Documentário The True Cost e a realidade da relação capital-trabalho na contemporaneidade

Bárbara Suellen Santos da Silva

O mundo do cinema, da televisão e das demais formas de arte vêm sendo ao longo de anos instrumento para naturalizar em homens e mulheres a ideologia dominante. No entanto, é importante que vejamos e coloquemos em evidência àquelas produções que se propõem esclarecer, de forma crítica, as nuances das relações que determinam o rumo da sociedade. Aqui queremos dar um breve relato sobre o documentário The true cost, de Andrew Morgan, sob o âmbito da relação capital-trabalho e sua reconfiguração desde a reestruturação produtiva dos anos de 1970, onde a vida de milhares de trabalhadores em todo globo foi reprojetada. Minha análise vem como forma de esclarecer de um movimento que segue em marcha para desvalorização cada vez maior do trabalho e dos que vivem dele.

Cartaz do documentário “The True Cost”. Fotografia: Divulgação/Truecostmovie

Há quinze dias completaram-se 2 anos do desabamento do Raza Plaza em Dhaka, Bangladesh. Tratava-se de uma fábrica têxtil, que terceirizava serviços de costura para grandes marcas de roupas. O documentário The true cost retrata a indústria da moda chamada de “fast fashion” (moda rápida). Chamou-me atenção, sobretudo, a narrativa dialética que o diretor Andrew Morgan faz de toda a dinâmica do processo e o percurso da mercadoria dentro do circuito produtivo têxtil, que vai do plantio do algodão no Texas (e as tantas questões aí envolvidas, como a biotecnologia que leva à maior rede de monopólio do ramo – Monsanto) às roupas já prontas. Os dados são tão impressionantes que faz o telespectador, mesmo o que já tenha noção de como funciona o sistema, ficar boquiaberto.

É comum no capitalismo, sobretudo com a mundialização (globalização) do capital, com a expansão territorial dos mercados, a apropriação da força de trabalho barata em lugares onde o custo mínimo para grandes empresas. A indústria de vestuário nos EUA, até os anos de 1960, tinha quase que 100% da sua produtividade situada dentro do país. Após esse período, apenas 3% ainda se mantém lá. Ou seja, 97% da produção de roupas norte americanas são terceirizadas. E onde, além da China? Na India! O deslocamento da produção, que abriu espaço para a financeirização da economia, não é uma máxima apenas neste tipo de indústria.

Este “acidente” que ocorreu em Bangladesh não foi o único decorrente das precárias, péssimas, terríveis condições dos locais de trabalho, que estavam cobertos de rachaduras. Outras fábricas também registraram acidentes graves como, por exemplo, grandes incêndios.

Trata-se de uma longa discussão, que não cabe numa nota. No entanto, é interessante dizer que o capitalismo não se desenvolve de forma igual: ele é, antes de mais nada, nutrido pelas diferenças, pelas contradições. A posição periférica de alguns países (como o Brasil) é condição para plena manutenção deste sistema: somos nós a fornecer força no motor da acumulação do capital, seja em momentos de crise ou não. E isso é condição para degradação da condição humana.

Você já imaginou trabalhar pra ganhar 10 dólares por mês? Era o que uma das trabalhadoras entrevistadas no documentário disse já ter recebido numa fábrica em Bangladesh. $10 por mês! São situações perpetuadas em diversas áreas de produção e, ao longo dos anos de manutenção capitalista, vem se expandindo para outros setores como, por exemplo, o de serviços.

O horizonte é tenebroso: seja no Brasil, em Bangladesh ou na China!

No mais, sugiro que assistam o documentário.

Informações

Título: The True Cost
Ano: 2015
Duração: 92 min.
País: França
Diretore: Andrew Morgan

Encontra-se disponível para assinantes do serviço Netflix.

Mais informações: página oficial do documentário, IMDb, Wikipédia (inglês).

Trailer do filme (legendas em português):

Bárbara Suellen Santos da Silva é mestranda no Programa de Pós-Graduação em Sociologia pela Universidade Federal de Alagoas. Desenvolve pesquisa com ênfase em teoria, trabalho, classes sociais e sindicalismo.

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