Eduardo Camín
Fonte: Carta Maior
Tradução: Victor Farinelli
Data original da publicação: 15/10/2018
A 19ª Reunião Regional Americana realizada recentemente pela Organização Internacional do Trabalho (OIT), na cidade do Panamá, finalizou como tantas outras, com o compromisso de governos, trabalhadores e empregadores de construir um melhor futuro do trabalho nas Américas através do diálogo social.
Porém, a realidade é que, segundo a própria OIT, o desemprego cresceu pelo terceiro ano consecutivo na América Latina e no Caribe, durante o ano de 2017, chegando à cifra de 26,4 milhões de pessoas desocupadas, num processo que não parece ter freio, enquanto vários governos neoliberais adiantam reformas trabalhistas que cortam direitos dos trabalhadores, conquistados após décadas de lutas. Só no Brasil há 13 milhões de desempregados.
Mais de 500 representantes de governos, organizações de empregadores e sindicatos de 31 países participaram da reunião. A “Declaração do Panamá para o Centenário da OIT: pelo futuro do trabalho nas Américas” sustenta que o trabalho conjunto e a governança democrática – atualmente em risco em vários países do hemisfério – são essenciais para avançar a um futuro com trabalho decente e justiça social na região.
“Em um momento de muita volatilidade e incerteza nas Américas, e também no mundo, nós conseguimos, durante quatro jornadas, dar uma prova de que os setores empresariais, sindicais e políticos das Américas são capazes de se sentar juntos para abordar questões de grande complexidade, e encontrar consensos. Isso não é pouca coisa, e não deve ser subestimado. É o diálogo social na prática” disse o diretor-geral da OIT, Guy Ryder, durante seu discurso de encerramento.
O documento aprovado estabelece uma série de prioridades para a OIT e os países americanos para os próximos anos. Entre elas: o desenvolvimento produtivo, o desenvolvimento sustentável das empresas, o respeito e a implementação dos direitos fundamentais no trabalho, a transição da economia informal à formal, o emprego juvenil, a relação entre migração e trabalho e a igualdade de gênero.
A outra cara da reunião “sem subestimar”
De boas intenções e grandes discursos até o inferno está cheio, mas o que foi feito até agora? Não há um só governo na região que não tenha adotado, em algum momento durante os últimos anos, essas pretensas prioridades, como o desenvolvimento produtivo e a sustentabilidade das empresas, ao menos como objetivos.
Hoje, com o mercado transnacional de capitais sendo dono do futuro econômico do mundo, os governos nacionais se tornaram reféns. Quando algumas ideias não prosperam em uma reunião tripartite, e são substituídas pelo “consenso neoliberal”, isso se transforma no pior inferno que qualquer economia nacional pode sofrer.
Como acontece já há dois… “um fantasma, percorre Europa”, talvez gerando consciência na classe trabalhadora. Mas, temo que não: desta vez é o fantasma do desemprego e das incertezas.
As análises sobre o perambular desse fantasma e as propostas econômicas que isso gera não são mais que um resumo da situação, e um elaborado mapa das posições, a modo de conclusão, das políticas dominantes.
Às vezes, no debate sobre esses elementos, no ardor da controvérsia intelectual e política, se deixa de lado a real correlação de forças existente. O neoliberalismo é dominante, mental e culturalmente, em grande parte do planeta. Grandes setores da sociedade já perderam qualquer visão de futuro. Por isso é alarmante a ineficaz oposição a este pensamento hegemônico.
Enquanto isso, alheias a polêmica ideológica, as vítimas do espectro do desemprego padecem de uma desproteção quase absoluta. Do ponto de vista material, ou seja, da mera subsistência física. A falta de sentido vital afeta milhões de seres humanos, educados pela ideia de que o trabalho é a condição indispensável das relações sociais e a base na qual se apoia a constituição da sociedade.
Seguimos enfrascados numa inércia discursiva carregada de passividade e de declamações, onde a aplicação fundamentalista e absolutista das leis de mercado levam ao desemprego, à crise econômica e a uma regressão nas condições e na convivência democrática, sob o império absoluto da lei econômica promovida pelo capitalismo selvagem.
Ás vezes, seguimos até por interesses mesquinhos, patrocinados pelas correntes de transmissão dos interesses do capitalismo transnacional.
Quando as crises das estruturas tradicionais da política nos levam ao mercado, esperamos pelas capacidades da sociedade para recriar e regular o mesmo. Lamentavelmente, no horizonte só se vê uma melancólica alternativa na forma de apocalipse: o “paraíso” neoliberal.
Devemos olhar o mundo tal como é, não simplesmente a pequena parcela que nos protege. Talvez esta seja a questão essencial para debater: há um amanhã, e temos que encontrá-lo.
Eduardo Camín é jornalista, membro da Associação de Correspondentes de Imprensa da ONU, redator-chefe internacional do Hebdolatino e analista associado ao Centro Latino-Americano de Análise Estratégica (CLAE).