Dia do Trabalhador Doméstico é lembrado sem regulamentação de direitos

Um ano depois da promulgação da Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 72, que estende aos domésticos os mesmos direitos dos demais trabalhadores, benefícios como o recebimento do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS) e de horas extras ainda estão no papel. No último dia 27 de abril, empregados domésticos passaram o aniversário da padroeira Santa Zita de Lucca, escolhido como Dia do Empregado Doméstico, com a sensação de não ter tanto o que comemorar.

“Houve tumulto, muita gente dispensada e conclusão: nada foi regulamentado, tudo ficou parado. Mais uma vez nossos parlamentares faltaram com o respeito à categoria. A única coisa que está vigorando é a jornada de trabalho de 44 horas para todos e a assinatura de folha de ponto. O resto dos direitos, o que realmente interessava, ficou parado”, disse o fundador e presidente do Sindicado dos Trabalhadores Domésticos do Distrito Federal, Antônio Ferreira Barros.

Depois de tramitar dez anos no Congresso, a PEC 72 foi aprovada pelo Senado, em 2013, e seguiu como projeto de lei para a Câmara para ser regulamentada. O texto ainda não é consensual. Pontos como o pagamento do FGTS geram discórdia entre representantes de empregados e empregadores – que argumentam que a obrigatoriedade de uma contribuição muito alta resultará em demissões em massa. Outras divergências também se referem ao valor da contribuição ao Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) e do que se entende por trabalho noturno, por exemplo.

“Os pontos que não são consensuais têm de ser debatidos. Há, de fato, demora, mas os canais de comunicação com a categoria têm de ser priorizados. Há setores que falam em urgência na aprovação, mas é preciso que a proposta atenda às necessidades e seja coerente”, explicou a pesquisadora da organização não governamental SOS Corpo Verônica Ferreira.

A organização promoveu na segunda-feira (28/04), no anfiteatro do Centro de Ciências Sociais Aplicadas da Universidade Federal de Pernambuco, no Recife, uma série de seminários sobre os direitos dos empregados domésticos, com ênfase na saúde do trabalhador e nas garantias previdenciárias, como aposentadorias e auxílios em caso de acidente.

Para uma das palestrantes dos seminários, a professora da UFPE Kaliani Rocha, apesar da sensação de retrocesso causada pela lentidão do vigor dos direitos trabalhistas, a categoria tem, sim, de comemorar. “É um tema que acabou servindo de pauta para várias discussões no Brasil, entre as famílias e, especialmente, nas áreas do direito e da sociologia do trabalho. As pessoas passaram a perceber melhor esses trabalhadores. Eles ganharam visibilidade. É uma luta de classes e estamos na luta para que consigamos amenizar essa injustiça secular que temos”, analisou a professora.

Segundo ela, demissões em massa que eram esperadas em decorrência da extensão dos direitos trabalhistas aos empregados domésticos acabou não surtindo efeito. Ainda que muitos funcionários tenham sido liberados, a maioria acabou sendo recontratada em seguida, ainda que em casas diferentes. “Houve, sim, demissões, pois os empregadores não queriam garantir os direitos. E isso quer dizer muito sobre a classe dominante que temos no Brasil. Estamos em uma luta e esperamos justiça social”, disse Kaliani.

Doméstica há mais de 20 anos, Ana Vaz Cardoso disse que nem a aprovação da lei e nem a falta de regulamentação afetaram sua vida. Por outro lado, tem esperança de um dia poder contar com o FGTS. “Eu tenho expectativa de receber o FGTS porque sempre me pagaram tudo certinho”, disse. “Graças a Deus nunca fui ameaçada de demissão por conta da nova lei”, acrescentou.

De acordo com a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad) do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), referentes ao último trimestre de 2013, 31,1% dos trabalhadores têm carteira assinada. O alto índice de informalidade é uma realidade para os empregados domésticos.

Recentemente, foi sancionada uma lei que prevê o pagamento de multa caso o patrão não assine a carteira do funcionário. Ainda assim, essa tentativa de formalização esbarra nas dificuldades de fiscalização.

Essas mesmas dificuldades afetam o cumprimento de medidas de segurança obrigatórias a todos os trabalhadores, como o uso de equipamentos de segurança no exercício de atividades perigosas e adicional de insalubridade. “A questão da saúde do trabalhador tem de ser tratada. Não temos nem dados sobre isso, não sabemos o que é considerado um acidente de trabalho no caso dos empregados domésticos. Há uma invisibilidade. Essa é uma discussão que precisamos engrossar junto com a luta pela regulamentação [da norma]”, explicou a professora Kaliani Rocha.

Fonte: Agência Brasil
Texto: Talita Cavalcante
Data original da publicação: 27/04/2014

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