Há 127 anos, nascia Buenaventura Durruti, um dos principais nomes da militância anarquista na Espanha e no mundo
Igor Natusch
Uma mala velha, carregando algumas roupas pessoais, e uma dívida de 100 pesetas com a Confederación Nacional del Trabajo (CNT). Isso é tudo que o operário anarquista Buenaventura Durruti Dumange deixou como posses ao morrer. A mirrada lista de bens exemplifica bem a tenacidade de princípios do espanhol, nascido no dia 14 de julho de 1896, na cidade de León: mesmo participando de assaltos a bancos e ricos proprietários durante toda a vida, nunca colocou dinheiro no próprio bolso. Hoje, Durruti é amplamente reconhecido como herói e um dos mais significantes militantes anarquistas do século passado, em uma trajetória marcada pela ousadia e pela obstinação.
Filho de mecânico, o jovem Buenaventura seguiu o caminho profissional do pai e, como ele, foi filiado à Unión General de Trabajadores (UGT), de caráter socialista. Após participar da greve convocada pelo central sindical em agosto de 1917, acabou demitido e rumou para a França, onde teve contato com anarquistas exilados que influenciaram sua formação intelectual. Indignado com a repressão brutal do governo espanhol contra os anarquistas, retornou ao país natal em 1920 e formou o grupo paramilitar Los Justicieros, que se pretendia uma reação a crimes cometidos por governantes e patrões. De fato, o cenário na Espanha era de uma guerra civil não declarada, com frequentes relatos de militantes operários executados na rua por pistoleiros. Nesse cenário de violência, chegou a participar de um plano para assassinar o rei Alfonso XIII, desbaratado pelas autoridades. Pouco depois, foi para Madrid, onde, movido por princípios semelhantes, envolveu-se de forma decisiva na formação do grupo Los Solidarios.
Durrutia não deixou textos teóricos escritos e, apesar de destacado orador, nunca viu a si mesmo como um pensador anarquista: sua militância era prática, destemida e sem qualquer compromisso com as instituições. Promovia assaltos a banco para financiar a causa, participava de atentados (fala-se de sua atuação, por exemplo, no assassinato do cardeal Juan Soldevilla y Romero, em 1923, em represália à execução do anarco-sindicalista Salvador Seguí) e empreendeu ataques contra bases militares durante a ditadura de Miguel Primo de Rivera, que durou de 1923 e 1930.
Não surpreende que tenha passado longos períodos preso ou fugindo das autoridades. Durante vários anos, esteve na América Latina com o grupo Los Errantes, participando de ações em Cuba, México, Peru, Chile, Uruguai e Argentina. Durante novo exílio na França, conheceu a militante Emilienne Morin, sua companheira desde então. Até o fim de sua vida, Durruti havia sido condenado à morte três vezes (por Espanha, Chile e Argentina) e expulso de oito países.
Integrando a CNT e a Federación Anarquista Ibérica (FAI), Buenaventura Durruti participou do levante de 19 de julho de 1936, que deu início à Guerra Civil Espanhola. Meses depois, em 19 de novembro daquele ano, recebeu um tiro pelas costas, enquanto atuava junto com sua milícia na defesa de Madrid. As circunstâncias de sua morte seguem envoltas em incerteza desde então. Há quem diga que foi morto à traição por socialistas da CNT, enquanto outros alegam que o tiro veio dos próprios anarquistas, que desejavam abandonar a batalha e discordavam da disciplina imposta por Durrutia. Outra versão é de que tenha sido atingido à distância por inimigos, e alguns historiadores sustentam que o tiro foi acidental, disparado pela pistola de um companheiro enquanto este desembarcava de um veículo.