Jair Bolsonaro anunciou pelas redes sociais redução de 90% nas Normas Regulamentadoras (NRs) de segurança e saúde no trabalho. A promessa, feita nesta segunda-feira (13), é que o pacote de revisão seja entregue em junho. Segundo o capitão, “há custos absurdos (para as empresas) em função de uma normatização absolutamente bizantina, anacrônica e hostil”. No entanto, reconhece o site da Secretaria de Inspeção do Trabalho – já no novo formato do governo que extinguiu o Ministério do Trabalho e Emprego –, as NRs servem para garantir trabalho seguro e sadio.
“Normas Regulamentadoras são disposições complementares ao capítulo V da CLT, consistindo em obrigações, direitos e deveres a serem cumpridos por empregadores e trabalhadores com o objetivo de garantir trabalho seguro e sadio, prevenindo a ocorrência de doenças e acidentes de trabalho”, explica o site governamental.
É a segunda ofensiva governista para atender ao lobby de um setor atrasado do empresariado. Na Medida Provisória 871 – chamada de “MP do pente-fino” do INSS, que está em discussão no Congresso – havia sido incluído dispositivo que previa descaracterização dos acidentes ocorridos no trajeto casa-trabalho como acidentes de trabalho. Após pressões, o item foi retirado.
A elaboração e revisão das NRs era, até Bolsonaro, realizada pelo Ministério do Trabalho por intermédio de um sistema tripartite, composto por representantes do governo, de empregadores e empregados.
Para o médico do Trabalho Paulo Kaufmann, é incrível a capacidade do governo de buscar medidas que seriam polêmicas, se não fossem trágicas. “O Brasil segue campeão de acidentes de trabalhos”, lembra. “Os acidentes com máquinas continuam amputando mãos, dedos, ceifando vidas. Se diminuir ainda mais a abrangência e exigência será um desastre, é estímulo ao crime, a garantir mais produtividade, mais lucro a custa, literalmente, do sangue, da carne dos trabalhadores.”
E mesmo crítico ao que considera uma burocratização na defesa dos direitos dos trabalhadores, destaca que se não fossem as NRs, neste momento seria muito pior. “As NRs não são cumpridas suficientemente porque cada um dos fiscais da DRT demoraria – com a quantidade que tem e limites de burocracia e condições – 10 anos para voltar a uma mesma empresa.”
Amputações, esmagamentos e mortes
O médico explica que as NRs são regulamentadas por decreto e nem precisam passar pelo Congresso Nacional. São normas que regulamentam artigos da CLT, criadas pela Portaria 3.214, de 1978.
Kaufmann comenta a menção de Bolsonaro à NR 12, como a primeira a ser revista. “Essa NR, por exemplo, sempre sofreu críticas de setores empresarias, desde seu nascedouro. Como ela é bastante exigente, algumas das regras seriam, segundo eles, custosas e inviabilizariam a produção em algumas indústrias”, explica. “Mas o fato é que, com a quantidade de acidentes, amputações, esmagamentos, mortes eram necessárias regras mais rígidas. Se a NR12 poderia merecer alguma flexibilização, não parece ser o sentido geral de mais essa ameaça do presidente.”
O médico prevê que o governo comprará uma briga com setores técnicos, auditores, com o movimento sindical. E lembra que, por trás dessa fala de Bolsonaro, há todo o desmanche, a falta de recursos nas estruturas do governo e a crítica expressa à própria fiscalização da segurança do trabalho. “Há uma série de ações que começaram no governo anterior, como a reforma trabalhista, e agora a MP que exige boleto individual para pagamento aos sindicatos. Na prática extingue os sindicatos com sua capacidade de pressão, negociação, e de contratar e financiar ações de mobilização, estudos para negociação e convenções coletivas”, critica.
“E ali do outro lado, o INSS concedendo cada vez menos auxílio-doença, não promovendo reabilitação, devolvendo aleijados para que se virem nesse mar de desempregados. Ou seja, a saúde do indivíduo, desassistido, irá deteriorar mais ainda. Esperamos que os trabalhadores percebam quão graves estão sendo essas ações desse governo”
Para lidar com esse quadro, Kaufmann sugere estudar item por item e fazer diferente do que foi feito nos últimos anos. “Temos de sair das mesas de negociação e voltar finalmente para os locais de trabalho, conversar com a base de trabalhadores”, afirma. “Revalorizar as Cipas (Comissões Internas de Prevenção a Acidentes) e mobilizar de baixo para cima. Um novo sindicalismo que reaja a essas ações e reverta o máximo possível para que possamos voltar a representar mais os direitos e interesses e necessidades dos trabalhadores.”
Fonte: RBA
Texto: Cláudia Motta
Data original da publicação: 14/05/2019