Há 135 anos, teve início a greve nas ferrovias da empresa Burlington, evento marcante na história sindical dos EUA.
Igor Natusch
Disparada em 1888, a greve em torno da companhia ferroviária Burlington, em Iowa (EUA), foi uma das mais sérias disputas de trabalho de todo o século 19 no país. Envolvendo mais de 1.000 grevistas em uma longa disputa contra poderosos empregadores, a violenta paralisação entrou sem pedir licença no imaginário de trabalhadores e trabalhadoras, sendo considerada um catalisador fundamental para a criação de um efetivo movimento sindical nos Estados Unidos.
Ainda incipientes, as organizações sindicais do país tomavam formas distintas, ajustando-se às necessidades de grupos específicos. Enquanto muitas fraternidades reuniam operários de qualquer nível de especialidade que trabalhassem em torno de uma determinada fábrica ou segmento, outras, como a Irmandade dos Maquinistas de Locomotivas (BLE, na sigla original) e a Irmandade dos Fogueiros de Locomotivas (BLF), congregavam trabalhadores altamente capacitados para tarefas bastante específicas. Na época, atuar na operação das máquinas de um trem era uma das atividades mais importantes e bem remuneradas de toda a indústria norte-americana – o que fazia desses profissionais, por outro lado, alvo frequente de tentativas de desvalorização por parte dos empregadores.
A Burlington fazia linha dura com seus funcionários, recusando-se a debater salários e forçando-os a abandonar sindicatos caso desejassem manter seus empregos. A insatisfação era tanta que, em fins de janeiro de 1888, maquinistas e fogueiros uniram-se em um grupo comum de negociação e tentaram, sem sucesso, reverter demissões recentes e obter padronização salarial dentro das categorias. Diante da intransigência, a decisão foi de cruzar os braços. No dia 27 de fevereiro, os trabalhadores abandonaram as locomotivas, o que causou dias de caos em todo o sistema ferroviário de Iowa e teve efeito significativo em estados vizinhos.
A greve, porém, teve pouco sucesso prático. A Burlington passou a chamar ex-funcionários e trabalhadores de outras regiões, atraindo-os com a garantia de que sua contratação seria permanente. Além disso, a companhia colocou guardas armados em áreas estratégicas, dificultando a realização de piquetes. Apesar de confrontos (alguns sangrentos) e tentativas de sabotagem por parte dos grevistas, as medidas foram capazes de, após cerca de um mês, colocar o sistema em uma situação próxima da normalidade. Mesmo assim, os dois sindicatos resistiam em áreas isoladas, e só em janeiro de 1889 declararam a paralisação encerrada – em um cenário onde a grande maioria dos grevistas já não tinha mais empregos para os quais pudessem retornar.
Apesar do fracasso final na busca de seus objetivos, a greve em Burlington teve efeito duradouro na organização dos trabalhadores. Nas décadas seguintes, o percentual de sindicalizados na indústria do país cresceu rapidamente, e o temor de novas greves semelhantes à de 1888 fez com que as companhias passassem a adotar uma postura mais conciliadora nas negociações. Esse cenário permitiu que surgisse uma agenda comum entre diferentes categorias, levando às reformas sociais que estariam no centro do debate dali por diante.