. Isso traz um lucro líquido para os cofres públicos. Um lucro maior que os gastos com benefícios sociais, como aqueles com a ajuda social chamada Hartz 4.
Que tipos de trabalho essas pessoas vão exercer?
No momento, os imigrantes da Bulgária e da Romênia trabalham em sua maioria por temporada, seja na agricultura ou nos setores hoteleiro e de gastronomia. Temos também um bom contingente de imigrantes desses países nas áreas de saúde e assistência a idosos e necessitados. Acredito que esse percentual vá diminuir na agricultura, mas venha a aumentar em outros setores. O que deverá também crescer é o número de trabalhadores na construção civil, mas também em outras áreas de prestação de serviços e no setor industrial.
Como os búlgaros e romenos vivem hoje na Alemanha?
De um lado, há migrantes altamente qualificados: mais de 20% deles possuem curso superior completo, e 18% estão frequentando escolas ou cursos profissionalizantes. São estudantes em sua maioria. Ou seja, temos um segmento altamente qualificado ou que está se qualificando na Alemanha e terá provavelmente mais tarde bons empregos. Já 40% desses imigrantes não têm uma formação profissional completa – são em sua maioria trabalhadores temporários. E aí temos também um percentual de talvez 35% de imigrantes com formação profissional completa, que atuam como operários ou trabalhadores especializados na assistência a idosos ou similares. Ou seja, é preciso ter cautela com as generalizações. A maioria dos búlgaros e romenos que trabalham na Alemanha paga impostos e cumpre com suas obrigações fiscais. São trabalhadores que migraram e não se trata de uma migração da pobreza.
Ou seja, não vai haver uma migração da pobreza.
Também vai acontecer uma migração da pobreza, mas a grande maioria dos imigrantes desses países vai ter uma ocupação na Alemanha.
Na região do Vale do Ruhr, a situação é, porém, ruim. Não há riscos de que muitos migrem para a Alemanha a fim de usufruir de benefícios sociais?
Trata-se naturalmente de uma mistura: 10% dos búlgaros e romenos na Alemanha usufruem da ajuda social (Hartz 4) – uma média mais baixa que aquela que recebe esse tipo de ajuda entre a população total do país, com 16% de pessoas usufruindo desse benefício. Entre a população originária alemã, o percentual é de 7,5%. E não acredito que esse percentual vá aumentar entre romenos e búlgaros. Pelo contrário: em função das novas possibilidades de emprego, o percentual poderá ser até mesmo reduzido. Embora haja obviamente uma parcela de pessoas que não trabalha e usufrui de benefícios. Essas pessoas vivem sobretudo em determinadas cidades do país, como Berlim, Duisburg e Dortmund, mas também em Offenbach e Colônia. Nesses lugares a situação é bem diferente da média no resto da Alemanha.
O senhor afirma que apenas 10% dos búlgaros e romenos usufruem de benefícios sociais. Eles seriam os imigrantes exemplares?
Isso também não procede. Os búlgaros e romenos têm, no momento, menos possibilidades de trabalhar. Sendo assim, a possibilidade de se tornar desempregado também é menor, pois uma pessoa só pode ser considerada desempregada se tiver trabalhado antes. Há ainda um grupo populacional que não usufrui de benefícios fiscais, nem é economicamente ativo. Trata-se, nesse caso, de aproximadamente 30% a 40% dos búlgaros e romenos na Alemanha. E esse não é um percentual demasiadamente alto se comparado ao registrado entre alemães nativos ou a outros grupos de estrangeiros. Mas nas cidades citadas do Vale do Ruhr e em Berlim esse percentual é de 65%, chegando até a mais de 70%. São pessoas que vivem de esmolas, trabalho ilegal e similares. Esses são problemas difíceis para as prefeituras locais.
“Quem engana, cai fora”, diz o partido conservador União Social Cristã (CSU). Essa é uma postura correta?
Temos muito poucos casos, talvez em torno de cem, de falcatruas comprovadas. Ou seja, não se trata de forma alguma de um fenômeno de massa, mas de casos isolados. Analisamos também casos de autônomos: alguns búlgaros e romenos vêm para a Alemanha, registram-se como supostos autônomos e usufruem de benefícios fiscais e sociais. Trata-se de duas mil pessoas, ou seja, um número também não muito alto. Não é tampouco verdade, como costumam dizer, que temos um altíssimo número de pessoas recebendo o dinheiro que o Estado destina aos pais com crianças no país. Somente 8,8% dos romenos e búlgaros na Alemanha recebem esse benefício. Entre a população alemã esse percentual é de 11%, entre outros estrangeiros de 15%. De acordo com os dados analisados não há, até agora, nenhuma prova de que haja qualquer abuso de benefícios por parte dos imigrantes desses dois países. Nesse sentido, os búlgaros e romenos não podem de forma alguma serem acusados de má conduta.
Fonte: Deutsche Welle
Entrevistador: Christian Ignatzi
Data original da publicação: 02/01/2014