O próximo governo federal tem como um de seus desafios a busca por novas soluções para velhos problemas, dentre eles a questão do emprego, especialmente a questão do auxílio desemprego, renda básica ou direito ao emprego.
O tema foi abordado no programa GGN Nova Economia desta quinta-feira (10/02), onde o jornalista Luis Nassif e o economista João Furtado conversaram com o ex-presidente da Codemig (Companhia de Desenvolvimento Econômico de Minas Gerais), Marco Antônio Castello Branco.
“A Declaração Universal dos Direitos Humanos, no artigo 23, consagra como um dos direitos de qualquer ser humano o direito ao emprego – isso é muito importante quando a gente fala de direitos humanos, que a gente enquadre o emprego como um elemento essencial”, lembra Marco Antonio Castello Branco.
Engenheiro metalurgista, Castello Branco lembra que raramente se fala do emprego como um elemento essencial para a cidadania. “Nós queremos ter o equilíbrio orçamentário a qualquer custo, uma inflação baixa de qualquer maneira, e não nos incomodamos de sacrificar um direito universal que é o direito ao emprego”.
Debate sobre o emprego
As abordagens em torno da questão do emprego são extremamente diversas, mas o que tem predominado é o chamado pensamento econômico convencional, onde existe uma relação de causa e efeito entre a inflação e o emprego.
“Para eu ter pouca inflação, botou-se na cabeça das pessoas quase como um dogma que nós temos de nos acostumar em ter pessoas que querem trabalhar, desempregadas”, diz Castello Branco. “E construímos inclusive elementos analíticos e matemáticos – se você quer abaixar a inflação, faça o favor de aumentar o desemprego”.
Tal tese tem dominado os debates e políticas macroeconômicas e monetárias desde a década de 1970, mas outra forma de se pensar a economia tem ganhado força: as propostas apresentadas pelo economista norte-americano Hyman Minsky, que era um estudioso da instabilidade financeira da economia.
“A economia é sempre em ciclos de altos e baixos: quando ela deixa de ter risco as pessoas começam a tomar atitudes muito arriscadas que geram uma crise. E isso é um fenômeno normal”, diz Castello Branco.
“Então, nós vamos sempre ter altos e baixos – ou seja, a demanda agregada vai ser objeto de fluxos de altas e baixas e que precisa existir um mecanismo mais inteligente de tratar o recurso mais importante de uma nação, que é a população dela, não condenando ao desemprego involuntário”.
Basicamente, o desemprego involuntário “é aquele que é o mais absurdo de a economia convencional, que tanto preza pela eficácia e efetividade, alocação mais efetiva e mais correta dos recursos, admitir que o recurso mais importante dela vai ficar ocioso sem produzir nada”, diz o ex-presidente da Codemig.
O Estado como empregador
Castello Branco usa como referência o papel do Estado como emprestador de última instância que, ao emitir moeda soberana no momento em que o mercado financeiro passa por problemas de liquidez, usa sua moeda para salvar o sistema financeiro.
“Se o Estado pode imprimir dinheiro – ou seja, usar o orçamento público para garantir liquidez e prevenir uma queda do sistema financeiro – porque ele não pode ser um empregador de última instância?”, diz Castello Branco. “Ou seja, na falta de empregos (o Estado) oferecer horas de trabalho para preservar o direito universal ao trabalho”.
Essa é a tese descrita por Minsky em vários trabalhos, e inclusive chegou a ser aplicada em várias ocasiões. O exemplo mais clássico foi o programa do New Deal nos Estados Unidos, mas também existem casos inclusive no Brasil – onde o governo de São Paulo lançou frentes produtivas de trabalho, onde as prefeituras que aderiram oferecem trabalho durante 4 dias da semana e no quinto dia um treinamento
Outro exemplo lembrado é o da Argentina, onde um programa semelhante foi adotado entre os anos de 2003 e 2008. “A Argentina estava completamente destruída, e a questão social foi muito forte naquele momento. O governo criou um programa para chefes de família, que teve um efeito extraordinário e que é objeto da literatura quando se fala do Estado como empregador de última instância”.
Em linhas gerais, quando se existe excedente de mão de obra, o Estado vai absorver esse excesso e coloca-lo para trabalhar em postos de trabalho com relevância, da mesma forma em que o excedente da produção agrícola é assumido nas fases de super safra, de forma que os preços não degringolam e o produtor rural não perca renda.
“A mesma coisa vai para o mundo do trabalho: eu vou pegar a mão de obra desempregada involuntariamente, e vou oferecer ou comprar ela – porque ninguém quer comprar, porque o preço dela é zero e você está cheio de desemprego (…) Então, o Estado vem com um preço mínimo, que é um salário decente e digno, mas que vai permitir ao desempregado com vontade de trabalhar poder conservar a capacidade laboral dele no ambiente social do trabalho”.
Entre as implicações de tal estratégia, estão a preservação de atitudes que facilitam a recolocação no mercado formal e a capacidade de produção, sem contar o multiplicador econômico (por possuir renda, ele pode consumir) e o multiplicador social.
Fonte: GGN
Texto: Tatiane Correia
Data original da publicação: 11/02/2022