Veja o que diz a legislação sobre este tema complexo e que pode motivar questionamentos de patrões e empregados.
Dhyego Pontes
Fonte: Jota
Data original da publicação: 24/02/2020
Em matéria recente do Valor Econômico, o jornal relatou uma série de casos ocorridos ao longo dos últimos 15 anos nos Estados Unidos com executivos(as) que foram afastados(as) ou renunciaram a seus cargos após a revelação de que mantinham relacionamentos amorosos no trabalho com subordinados(as), colegas de hierarquia ou mesmo – como em uma das empresas citadas – com funcionários(as) de companhias fornecedoras.
Aproveitando o gancho da reportagem, no artigo de hoje gostaria de abordar o tema levando em conta o contexto trabalhista nacional. Afinal de contas, é permitido ou não ter um relacionamento afetivo no ambiente de trabalho em nosso país?
O que diz a legislação brasileira sobre os relacionamentos amorosos no ambiente de trabalho?
Tomando como ponto de partida o Artigo 5º do Inciso X da Constituição Federal, Tribunais da Justiça do Trabalho tem estabelecido o entendimento de que as empresas não podem estabelecer regras que violem a intimidade e a vida privada de funcionários, sendo, portanto, permitido o relacionamento amoroso entre colegas no ambiente trabalhista brasileiro.
É preciso frisar, todavia, que as empresas podem fazer uso de seu poder diretivo, previsto no Artigo 2º da CLT, para vedar, por exemplo, demonstrações exacerbadas de afeto, práticas que desrespeitem outros colegas ou mesmo uma postura que comprometa a produtividade e a qualidade do trabalho desempenhado dentro de uma empresa, sob o risco de demissão por justa-causa, seja por incontinência de conduta ou mau procedimento ou mesmo por desídia no desempenho de funções, pontos previstos no Artigo 482º da CLT.
E nos casos de relacionamento entre funcionários de hierarquias diferentes?
A questão da subordinação é uma pauta delicada em se tratando de relacionamentos afetivos dentro de um ambiente de trabalho, uma vez que pode abarcar desde casos mais complexos, como a coerção ou assédio, até questões menos graves, mas que podem comprometer o desempenho de uma equipe, como no caso, por exemplo, do favorecimento do(a) colaborador(a) com o(a) qual se tem um relacionamento.
Embora, como frisado acima, a Constituição Federal proíba as empresas de “legislar” sobre a vida privada de seus funcionários, é possível estabelecer regras – que devem ser de conhecimento geral e aceitas em comum acordo – para, por exemplo, que funcionários que possuem relação de subordinação passem a atuar em áreas diferentes ou sejam realocados.
O que empresas e empregados também devem levar em consideração
Dentro deste contexto, por parte das empresas é fundamental que haja uma política clara sobre o relacionamento afetivo dentro do ambiente corporativo, não com o intuito de proibir (uma vez que a proibição é vedada pela Constituição Federal), mas sim de orientar os colaboradores sobre a postura adequada dentro da empresa, do ponto de vista ético e tendo em vista a manutenção da produtividade e da eficiência no exercício de um função.
Em caso de dúvidas sobre o tema, a companhia sempre pode buscar o suporte de especialistas, seja para definir suas políticas de gestão de recursos humanos ou mesmo para esclarecer pontos relacionados a legislação trabalhista e sua posição sobre possíveis relacionamentos afetivos na empresa.
Em relação aos colaboradores, é sempre válido atuar de modo ético, transparente e com bom senso, respeitando colegas, não comprometendo seus desempenhos e, acima de tudo, levando em consideração a máxima de que relacionamento afetivo com um(a) colega de trabalho é diferente de relacionamento afetivo no trabalho.
Dhyego Pontes é consultor trabalhista e previdenciário da Grounds.