Estatuto do Trabalhador Rural estendeu ao ambiente do campo os direitos dos trabalhadores urbanos.
Igor Natusch
Primeira legislação brasileira a ter efeito concreto nas relações de trabalho no ambiente rural, a Lei 4214/63 foi promulgada em 2 de março de 1963, passando a ser conhecida desde então como o Estatuto do Trabalhador Rural. Fortemente inspirado na Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), de 1943, o texto foi decisivo para introduzir e efetivar direitos como salário mínimo, férias, descanso semanal, indenização, aviso prévio e participação sindical – todos, até então, ainda distantes para a grande maioria dos homens e mulheres do campo no Brasil.
Antes do Estatuto, as tentativas de criar uma legislação para organizar o trabalho no meio rural eram esparsas e, no geral, pouco efetivas. Primeiras leis aprovadas no Congresso, os Decretos nº 979 (1906) e nº 6532 (1907) disciplinavam a criação de sindicatos agrícolas, mas nunca chegaram a ser efetivamente implementadas. O Estatuto da Lavoura Canavieira (1941) teve pouco efeito prático, e o Decreto-Lei nº 7038 (1944), novamente voltado à organização entre trabalhadores e patrões no campo, sofreu grande pressão de grupos ligados aos grandes proprietários rurais, restando inefetivo pela falta de regulamentação.
Dentro da política de reformas sociais instituída por Getúlio Vargas desde seu retorno à presidência, em 1951, a situação de homens e mulheres do campo voltou ao cenário político. Em 1954, o Executivo enviou ao Congresso um projeto com itens como a limitação da jornada de trabalho e a garantia de estabilidade e previdência social – que não chegou a ser aprovado, mas consolidou a agenda do trabalhador rural como um tema de profundo debate na sociedade brasileira.
Apresentado em 1956 pelo deputado gaúcho Fernando Ferrari, do Movimento Trabalhista Renovador (MTR), o projeto que se transformaria no Estatuto do Trabalhador Rural só encontrou um cenário favorável a partir da chegada de João Goulart à presidência. A partir dos esforços do então ministro do Trabalho, Almino Afonso, e da pressão crescente dos cada vez mais organizados movimentos sociais do campo, a bancada trabalhista (que havia crescido significativamente em anos anteriores) teve a força política necessária para fazer o Estatuto avançar rumo à aprovação.
Como as tentativas anteriores, porém, a lei de 1963 não atingiu a plena efetivação. Pontos que necessitavam de regulamentação acabaram não sendo devidamente aplicados, e muitos proprietários rurais se mobilizaram para fazer o Estatuto fracassar, demitindo trabalhadores em massa e os substituindo por temporários, os chamados volantes. Alguns dos próprios defensores da necessidade da lei mostraram-se insatisfeitos, acusando o texto de ser uma simples transposição da CLT, sem levar em conta as inúmeras diferenças entre os universos do trabalho urbano e rural.
O Estatuto do Trabalhador Rural seria revogado pouco mais de dez anos depois de sua entrada em vigor, substituído pela Lei nº 5889-1973. Esse novo texto manteve alguns pontos da norma anterior, como a prescrição bienal e a estabilidade, determinando que a CLT fosse aplicada aos empregados rurais em todos os demais pontos omissos.