Há 28 anos, morria o livreiro e militante político Raimundo Jinkings, que fez da venda de livros um meio de resistência durante a ditadura militar
Igor Natusch
Em tempos de tanto menosprezo à educação, à leitura e ao conhecimento, lembrar a memória do livreiro e líder sindical Raimundo Jinkings é mais importante do que nunca. O militante comunista, falecido em 5 de outubro de 1995, tornou-se notório por seu esforço em disseminar os livros entre a população paraense, ao mesmo tempo em que se mantinha ativo em diversas frentes de luta em favor da classe trabalhadora.
Nascido em Turimirim, no Maranhão, no dia 5 de setembro de 1927, Raimundo perdeu a mãe com apenas oito anos, e viveu a infância ajudando o pai na pequena propriedade rural da família. Chegou a Belém do Pará em 1945, para alistar-se na Força Aérea Brasileira. Mais tarde, atuaria como enfermeiro, escriturário e bancário – momento em que acabou se envolvendo no movimento sindical, chegando à liderança do Comando Geral dos Trabalhadores (CGT) no Pará.
A partir de 1952, ingressou no jornalismo, passando a escrever para veículos locais, como a Folha do Norte e o Estado do Pará. Tornou-se notório pelo estilo combativo e pelas críticas à situação de carestia de trabalhadores e trabalhadoras, revezando os artigos na imprensa com uma intensa agenda de militância. Integrante do Partido Comunista Brasileiro (PCB) no período anterior ao golpe de 1964, perdeu os direitos políticos e acabou preso, ficando também sem seus vencimentos como gerente no Banco de Crédito da Amazônia.
Como resposta à falta de dinheiro, Raimundo Jinkings dividiu-se entre as atividades de feirante (que exercia na Praça Batista Campos com parte da família) e livreiro. A Livraria Jinkings foi fundada em 1965, ao lado da esposa Isa Tavares, companheira de toda a vida. Começou a funcionar com alguns poucos exemplares, empilhados na sala de estar de sua residência: pouco depois, os volumes foram tomando conta da casa inteira e, por fim, tiveram que se mudar para a Rua dos Tamoios, local que tornou-se um verdadeiro polo de livre pensamento na capital paranaense.
Comprava os livros por reembolso postal, diretamente com as editoras, como forma de obter exemplares difíceis de encontrar e/ou mal vistos pela ditadura de então. Até mesmo por segurança, acabou desenvolvendo uma relação de proximidade com os clientes. Tinha especial predileção por ajudar universitários e jovens professores, chegando a vender fiado e anotar nomes em um caderninho para que pagassem quando pudessem. Para muitos, o lugar virou uma espécie de porto seguro, no qual se poderia debater longamente sobre temas políticos e filosóficos.
Foi preso várias vezes nesse período (geralmente de forma “preventiva”) e teve exemplares apreendidos em inúmeras ocasiões, mas nunca deixou o negócio livreiro para trás. A Livraria Jinkings durou até 2010, quinze anos depois da morte de seu idealizador. Antes, uniu-se ao amigo Carlos Augusto da Silva Sampaio para fundar uma editora, dedicada à publicação de pensadores marxistas e que ganhou o nome Boitempo. O projeto original durou pouco, mas foi retomado por Ivana Jinkings, caçula dos cinco filhos de Raimundo, e segue ativo até os dias atuais, com sede em São Paulo.