O quadrinista brasileiro Marcelo D’Salete ganhou, na última sexta (20), o maior prêmio de quadrinhos do mundo com a obra Cumbe. Baseada em relatos e documentos reais, a obra narra as histórias de resistência de quatro pessoas negras escravizadas no período colonial do Brasil. A obra ganhou o prêmio Eisner (que é considerado o “Oscar dos quadrinhos”) na categoria melhor publicação estrangeira nos Estados Unidos.
A obra ‘Cumbe’ é parte do momento singular do quadrinho nacional, representado por inúmeros autores com uma excelente produção. Já houve outros brasileiros premiados com o Eisner e, nessa toada, certamente ainda teremos mais obras reconhecidas nacional e internacionalmente.
Escreveu D’Salete em seu blog.
Mestre em história da arte pela Universidade de São Paulo (USP) e professor de Artes Plásticas do ensino básico paulista, D’Salete entra para o panteão de outros grandes quadrinistas brasileiros vencedores do prêmio, como Fábio Moon, Gabriel Bá e Rafael Albuquerque.
Cumbe
A HQ Cumbe foi lançada em 2014 no Brasil pela editora Veneta. A obra narra quatro histórias diferentes do ponto de vista de pessoas escravizadas que lutam contra o sistema que as oprime.
Esse lançamento foi um momento de inflexão total na minha trajetória. Na época, pensava seriamente se continuava a produzir e publicar do mesmo modo. Apesar das críticas positivas, meus livros anteriores não tinham chegado a um público muito amplo. Cumbe rompeu todas as expectativas.
Disse o autor em sua página pessoal do Facebook após receber o prêmio.
Cumbe foi um dos desdobramentos da pesquisa de mais de uma década conduzida por D’Salete sobre a escravidão no Brasil: ao ler registros históricos e literários sobre o quilombo dos Palmares em 2004, D’Salete percebeu que os relatos eram sempre escritos por autores brancos que traziam a perspectiva de observadores nada imparciais sobre as pessoas negras.
Porém, quanto mais se debruçava sobre a história de Palmares, mais percebia a necessidade de conhecer a história de outros quilombos e de outras formas de resistência no brasil escravagista.
Desde então, o quadrinista se dedica a investigar a perspectiva das pessoas negras nas narrativas sobre o Brasil colonial.
Com seus trabalhos, Marcelo D’Salete abre a possibilidade de que as histórias da escravidão sejam contadas por mãos e bocas negras e tenham como protagonistas as próprias pessoas escravizadas.
As marcas de cada um desses africanos estão presentes em nossa história e cotidiano. Ainda lutamos pelo reconhecimento simbólico, cultural, econômico e político no Brasil (dos remanescentes quilombolas, dos territórios indígenas e do simples direito a vida de cada jovem de periferia). Os quadrinhos, a literatura, as artes são componentes essenciais para uma mudança estrutural.
Escreveu Marcelo D’Salete em seu Facebook.
Outra aclamada obra de D’Salete fruto da mesma pesquisa é Angola Janga, HQ lançada em 2007 que aborda conflitos, dramas e esperanças de pessoas negras trazidas dos antigos reinos de Angola e do Congo para serem escravas no Brasil.
Fonte: Justificando, com informações da Folha e do Estadão
Texto: Daniel Caseiro
Data original da publicação: 23/07/2018