Reforma trabalhista não tem qualquer influência na geração de empregos, afirmam economistas

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Fotografia: Marcello Casal Jr./Agência Brasil

por Felipe Prestes

O segundo trimestre de 2024 teve a menor taxa de desemprego para este período do ano desde o início da série histórica, em 2012. Segundo o IBGE, havia no Brasil apenas 6,8% de desocupados, pessoas que procuravam trabalho e não encontravam. Os números foram festejados em editorial do jornal O Globo como um reflexo da reforma trabalhista de 2017. Para o veículo de imprensa, a redução de ações trabalhistas e os empregos intermitentes teriam colaborado para a criação de vagas de trabalho. Economistas ouvidos pelo DMT em Debate foram unânimes de que não existe relação entre as mudanças na legislação trabalhista e a queda no desemprego.

“A própria Organização Internacional do Trabalho fez um levantamento nos diversos países que fizeram reforma trabalhista e não percebeu uma alteração na trajetória do emprego a partir da desregulamentação ou até mesmo de uma maior regulação”, pontua o economista e presidente do IBGE, Marcio Pochmann. “A determinação do emprego não é dada pelo custo do trabalho, mas pela existência ou não de demanda para a produção pela qual este trabalhador vai ser empregado. Mesmo que você reduza o custo da mão de obra, não havendo demanda adicional, o que o empresário pode fazer é substituir esse trabalhador por outro com menor proteção”, completa.

Neste sentido, o que explica a atual redução do desemprego para Pochmann é o crescimento econômico e o aumento do consumo. “Através da elevação do poder aquisitivo da população, há uma ampliação do consumo. Esse consumo vem acompanhado de uma ocupação da capacidade ociosa na estrutura produtiva”, explica.

Para José Dari Krein, professor do Instituto de Economia da UNICAMP, a resposta para a queda do desemprego também estaria no crescimento econômico. “O que você tem é o movimento natural da economia. E a ativação da economia não se explica pela reforma trabalhista. Se explica pela forma como a economia foi operacionalizada, passando dinheiro para os mais pobres, aumentando o gasto público. As empresas contratam se tiver dinâmica econômica, se a economia está mostrando certo crescimento”. Dentre as razões para maior dinamismo na economia estariam, segundo o professor, políticas de transferência de renda e a retomada de obras públicas.

Krein aponta que os contratos “atípicos”, como os trabalhos intermitentes, permitidos pela reforma trabalhista, são inexpressivos no cômputo geral, não tendo importância na queda do desemprego. “Se justifica que aumentaram os contratos atípicos. De fato, cresceram um pouco, mas é muito pouco expressivo no total dos empregos criados”.

Carlos Henrique Horn, professor do Departamento de Economia e Relações Internacionais da UFRGS, ressalta que o IBGE não investiga os contratos de trabalho intermitente. “É difícil afirmar com com alguma segurança o que está acontecendo em relação ao contrato intermitente de trabalho, mas o emprego intermitente no total dos empregos deve ser uma fração muito pequena”.

Para Horn, a razão para a queda do desemprego seria a mesma citada pelos demais economistas. “Tem uma razão básica: a economia vem crescendo. A gente agora em 2024 vai fazer o quarto ano seguido de crescimento da atividade econômica depois que começou a se recuperar da Covid. E esse crescimento da atividade econômica está abrindo postos de trabalho”.

Qualidade dos empregos ainda é baixa

O professor da UFRGS diz que a reforma não influencia na quantidade de empregos, mas pode, sim, impactar na qualidade destes trabalhos. Horn aponta que nos últimos dez anos, de agosto de 2014 a agosto de 2024, o número de empregados no setor privado com carteira assinada aumentou em 2,9%, já o número de empregados sem carteira assinada cresceu 37,3%. Já são mais de 14 milhões de trabalhadores sem carteira no setor privado, em um universo de 52,9 milhões de empregados no setor privado.

O professor da Unicamp José Dari Krein acredita que a informalidade deve cair se a economia continuar crescendo. “É uma dinâmica do mercado de trabalho. Primeiro crescem os informais, depois quando se tem uma certa perspectiva de continuidade da relação do emprego, da economia indicando certo crescimento, você tende a contratar formalmente”, explica.

Krein ressalta que mais de 50 milhões de brasileiros estão em situações como informalidade, desemprego, desalento (pessoas que sequer procuram emprego por falta de perspectivas) e subutilização por insuficiência de horas trabalhadas. “Você tem um mercado de trabalho muito desorganizado, muito desestruturado ainda. Agora, é bem-vindo esse movimento da queda do desemprego, porque isso vai dar possibilidade do poder de barganha do trabalhador mudar, e você melhorar o mercado de trabalho”.

Por esse mercado de trabalho desestruturado, o professor da UNICAMP afirma que é fantasioso falar em pleno emprego no país, apesar da desocupação estar em um dos níveis mais baixos da série histórica. “Nós não estamos em situação de pleno emprego, como o mercado financeiro, a Faria Lima tenta dizer pra gente, e, por isso, preventivamente já subiram a taxa de juros, afirmando que o nível de atividade está muito alto, que o emprego está muito alto, que isso vai gerar inflação. Primeiro que a inflação que existe hoje é muito mais resultante de questões externas e, particularmente, de questões climáticas. O juro não tem relação, o que subir o juro vai fazer é conter a atividade econômica, causar um crescimento mais baixo da economia. É uma coisa absolutamente absurda, é um remédio para uma doença errada, um diagnóstico errado da doença”.

O presidente do IBGE, Marcio Pochmann, ressalta que o país ainda está apenas ocupando sua capacidade produtiva ociosa durante a crise econômica. Por isto, grande parte dos empregos abertos tem tido baixos salários. “Mais de 90% dos empregos são de até um salário mínimo e meio”, relata.

Para continuar crescendo e gerando empregos, o país precisará de novos investimentos para ampliar a capacidade produtiva. “Em algum momento nós vamos chegar na capacidade produtiva plenamente utilizada. Nesse sentido as políticas que o governo Lula tem defendido, de reindustrialização, investimentos em infraestrutura através do PAC, a política de transição ecológica, esse conjunto de ações é que pode fazer com que se eleve investimento a tal ponto que você abra novos empregos, e empregos de melhor qualidade”, projeta Pochmann.

 

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