Há 120 anos, operários cariocas interromperam suas atividades reivindicando redução da jornada de trabalho e aumento de salários. Foram tratados como “desordeiros” e a polícia usou de violência para conter o movimento.
Laura Glüer
Há um século, acontecia no Brasil a primeira grande greve geral. O movimento teve início em 11 de agosto de 1903, no bairro das Laranjeiras, no Rio de Janeiro, na Fábrica de Tecidos Alliança. Nos dias seguintes, operários de outras fábricas do Rio de Janeiro foram aderindo ao movimento, que acabou durando 26 dias.
Cerca de 40 mil operários, da indústria têxtil e de outros setores produtivos, interromperam suas atividades, reivindicando redução da jornada de trabalho e aumento de salários. Tecelões, alfaiates, chapeleiros, pintores, vidreiros, sapateiros, estivadores e operários de pedreiras uniram-se na luta pela simbólica jornada de oito horas como bandeira.
No decorrer dos dias, a greve se espalha por vários bairros da cidade: São Cristóvão (fábrica de vidros Esberard, entre outras), Vila Isabel (Confiança Industrial), Andaraí (Cruzeiro), chegando à Zona Sul – Botafogo (Corcovado), Jardim Botânico (Carioca) e ao remoto bairro de Bangu. O movimento se encerrou em 5 de setembro de 1903.
A deflagração da greve levou a classe patronal a solicitar a intervenção policial. Os trabalhadores foram tratados como “desordeiros” e a Polícia do Rio de Janeiro usou de violência para conter o movimento. Houve troca de tiros, disparos de bombas e prisões próximo às fábricas. Exército e Marinha também foram acionados. As vilas operárias foram invadidas e os trabalhadores, por fim, forçados a retornar às atividades.
A pesquisadora Francisca Nogueira de Azevedo realizou uma pesquisa em periódicos da primeira década do século XX, reconstruindo o cenário deste movimento. Em seu livro Malandros Desconsolados (2006) estabeleceu uma espécie de “diário da greve”, em sequência cronológica.
O Rio de Janeiro vivia um período de aceleração da urbanização e do crescimento demográfico. A então capital federal passava por uma expansão de sua atividade industrial, com a chegada de muitos imigrantes. Surgia, pela primeira vez, uma classe operária, constituída por um proletariado fabril e por categorias vinculadas a outros serviços, na região portuária, no comércio, e nos transportes em geral.
Esse primeiro grande movimento grevista não obteve os resultados esperados, mas acabou tornando-se um marco na história das relações de trabalho no Brasil. Pela primeira vez, a classe trabalhadora conseguiu mostrar a força de sua mobilização e a greve ganhou repercussão na imprensa da época, com a publicação de artigos e charges.
Referência
AZEVEDO, Francisca Nogueira de. Malandros desconsolados: o diário da primeira greve geral do Rio de Janeiro. Rio de Janeiro: Relume Duamara, 2006.