Democracia e Direitos Fundamentais: uma revista eletrônica para pensar e defender o Estado democrático de direito. Conversa com Rogério Viola Coelho

Imagem: DDF

por Igor Natusch

A partir de um olhar crítico, não é difícil perceber que o Brasil tem vivido, nos últimos tempos, um processo de relativização e destruição de direitos. Suspensão de garantias, precarização do acesso à saúde e educação, instauração de um regime de terror policial nas comunidades de baixa renda, desmonte de sindicatos, esvaziamento de mecanismos voltados à defesa dos trabalhadores… Os exemplos, infelizmente, são inúmeros, e cada um deles ajuda a explicar um pouco o cenário terrível vivido atualmente no Brasil e no mundo.

É pensando nessas coisas que surge o Democracia e Direitos Fundamentais. Seu principal objetivo é sistematizar e disponibilizar on-line artigos sobre teoria da democracia, direitos fundamentais e filosofia política, em um ambiente de cooperação intelectual e de defesa do Estado democrático de direito.

Os conteúdos são organizados em formato de revista eletrônica, buscando uma unidade temática e promovendo um debate aprofundado sobre os ataques promovidos pelo pensamento autoritário, nas mais diferentes esferas. Além de textos, o espaço traz conteúdos em áudio e vídeo, dinamizando as formas de acesso ao conteúdo debatido. A segunda edição, com o tema “Direitos fundamentais e o novo mundo do trabalho”, já está no ar, e pode ser acessada no site direitosfundamentais.org.br.

Idealizador e integrante do conselho curador do projeto, o advogado Rogério Viola Coelho explica que, em seu processo de concepção, o Democracia e Direitos Fundamentais teve uma “gênese histórica” e uma “gênese teórica”. Desde a gestação até a implementação, foram um ano e meio de diálogos entre diferentes agentes ligados à luta contra a desdemocratização – conversas que, é claro, ocorriam em paralelo com a denúncia de abusos e medidas de exceção. “Na medida em que fomos percebendo que estávamos defendendo direitos fundamentais em várias frentes, diante do desmonte ou da suspensão da efetividade, a gente teve a ideia de totalizar tudo. Criar um veículo não só para produzir atos e ideias na defesa desses direitos, como também para buscar, como observatório, o que de melhor se está produzindo nesse embate”, define.

Segundo ele, um dos elementos que dá originalidade ao projeto é a sistematização de informações necessárias para estudar uma disputa que se dá em dimensão internacional. Nesse sentido, a adoção de atualizações temáticas em formato de revista é um diferencial significativo. A primeira edição tratou do direito à educação, e a publicação mais recente traz diferentes análises e observações a respeito do direito ao trabalho e do trabalho – uma esfera que, em especial depois das reformas promovidas recentemente no Brasil, encontra-se em franco processo de precarização.

As pautas e temáticas de cada edição são definidas por um conselho curador, e viabilizadas a partir da atuação de um grupo executivo, constituído pelo sociólogo Jorge Branco e pelos jornalistas Sandra Bittencourt e Guilherme Gomes. A curadoria geral da publicação fica a cargo de Tarso Genro.

Neste momento, a revista tem entre seus objetivos a consolidação de um pensamento social, humanista e democrático – o que envolve, entre outras coisas, produzir e oferecer conhecimento capaz de subsidiar debates e disputas, em esferas políticas e profissionais. Assim, como explica Coelho, o conteúdo do Democracia e Direitos Fundamentais não tem, pelo menos em um primeiro momento, a pretensão de atingir as massas. “Esses debates (sobre direitos fundamentais) estão chegando muito tarde no Brasil. No fundo, a chegada do nosso observatório já se dá com certo atraso, e debaixo de mau tempo”, admite. “Eu tenho uma certa reserva com os debates que vêm sendo feitos dentro da ótica de defesa da democracia, porque considero que não há debate real. Uma pessoa fala o que pensa, outra sobe no palco e fala o que pensa e, no fim das contas, não chega a acontecer um debate. A nossa ideia é contribuir em uma outra direção, promover um debate efetivo entre os diferentes atores que promovem essa resistência.”

Nesse sentido, os conteúdos em áudio e vídeo acabam tendo evidente importância. E Rogério Coelho mostra-se entusiasmado com  o potencial deles. “Estamos apostando muito em um formato de vídeos mais curtos, como se fossem mini-lives, em que convidamos alguém para falar por alguns minutos sobre determinado tema”, diz ele. “Se você faz aqueles debates on-line com 4 ou 5 pessoas, eles acabam durando duas horas e viram mais ou menos uma reprodução dos debates que eram feitos presencialmente (antes da pandemia). A nossa avaliação é de que melhorou muito (nesse novo formato), mesmo porque não é um monólogo, as falas surgem a partir de perguntas e provocações. Gostamos muito da experiência, e a nossa tendência é de ampliar”, anima-se.

O tema da próxima edição do Democracia e Direitos Fundamentais já está definido: será sobre o direito à saúde. Um recorte que, naturalmente, coloca em discussão também o direito à vida, especialmente ameaçado a partir da ação errática e irresponsável do governo federal. “Com a pandemia surge um processo de ataque ao mais fundamental dos direitos, que é o direito à vida. Que se relaciona diretamente com isso que o (ministro do STF, Gilmar) Mendes denunciou, de estar em curso um genocídio – e ele depois modulou, buscou alguma moderação no discurso, mas manteve a ideia. Dá para dizer que houve uma escalada (no descumprimento de direitos) e se chegou até o direito fundamental maior, que é o direito à vida, já que está sendo, no mínimo, denunciado que Jair Bolsonaro estaria atentando contra esse direito.”

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