Eleições sindicais em Buffalo podem ser marco na luta pela sindicalização na indústria do fast food.
Cássio Casagrande
Fonte: Jota
Data original da publicação: 22/11/2021
A rede americana de cafeterias Starbucks sempre primou por passar uma imagem socialmente progressista aos seus consumidores: seu marketing é baseado na sustentabilidade dos seus produtos, apoio a comunidades mundo afora na cadeia de produção do seu café e no discurso antirracismo em sua política interna de recursos humanos. No entanto, quando neste ano um punhado de trabalhadores insatisfeitos com suas condições de trabalho resolveu se organizar e promover uma campanha de sindicalização, o café da sereia de duas caudas ficou bem amargo. A companhia não gostou da ideia e deixou o seu bom mocismo de lado.
A corporação Starbucks, que não funciona sob sistema de franquias, tem cerca de 8.000 lojas espalhadas pelos EUA, onde trabalham 350 mil empregados. Nenhum deles é sindicalizado. No sistema sindical americano definido pela National Labor Relations Act (1935), a sindicalização deve ser feita “por estabelecimento” (bargain unit), através de eleições nas quais mais da metade dos trabalhadores votantes deve concordar com a representação por entidade sindical.
Esse sistema legal, que foi concebido para o trabalhador “blue collar” na época em que as grandes indústrias fabris concentravam a maior parte dos postos de trabalho nos EUA, naturalmente dificulta a adesão aos sindicatos em empresas no setor de fast food (incipiente na década de 1930), no qual os empregados, em razão da natureza do empreendimento, estão dispersos em dezenas de milhares de lojas espalhadas em todo o país.
As cafeterias da Starbucks reúnem pequeno número de empregados em cada loja (em torno de 30 ou menos), o que os torna mais vulneráveis às táticas antissindicais que as empresas costumam adotar para “convencer” os trabalhadores de que a representação pelo sindicato “atrapalharia” as negociações diretas entre patrões e empregados.
Por conta dessa dificuldade intrínseca à organização sindical naquele setor, vem chamando a atenção dos analistas americanos a campanha sindical até agora bem sucedida em três lojas de Buffalo, no estado de Nova York, que conseguiu preencher o requisito mínimo de 40% de subscrições de seus empregados para que uma eleição ocorra. A Starbucks, percebendo o efeito “rastilho de pólvora” que uma vitória dos trabalhadores poderia ter, acendeu o sinal amarelo e vem despejando centenas de milhares de dólares em estratégias de “union bustling”, que consiste basicamente em contratar consultorias jurídicas para promover o voto “não” na eleição sindical.
O medo de uma derrota é tão grande que a Starbucks fechou as lojas de Buffalo por um dia inteiro, durante o qual os empregados foram “convidados” a assistir uma palestra de ninguém menos que Howard Schultz, o homem que comprou a empresa nos anos 1980, quando ela se resumia a um charmoso café em Seattle, e anos depois a transformou numa gigantesca corporação transnacional. Schultz, que se refere aos empregados como “associados”, como é comum na empresa, garantiu que está disponível a ouvir suas reivindicações sem que eles “precisem” se filiar ao sindicato.
A Starbucks também acionou seus advogados para tentar criar embaraços e adiar o processo eleitoral, mas até o momento as decisões da National Labor Relations Board (NLRB) têm sido favoráveis aos trabalhadores, que ademais contam com o patrocínio da Workers United, poderosa confederação sindical que representa empregados de restaurantes e hotéis. Esta entidade acusa a Starbucks de despedir ilegalmente uma empregada que atuou como “whistleblower”, revelando à imprensa estratégias antissindicais da empresa que estariam fora da lei.
Estudiosos do Direito do Trabalho nos EUA acreditam que a pandemia da Covid-19 foi decisiva para aumentar a consciência de classe naquele país, especialmente em setores como o de hospitalidade, que ficaram mais vulneráveis à exposição ao novo coronavírus. O número de pedidos de demissão aumentou sensivelmente nessa indústria e o custo da mão de obra está crescente.
Isso talvez possa explicar por que, depois de décadas de declínio, a taxa de sindicalização entre os trabalhadores americanos voltou a crescer. Mais importante, pesquisas de opinião revelam que cerca de 65% dos trabalhadores americanos têm uma imagem positiva dos sindicatos.
No caso da Starbucks, alguns consumidores também vêm expressando apoio à causa sindical de uma maneira bastante inusitada. A Starbucks é conhecida por entregar os cafés com o nome do cliente escrito no copo, pois quando o pedido fica pronto um atendente chama o freguês em voz alta para que ele venha apanhá-lo no balcão. Muitos frequentadores da cafeteria, quando indagados sobre o seu nome, respondem “support the union” ou “union yes”. Desta forma, os empregados da loja bradam o incentivo sem que possam ser retaliados por fazer uma campanha sindical “involuntária”…
Cássio Casagrande é doutor em Ciência Política, professor de Direito Constitucional da graduação e mestrado (PPGDC) da Universidade Federal Fluminense – UFF. Procurador do Ministério Público do Trabalho no Rio de Janeiro.
Gostei, mas se os patrões que tem o capital e o meio de produção, criam e participam de seus sindicato, o trabalhador que tem apena a força de trabalho é sua intelectualizada não vai participar ? Esse patrão tem prática escravocrata, ele só desfarsa de bom moço devido sua clientela.