Representantes dos trabalhadores do chamado macrossetor industrial da CUT – metalúrgicos, químicos, construção, energia, vestuários, alimentos, dentre outros – se reuniram em São Paulo na sexta-feira (22) em seminário para discutir os futuro das organizações sindicais em contexto de precarização das relações de trabalho no Brasil e no mundo. O evento foi realizado pelo Instituto Trabalho, Indústria e Desenvolvimento (TID-Brasil) e pela Fundação Friedrich Ebert (FES).
Grandes empresas transnacionais, que defendem o livre mercado, passam a tratar o trabalho como uma “mercadoria comum”, agora suscetível à concorrência em nível global. Por aqui, os sindicatos buscam formas alternativas de financiamento diante do cenário de crise pós-golpe: desemprego, alto índice de rotatividade, terceirizações, pejotização, substituição de formais por precários, economia paralisada e, para agravar, o fim da contribuição sindical – tudo na esteira da “reforma” trabalhista do governo Temer.
Para o economista Marcio Pochmann, professor do Instituto de Economia da Unicamp, trata-se de um momento de ruptura do “sistema de trabalho corporativo”, que vigorou desde o chamado “novo sindicalismo”, para um modelo “contratualista individual”, o que impõe desafios aos sindicatos, que devem buscar se reinventar.
Antes agentes de “avanços civilizatórios” nas relações de trabalho, os sindicatos ocupam hoje papel de “retaguarda” na preservação de direitos. É preciso um “salto triplo”, segundo ele, para sair dessa situação defensiva e avançar.
Outra mudança, segundo Pochmann – que preside a Fundação Perseu Abramo –, é que na atual fase de desenvolvimento capitalista, em que os serviços ganham maior participação do que a indústria, as hierarquias sociais se reduzem e se confundem, e o trabalhador tem dificuldade em identificar as classes sociais e seus interesses divergentes. Abriu-se então brecha para que as tensões entre as classes, típicas da sociedade industrial, fossem substituídas por uma suposta disputa entre Estado e empresas, o que atende aos interesses da ideologia neoliberal.
Segundo Pochmann, uma das saídas é que os sindicatos se organizem para além das fábricas, contemplando aspectos da vida do trabalhador que transcendam as demandas puramente econômicas. Ele diz que os sindicatos devem voltar a serem espaços de sociabilidade capazes de tratar e propor soluções em questões relativas à mobilidade, saúde, assistência de todo o tipo, cultura, lazer e, principalmente, qualificação do trabalhador.
“A CUT, no início da sua fundação, ainda durante a ditadura, não organizava no local de trabalho, mas nos locais de moradia, junto com as igrejas, as comunidades de base. Depois houve uma espécie de institucionalização da luta sindical. Mas antes discutiam temas como transporte, educação, violência.”
Esse espaço, segundo Pochmann, passou a ser ocupado pelas igrejas evangélicas, que funcionam como uma “confraria de apoio mútuo”. Enquanto os sindicatos dizem que a situação “vai mal e tende a piorar”, as igrejas invocam “milagres” para garantir trabalho aos desempregados, e oferecem até cursos de formação ou dicas de empreendedorismo. Além de oferecerem identidade social a essas pessoas, que se sentem acolhidas, pertencentes a um determinado grupo que supostamente as valoriza.
Pochmann também cita as “universidades corporativas” criadas por empresas para formar a sua própria mão de obra para dizer que os sindicatos também devem desenvolver esforços similares, de modo a oferecer qualificação adequada aos trabalhadores para aplacar as incertezas que surgem a partir das transformações tecnológicas no mercado de trabalho.
Modelo alemão
O professor Manfred Wannöffel, pesquisador da Universidade de Bochum-Ruhr, Alemanha, destacou avanços na estrutura sindical em seu país que permitiram manter o protagonismo, apesar das flexibilizações trabalhistas vivenciadas 15 anos atrás e da saída de linhas de montagens de grandes empresas, movidas para a Ásia.
Em vez de se dedicar apenas à defesa dos direitos dos trabalhares, os sindicatos alemães – principalmente o IG Metall, o maior do país – passaram a ter papel cada vez mais atuante na co-gestão das empresas, a partir das comissões de fábrica, de modelo “dual”, reunindo representantes dos trabalhadores e os gestores da própria empresa.
O IG Metall também procurou se aproximar de universidades e instituições científicas para garantir formação técnica adequada, em especial para os que participam das comissões, mas também para todos os trabalhadores afetados pelas mudanças tecnológicas. São cursos de formação de até um ano e meio em que os trabalhadores aprendem em laboratórios a utilizar novas ferramentas, como óculos de realidade aumentada, que logo chegam à linha de produção. Segundo ele, o trabalhador alemão só contribui com os sindicatos quando percebe os benefícios prestados.
Por outro lado, os novos profissionais que entram no mercado alemão já não são mais formados, como antes, dentro das próprias empresas, mas nas universidades. Por isso, a entidade sindical busca se aproximar dos universitários ainda antes de virarem trabalhadores.
Wannöffel também destacou o trabalho dos sindicatos para garantir paridade salarial entre homens e mulheres, bem como a representação paritária nas comissões de fábrica. Segundo ele, jovens e mulheres são o futuro do movimento sindical alemão, que também tem desenvolvido ações voltadas para esses públicos através de ferramentas virtuais e redes sociais.
Confira também a reportagem do Seu Jornal da TVT
Fonte: RBA
Texto: Tiago Pereira
Data original da publicação: 24/11/2018