Não basta apenas defender Reforma Tributária. É preciso separar os que querem retomar o Estado de bem-estar social daqueles que querem aprofundar o modelo de Estado mínimo.
Dão Real Pereira dos Santos
Fonte: IJF
Data original da publicação: 21/09/2023
Estamos em pleno período eleitoral e, neste ano, diferentemente do que ocorria em outros pleitos, as questões referentes aos temas tributários começam a ocupar uma parte relevante dos debates políticos. Alguns pontos aparecem nos discursos com mais frequência, por exemplo, a correção da tabela do Imposto de Renda das pessoas físicas e a necessidade de se tributar os lucros e dividendos distribuídos. Até mesmo a necessidade de tributar os super-ricos já está aparentemente assimilada.
Mas, também, em meio a muitos discursos e debates, aparecem promessas de redução de tributos, criação de um imposto único, simplificação tributária e de não tributação de rendas do capital. Há até quem diga que com menos tributos teremos mais e melhores serviços públicos. Outros não escondem que querem mesmo é reduzir o Estado e privatizar os serviços públicos.
O sistema tributário tem caráter instrumental e constitui-se como um meio para a obtenção de algum resultado desejado, seja em relação à garantia de recursos suficientes para financiar as políticas necessárias, seja como indutor de uma determinada realidade social, econômica e ambiental desejada.
Neste sentido, os tributos podem e devem ser utilizados para promover o desenvolvimento, regular o consumo e as relações de trabalho. Sempre haverá uma configuração de sistema tributário mais favorável a uma política desenvolvimentista e outra mais voltada a uma economia primário-exportadora. A política tributária poderá estimular as relações formais de trabalho e de assalariamento, mas poderá também beneficiar as terceirizações e a precarização. No espaço da sustentabilidade ambiental, podemos ter tributos que estimulem atividades menos nocivas ao meio ambiente ou o contrário.
Além disso, é importante considerar que o sistema tributário não deve ser absolutamente rígido e deverá se adequar aos diferentes estágios de desenvolvimento e de desigualdade em que nos encontrarmos. Por exemplo, um imposto sobre as Grandes Fortunas pode ser necessário em tempos de profunda concentração de riquezas, mas tornar-se ineficaz quando a desigualdade já seja razoavelmente superada.
Tendo em conta, portanto, que o sistema tributário, além de ser fonte de recursos para o financiamento das políticas públicas, pode e deve cumprir funções extrafiscais importantes, é preciso avaliar a coerência das propostas tributárias dos candidatos com o modelo de Estado e de sociedade que queremos construir, pois a efetividade dos projetos sociais e econômicos depende da calibração adequada de seus instrumentos, dentre os quais, a política tributária.
Assim, nestas eleições, não basta o candidato defender uma reforma tributária. Isso todos fazem. É preciso separar os que querem retomar a construção do Estado de bem-estar social previsto na nossa Constituição Federal daqueles que querem aprofundar o modelo de Estado mínimo, com políticas públicas privatizadas.
É preciso separar aqueles que defendem o desenvolvimento econômico inclusivo baseado na indústria, na ciência e na tecnologia daqueles que querem aprofundar o modelo primário exportador de commodities. Nem sempre essas posições ficam muito claras nos discursos, mas o sistema tributário que cada um defende é um bom indicador do modelo de Estado, de sociedade e de desenvolvimento que orienta seus programas políticos.
Dão Real Pereira dos Santos é presidente do Instituto Justiça Fiscal e membro do coletivo Auditores Fiscais pela Democracia