No Brasil, mais da metade da população vive com menos de um salário mínimo. Enquanto 50% dos trabalhadores ganham até R$ 747, o grupo de 1% dos mais ricos ganha R$ 27,08 mil, ou seja, 36,3 vezes mais. Os dados são do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Essa desigualdade social não é restrita somente à renda. Na hora de pagar impostos, o peso é muito maior para aqueles que ganham menos. Segundo levantamento do Conselho Nacional de Economia (Cofecon), 72% dos tributos estão concentrados no consumo e nos salários. “O sistema brasileiro é muito injusto porque não há diferenciação na hora de comprar e pagar. Uma pessoa que tem um Fusca e outra que tem um carro de luxo pagam o mesmo imposto na gasolina. Proporcionalmente, o impacto é muito maior no bolso de quem ganha menos”, compara o presidente do Instituto Brasileiro de Planejamento Tributário (IBPT), João Eloi Olenike.
Segundo Olenike, nos Estados Unidos e em alguns países da Europa, é o contrário. “Lá, é 25% de imposto sobre consumo e 75% sobre riquezas. Primeiro, eles estimulam a pessoa a acumular um patrimônio. Só depois é que o imposto fica maior. Já aqui no Brasil tributa-se tudo antes, o imposto é sobre o faturamento e não sobre o lucro. O resultado é que tudo é repassado para o preço final, e quem paga é o consumidor”, critica.
Para driblar um pouco a elevada carga tributária, a auxiliar de escritório Rosângela Souza dos Santos, 37, parte para a pirataria. “Eu compro muitos joguinhos eletrônicos e DVDs piratas, pois, se fosse para comprar o original, não teria condições. Acho que é porque tem muito imposto”, afirma.
No caso do DVD, a carga tributaria é de 44%, de acordo com um estudo do IBPT. Isso significa que para cada R$ 10 pagos, R$ 4,40 vão engordar os cofres públicos. Uma pesquisa da Federação do Comércio de Minas Gerais (Fecomércio) mostra que 61% dos consumidores admitem já terem comprado piratas e 83% justificam a atitude devido ao preço.
Segundo o conselheiro do Cofecon Felipe de Holanda, entre 2002 e 2012 o Brasil viveu um boom de empregos e melhoria na renda, que está se invertendo. “O conjunto de programas sociais como Bolsa Família, Minha Casa, Minha Vida e Fies, e a facilidade do crédito consignado diminuíram a desigualdade, mas, agora, o movimento é de reversão”, diz.
Na avaliação de Holanda, a solução passa pela reestruturação do sistema tributário. “Temos que reduzir a complexidade e a redundância. É preciso tributar mais a riqueza. Isso poderia ser resolvido com a criação de um Imposto sobre Valor Agregado (IVA) capaz de reunir tributos como ICMS, ISS, IPI. Outra mudança que precisa ser feita, além de uma política econômica que gere emprego e renda, é a redução das contribuições sociais”, ressalta Holanda.
O Cofecon coordena uma campanha de combate à desigualdade social. “É um debate que precisa ser levado para a sociedade, para ajudar a construir um consenso”, destaca Holanda.
Carga tributária
No Brasil
Impostos sobre consumo: 56%
Impostos sobre a renda de trabalho: 16%
Impostos sobre patrimônio e riquezas: 28%
Média mundial
Impostos sobre a renda do capital: 67%
Impostos sobre o consumo e renda do trabalho: 3%
Fonte: Cofecon/OCDE
Transação em dinheiro será declarada
Desde a segunda-feira (01/01), as transações em espécie em valor igual ou superior a R$ 30 mil terão que ser informadas à Receita Federal. Quem recebe é que está obrigado a declarar. A norma entra em vigor após a maior apreensão de dinheiro vivo da história do país – os R$ 51 milhões no apartamento em Salvador usado pelo ex-ministro Geddel Vieira Lima.
As movimentações terão que ser declaradas por meio da Declaração de Operações Liquidadas com Moeda em Espécie, no site da Receita. Quem não declarar ou prestar a informação incorreta ficará sujeito a multa de 1,5% a 3% do valor.
Mercado aguarda cortes na nota do país
O adiamento da votação da reforma da Previdência para fevereiro pode ter um efeito colateral frustrante: fazer com que as agências de classificação de risco de crédito antecipem o rebaixamento da nota do Brasil. Segundo especialistas ouvidos pela reportagem, a agência Standard & Poor’s seria a primeira a tomar essa decisão. Moody’s e Fitch acompanhariam o movimento, deixando o país ainda mais distante do selo de bom pagador.
Na última semana, circularam no mercado informações de que a S&P poderia rebaixar a nota do Brasil já no início do ano. Atualmente, o país tem nota BB na agência, dois degraus abaixo do chamado grau de investimento – nota dada aos países que têm um caixa robusto para quitar as suas dívidas. Logo após o adiamento da votação da reforma, Moody’s e Fitch alertaram para o impacto negativo.
Diante do tom mais duro, o ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, afirmou que conversaria com as agências. Para especialistas, porém, a chance de aprovação é remota – e as agências teriam avaliação parecida. O fato de 2018 ser ano eleitoral pode tornar as agências ainda mais cautelosas, avalia Silvio Campos Neto, da consultoria Tendências. “Elas podem antecipar esse ajuste”.
Expectativa
Promessas. Uma agenda pró-reforma da Previdência seguraria as agências, que olham o compromisso, afirma Rodrigo Melo, economista-chefe da Icatu Vanguarda.
Fonte: Jornal O Tempo
Texto: Queila Ariadne
Data original da publicação: 02/01/2017