Em fim de gestão, a equipe econômica do governo de Michel Temer segue em campanha pela aprovação da reforma da Previdência. O Ministério da Fazenda divulgou, no dia 5 de dezembro, um relatório chamado “Reformas econômicas em 2016-2018 e perspectivas para o próximo mandato presidencial”.
No documento, economistas do ministério fazem um raio-x das contas públicas, das realizações da equipe que foi chefiada por Henrique Meirelles e Eduardo Guardia e da principal frustração do período: a não aprovação da reforma da Previdência.
Somando todos os tipos de aposentadoria, setor privado e público, urbano e rural, o governo federal desembolsou R$ 685 bilhões em 2017. Isso é mais da metade do Orçamento Federal e R$ 268 bilhões a mais do que o arrecadado com as contribuições previdenciárias no período.
A grave situação fiscal do país, que vai fechar o ano com deficit primário pelo quinto ano consecutivo, e a projeção do crescimento das despesas devido a mudanças demográficas não são mais os únicos argumentos para a necessidade de se alterar as regras para se aposentar no Brasil.
O texto aborda o atual sistema previdenciário brasileiro como um fator de concentração de renda. Por isso, segundo os dados divulgados pelo governo, reformar a Previdência seria também uma maneira de diminuir a desigualdade no Brasil. No modelo atual, ela atende mais aos que têm renda mais alta.
O levantamento
Os técnicos da Secretaria de Política Econômica da Fazenda, utilizando dados da Pesquisa de Orçamentos Familiares do IBGE, ordenaram todas as famílias brasileiras de acordo com a renda domiciliar. Depois, elas foram divididas em cinco grupos do mesmo tamanho, os chamados quintis. O terceiro passo foi apurar os valores correspondentes a cada quintil, como mostra o gráfico.
O critério utilizado é a renda familiar, ou seja, quanto todos os integrantes daquela família recebem mensalmente. O patrimônio não entra no levantamento e os números apresentados são referentes a 2015.
O QUINTIL
Analisando dados do Orçamento de 2015, técnicos da Secretaria de Política Econômica da Fazenda analisaram qual o perfil de quem recebe os recursos do Regime Geral de Previdência Social. Esse é o sistema que atende à maior parte dos brasileiros porque inclui todos os trabalhadores do setor privado.
Como comparação, os técnicos traçaram também o caminho do dinheiro gasto pelo governo federal com o Bolsa Família e o pagamento do funcionalismo público – aqui incluído também as despesas com aposentados e pensionistas do setor público.
No fim, eles queriam saber em que quintil de renda estão as famílias que recebem os recursos de Previdência, Bolsa Família e pagamento do funcionalismo.
O que é considerado
PREVIDÊNCIA
Todos os gastos do Regime Geral de Previdência Social, seja o pagamento de aposentadorias e pensões ou de benefícios de risco, como doença, maternidade ou invalidez. Não está incluído o Benefício de Prestação Continuada, salário mínimo que é pago a idosos de baixa renda mesmo que eles não tenham contribuído.
FUNCIONALISMO
Todo o gasto da União com pessoal, seja com o pagamento de salários dos funcionários da ativa ou com aposentadorias e pensões aos inativos.
BOLSA FAMÍLIA
Todos os gastos com o pagamento de benefícios do programa de transferência de renda.
A FRAÇÃO QUE VAI PARA CADA QUINTIL
É importante ressaltar que, pelo fato de o Brasil ser um país pobre e desigual, os 20% mais ricos da população são um grupo bastante diverso. Nem todo mundo que está no último quintil pode ser considerado rico, já que ali estão os que têm renda familiar que parte de R$ 5.862 e vai até a família mais rica do país. Apesar de parte dos que estão nesse quintil não serem necessariamente ricos, eles estão em situação melhor que pelo menos 80% dos brasileiros.
Pelo gráfico, é possível dizer que os 60% mais pobres da população ficam com menos de um terço de todos os recursos da Previdência. A situação é ainda mais grave no funcionalismo público federal, que destina 79% do orçamento ao quintil mais rico.
Segundo a Fazenda, dos três gastos, apenas o Bolsa Família pode ser considerado uma política que contribui para a redução da desigualdade. O programa destina 74% de seus recursos para os dois quintis de menor renda.
O peso no Orçamento
A distorção fica ainda mais visível quando se leva em conta o peso que cada programa tem no orçamento, ou quanto de recurso em termos absolutos é destinado a cada quintil de renda. A distância aumenta porque o único dos três programas que prioriza os mais pobres, o Bolsa Família, tem um orçamento de pouco mais de 10% do que se gasta com o funcionalismo.
A QUANTIDADE DE DINHEIRO PARA CADA GRUPO
A importância do que vai para os mais pobres
Enquanto o Ministério da Fazenda reforça o papel do sistema de Previdência Social para o aumento da desigualdade, a Secretaria de Previdência enfatiza a função do pagamento de benefícios na redução da miséria. Ou seja, se por um lado o sistema paga muito para quem menos precisa, por outro, o pouco que vai para os mais pobres é fundamental para tirar famílias inteiras da linha de miséria.
Números do Informe de Previdência de junho, publicados na segunda-feira pelo jornal Valor Econômico, mostram como o sistema previdenciário atua na redução da miséria. Com base em dados da PNAD Contínua (Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios), a secretaria chegou à conclusão de que o Brasil tinha 64 milhões de pobres. Outros 31 milhões só não estão nessa condição por receberem benefícios do sistema de Previdência.
Os dados apresentados nos gráficos mostram que foram R$ 60 bilhões da Previdência destinados a famílias com renda de menos de R$ 1.916 (o que equivalia a 2,4 salários mínimos em 2015). É provavelmente nesses dois primeiros quintis de renda que está a maior parte das pessoas retiradas da miséria pelos benefícios previdenciários.
Pelos critérios utilizados pela Secretaria de Previdência, são consideradas pobres pessoas que vivem com renda menor que meio salário mínimo por mês. Ou seja, um benefício previdenciário é suficiente para retirar uma família de duas pessoas da miséria.
No dia 5 de dezembro, o próprio IBGE divulgou um levantamento mostrando que a pobreza extrema avançou significativamente no Brasil entre 2016 e 2017. O grupo de brasileiros com 65 anos ou mais é a faixa etária menos afetada pela pobreza e pela extrema pobreza, e as crianças de até 14 anos são as que mais sofrem.
Fonte: Nexo
Texto: José Roberto Castro e Rodolfo Almeida
Data original da publicação: 12/12/2018