Governo Lula terá oito meses para apresentar uma nova regra fiscal que substitua a Regra do Teto e que funcione como uma âncora fiscal nos próximos anos.
Ivan Paixão
Fonte: Brasil Debate
Data original da publicação: 24/12/2022
O Teto de Gastos se mostrou uma regra extremamente ineficiente e inexequível. Só no Governo Bolsonaro, que pregava uma agenda liberal de corte do Estado, o teto foi furado em R$ 795 Bilhões. Segundo estudo do economista Bráulio Borges, pesquisador do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas (FGV IBRE), foram R$ 53,6 bilhões em 2019, R$ 507,9 bilhões em 2020, R$ 117,2 bilhões em 2021 e R$ 116,2 bilhões em 2022.
A regra do Teto de Gastos estabeleceu um limite para os gastos do governo federal para os próximos 20 anos a partir de 2017, tendo como base o orçamento do governo em 2016. Com o Teto de Gastos, o Governo federal ficou impedido de criar um orçamento para a União maior do que o ano anterior – ele pode apenas corrigir os valores de acordo com a inflação. Alguns gastos até podem crescer mais do que a inflação, desde que ocorra cortes reais em outras áreas.
O problema é que o Brasil é um país que tem uma população que está envelhecendo e vivendo mais, o que é positivo, mas exige maiores gastos na previdência e no social, o que na regra do Teto se torna impraticável. Além disso, quando olhamos os gastos sociais per capita do país em comparação com países desenvolvidos percebemos que estamos muito atrás. Na saúde, como mostra a Tabela 1, temos um menor percentual do PIB investido e quando analisamos o gasto per capita vemos que o Brasil gasta praticamente menos de ¼ do que qualquer outro país que tenha um sistema universal de saúde.
Na educação, o Brasil também apresenta gastos muito inferiores aos dos países membros da OCDE. Como podemos analisar com base no Gráfico 1, na Educação Fundamental 1 gastamos 44% do que gasta a média dos países da OCDE, na Educação Fundamental 2 36%, no Ensino Médio e Técnico 41%, no Ensino Superior 88%.
Esses dados mostram que o Estado brasileiro não é inchado, nem gasta demais, como afirmam economistas ortodoxos. Os gastos sociais no Brasil são muito inferiores aos dos países desenvolvidos. Por mais que a gestão e a eficiência do gasto público melhorem, não vamos alcançar os níveis de qualidade dos países desenvolvidos se não aumentarmos o volume de gastos sociais. Porém, a regra do Teto de Gastos impede que esses gastos aumentem, mesmo se houver crescimento econômico e aumento da receita.
Para criar uma nova regra fiscal que permita ao Brasil expandir o orçamento das áreas sociais e tenha uma âncora de estabilidade fiscal, o debate entre economistas apresenta algumas alternativas:
Teto da Dívida: Ao invés de ter uma regra que limita o orçamento à inflação, proibindo qualquer aumento real das despesas, no curto, médio e longo prazo, uma alternativa seria colocar no lugar um limite de crescimento real das despesas condicionado ao nível e à trajetória da dívida pública no médio e longo prazo. Esse modelo permitiria uma maior flexibilidade do orçamento no curto prazo, permitindo ao governo aumentar os gastos sociais e investimentos. O problema é que as despesas do Governo são apenas uma das variáveis da dívida pública. Por exemplo, uma política monetária de elevação de juros, por parte do Banco Central independente, pode elevar o nível da dívida independentemente da política fiscal do Governo Federal.
Retirada dos Orçamentos Sociais e Investimentos do Teto de Gastos: Para muitos economistas, o orçamento da saúde, educação e assistência social não pode ser considerado gasto, mas sim investimento. Portanto, não faz sentido ter um teto limitando o aumento desses gastos. Segundo a teoria keynesiana, os gastos fiscais nessas áreas têm um efeito multiplicador, ou seja, um aumento de gastos gera um aumento na demanda agregada maior que o aumento inicial dos gastos. Dessa forma, expandir gastos sociais e investimentos aumenta o PIB e melhora a situação social e fiscal do país.
Teto do Crescimento do PIB: A última alternativa seria vincular o aumento dos gastos ao crescimento do PIB mais a inflação, como ocorreu na regra do salário mínimo no Governo Lula. Essa regra garante um percentual de despesa primária mínima em relação ao PIB. Quanto melhor o desempenho econômico do país, maior a despesa que o Governo Federal nas áreas sociais. Caso o Governo queira diminuir a despesa primária em relação ao PIB, criando uma âncora de gastos, pode definir percentuais do crescimento do PIB para aumentar as despesas. Por exemplo, caso o PIB aumente mais de 3%, o aumento das despesas será de inflação mais 80% do crescimento do PIB.
Autor É bacharel em Ciências Econômicas pela Facamp, mestre em Economia Política pela PUC-SP, doutorando em Desenvolvimento Econômico pela Unicamp.