As negociações salariais pesquisadas pelo Dieese tiveram no primeiro semestre o segundo melhor resultado desde 2008, com 93,2% dos acordos fechados com aumento real (acima da inflação) – abaixo apenas de 2012 (95,6%) –, 4,1% equivalente à variação do índice e 2,6% abaixo. Foram analisados 340 convenções e acordos coletivos. Para o instituto, o dado positivo pode ser consequência, entre outros fatores, do menor ritmo da inflação no período e das taxas baixas de desemprego. A expectativa continua sendo de otimismo para a segunda metade do ano, quando categorias numerosas negociam, mas há uma preocupação de médio prazo em relação ao crescimento econômico e seus reflexos.
O ganho real médio nos primeiros seis meses de 2014 foi de 1,54 ponto percentual acima do INPC-IBGE, resultado superior ao ano passado (1,08 ponto), equivalente a 2010 (1,57) e abaixo também de 2012 (2,15 pontos). Em torno de 45% dos acordos tiveram aumento real de um a dois pontos percentuais. A inflação média do semestre, medida pelo INPC, foi de 5,62%, ante 6,82% em igual período de 2013.
Neste ano, o quadro foi de baixa dispersão dos valores, diz o Dieese. “Se por um lado os menores ganhos não foram tão baixos como em outros anos, por outro, os mais altos não foram tão elevados”, informa o instituto. O maior aumento real, por exemplo, foi de 4,54 pontos – em 2010, chegou a 10,91. Na ponta de baixo, houve perda de -0,84, que em 2009 chegou a -5,88.
O coordenador de atendimento técnico sindical do Dieese, Airton Santos, diz que na primeira metade do ano não foi possível estabelecer uma relação mais forte entre o nível de inflação e os ganhos reais. O comportamento não foi uniforme durante o período. Em maio, mês com maior número de negociações, o aumento real médio foi de 1,54 ponto, para uma inflação acumulada em 12 meses de 5,82%. Em abril, com inflação menor (5,62%), o ganho médio foi de 1,33 ponto. “Pode-se observar que o aumento no valor do reajuste necessário não implicou redução nos valores dos aumentos reais das categorias analisadas”, aponta o Dieese.
Nesse caso, o técnico observa que pode entrar outro elemento, relacionado à mobilização de categorias profissionais. De todos os setores, os maiores índices de aumento real foram atingidos em transportes (2,3 pontos acima do INPC) e em turismo e hospitalidade (2,07 pontos). No primeiro caso, as greves no transporte coletivo podem ter contribuído para o melhor resultado, enquanto no segundo possivelmente houve um “efeito Copa”.
Entre os setores da economia, o comércio teve 95,7% dos acordos (46 no total) com aumento real, enquanto serviços (138) e indústria (156) ficaram praticamente iguais, com 92,8% e 92,7%, respectivamente.
Se a maior parte dos resultados até agora é positiva, o técnico do Dieese observa que há algum grau de incerteza para o próximo período. “Não existe correlação imediata, pelo menos no curto prazo, entre o PIB e o mercado de trabalho”, afirma, identificando no Brasil um “fenômeno” que inclui baixo crescimento e mercado de trabalho aquecido. Mas existe um limite para isso, acrescenta, com interrupção da produção em alguns setores – com acordos de lay-off (suspensão de contratos de trabalho), férias coletivas e planos de demissão voluntária. As empresas, especialmente as de maior porte, também relutam antes de demitir. “A empresa retém funcionários, principalmente os mais especializados. Existe uma disputa no Brasil por mão de obra qualificada.”
No segundo semestre, negociam categorias como bancários, comerciários, metalúrgicos, petroleiros e químicos. Embora a sinalização continue positiva, o técnico lembra que estão em jogo pontos de vista diferentes: o trabalhador busca recuperar o poder de compra, com base na inflação passada, acrescida de um ganho real, enquanto o empresário já procura mirar o cenário futuro. “Não é um quadro econômico otimista, mas não é o fim do mundo que, às vezes, a grande imprensa pinta. O que está pegando no Brasil, agora, é o crescimento.”
Fonte: Rede Brasil Atual
Texto: Vitor Nuzzi
Data original da publicação: 21/08/2014