por Charles Soveral [*]
Flexibilizar a legislação a ponto de suprimir direitos, reduzir salários e expor trabalhadores a condições precárias no que se refere às garantias constitucionais. Esta combinação de fatores lesivos aos trabalhadores, em tramitação na Câmara dos Deputados na forma do Projeto de Lei 4330, conhecido como PL da Terceirização, está unindo as centrais sindicais em uma luta pela reprovação da matéria. “É hora de todas as representações dos trabalhadores e dos parlamentares comprometidos com os trabalhadores se juntarem contra este projeto neoliberal”, convoca Claudir Nespolo, presidente da Central Única dos Trabalhadores no Rio Grande do Sul (CUT-RS).
Nespolo lembra que, após um longo período adormecido no Congresso Nacional, o PL 4330 voltou como estratégia dos setores neoliberais e conservadores para barrar outros avanços que já estavam sendo costurados entre as centrais sindicais, como a redução da jornada de trabalho e o fim do fator previdenciário. “Nossa leitura é de que eles ressuscitaram este projeto para tirar as centrais do foco que vinha sendo construído para este ano”, completa ele.
O presidente da CUT-RS lembra que uma pesquisa encomendada por sua central ao Departamento Intersindical de Estatísticas e Estudos Socioeconômicos (Dieese) revela que o trabalhador terceirizado fica 2,6 anos a menos no emprego, tem uma jornada de três horas a mais por semana e ganha 27% a menos. Além disso, a cada 10 acidentes de trabalho, oito ocorrem entre terceirizados. “Se esta matéria for aprovada será um desastre para os trabalhadores. Vamos mobilizar o Governo Federal para vetar este projeto, caso passe no Congresso”, garante ele. Nespolo destaca ainda que mais da metade dos parlamentares têm CNPJ, o que significa que medidas de interesses empresariais acabam por ter muita simpatia no Congresso.
“No momento em que os trabalhadores tentam avançar, há todo um movimento das forças conservadoras para impor um retrocesso. É como se estivéssemos voltando ao período neoliberal do final do século passado”, diz Guiomar Vidor, presidente da Central dos Trabalhadores e Trabalhadoras do Brasil no Rio Grande do Sul (CTB-RS).
Vidor assinala que o projeto torna precárias as relações de trabalho em um nível muito abaixo do que se poderia esperar para a atualidade. “É um grande retrocesso e nós usaremos de todas as forças para combater e evitar que tal projeto seja aprovado. Em áreas como a dos bancários e dos serviços de uma forma geral praticamente não teremos trabalhadores cobertos por garantias sociais”, adverte ele.
Quem também está mobilizando os trabalhadores neste sentido é a CSP-Conlutas. A presidente da entidade no Rio Grande do Sul, Vera Guasso, que representa também os trabalhadores em processamento de dados, afirma: “A terceirização na categoria que represento se mostra muito cruel, pois, em um comparativo direto com os trabalhadores contratados, os terceirizados não possuem qualquer proteção. Se transformam em uma mão de obra que fica ali à mercê dos interesses dos patrões”.
Vera Guasso chama a atenção para o fato de que é preciso envolver mais a sociedade nesta questão. Ela acredita que as centrais sindicais com mais expressão deveriam usar com mais ênfase os espaços que possuem, principalmente junto aos canais governamentais. “O que infelizmente estamos presenciando é que toda a pauta neoliberal que não foi aprovada no período mais neoliberal do Brasil parece estar voltando agora como privatização de aeroportos, das reservas petrolíferas e da flexibilização dos direitos dos trabalhadores. Isto em um governo com verniz de esquerda”, provoca.
O presidente da Câmara dos Deputados, Henrique Alves (PMDB-RN), confirmou a realização da audiência pública do projeto PL 4330 de autoria do deputado Santo Mabel (PMDB-GO), como uma resposta aos tumultos ocorridos na Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania (CCJC), onde o projeto estava sendo analisado. Para ele, tornou-se imperativo ampliar a discussão sobre o tema. A audiência contará com a participação de trabalhadores, empregadores e instituições de Direito, como o Ministério Público e a Associação Nacional dos Magistrados da Justiça do Trabalho (Anamatra), e será organizado pelo presidente da CCJC da Câmara, deputado Décio Lima (PT-SC).
Esse Projeto de Lei tem provocado também manifestações firmes por parte do Poder Judiciário, como a dos ministros do Tribunal Superior do Trabalho (TST), da Anamatra e do Conselho Consultivo de Presidentes e Corregedores de Tribunais Regionais do Trabalho (Coleprecor). Uma prova disto está na nota enviada dia 27 de agosto ao presidente da CCJC da Câmara, assinada por 19 dos 26 ministros do TST, que alerta para os riscos da proposta que, segundo eles, aprofunda, generaliza e descontrola a terceirização no país.
Na nota, os ministros afirmam que a aprovação do PL 4330 “negligencia e abandona os limites à terceirização já sedimentados no Direito brasileiro”. A carta destaca, ainda, que o PL 4330 causará grande prejuízo aos direitos sociais, trabalhistas e previdenciários no país, com a provável “migração massiva de milhões de trabalhadores hoje enquadrados como efetivos das empresas e instituições tomadoras de serviços em direção a um novo enquadramento, como trabalhadores terceirizados, deflagrando impressionante redução de valores, direitos e garantias trabalhistas e sociais”.
Os magistrados ressaltam os prejuízos fiscais, previdenciários e à saúde pública do país e afirmam: “como se sabe que os direitos e garantias dos trabalhadores terceirizados são manifestamente inferiores aos dos empregados efetivos, o resultado será o profundo e rápido rebaixamento do valor social do trabalho na vida econômica e social brasileira, envolvendo potencialmente milhões de pessoas”.
[*] Com informações da Agência Brasil, EBC, Agência Câmara Notícias e Estado de S.Paulo.