Há 104 anos, chegava ao fim a greve da La Canadiense, que resultou na jornada de oito horas de trabalho na Espanha.
Igor Natusch
Há um século, cerca de 70% de toda a atividade produtiva da Catalunha, na Espanha, foi interrompida pela mobilização de trabalhadores e trabalhadoras. Conduzida pela organização anarco-sindicalista Confederación Nacional del Trabajo (CNT), a greve da La Canadiense, como ficou conhecida, é considerada uma das mais significativas da história, em especial por um dos resultados obtidos: a aprovação de uma lei instituindo a jornada de oito horas de trabalho, uma das primeiras legislações do tipo em todo o mundo.
Com sede em Barcelona, a Riegos y Fuerzas del Ebro era a principal empresa a fornecer eletricidade na Espanha, e era popularmente conhecida como La Canadiense (A Canadense), uma vez que o principal acionista da companhia era o Banco do Comércio Canadense. Adotando uma política de cortes salariais, a planta hidrelétrica vinha gerando insatisfação entre os empregados. Em fevereiro de 1919, oito funcionários notórios por suas atividades políticas foram demitidos. Então a mais forte central sindical espanhola, a CNT denunciou uma perseguição a trabalhadores sindicalizados, e decidiu reagir ao que considerou um gesto arbitrário dos empregadores.
Em 5 de fevereiro daquele ano, cerca de 140 trabalhadores abandonaram seus postos de trabalho e promoveram passeatas – acompanhados, menos de uma semana depois, por quase todos os seus colegas de La Canadiense e funcionários de várias outras plantas de produção de energia. A ideia de cruzar os braços se alastrou, e logo trabalhadores da indústria têxtil e ferroviários se juntaram à paralisação, com demandas específicas.
Com as atividades econômicas congeladas, o governo declarou lei marcial e instituiu um estado de emergência – uma estratégia para promover prisões em massa e conclamar os trabalhadores restantes ao serviço militar, esvaziando a greve. O plano, contudo, fracassou: sensibilizados pela luta dos grevistas, os trabalhadores das gráficas da região simplesmente se recusaram a imprimir qualquer material que informasse sobre a convocação.
A paralisação durou, ao todo, quarenta e quatro dias, encerrando-se em 17 de março de 1919. Mesmo com a prisão dos dirigentes da CNT e de quase 3 mil grevistas, as autoridades se viram forçadas a reconhecer que apenas uma mesa de negociação seria capaz de reconduzir a Catalunha à normalidade. Para encerrar a paralisação, o governo espanhol concordou em editar o Decreto de la jornada de ocho horas de trabajo, colocando o país entre os primeiros a atender uma demanda internacional e histórica de trabalhadores e trabalhadoras. Além disso, decidiu soltar boa parte dos detidos e reconheceu a legalidade dos sindicatos, atendendo quase integralmente as exigências do comando de greve. Uma nova tentativa de greve, que buscava garantir a liberdade dos presos, acabou fracassando dias depois – mas a maior parte das conquistas originais foi mantida, coroando um dos mais emblemáticos movimentos grevistas do século 20.