A juíza Clarissa Rodrigues Alves, da 12ª Vara Cível de São Paulo, negou o pedido de vínculo empregatício de um motorista contra a Uber por entender que a relação entre os dois é regulada pelo Código Civil e, mais especificamente, pelo contrato entre as partes e não pela Consolidação das Leis do Trabalho (CLT).
O processo originalmente havia sido ajuizado na primeira instância do Tribunal Regional do Trabalho da 3ª Região (TRT3), em Minas Gerais, mas a juíza Fernanda Garcia Bulhões Araújo, da 1ª Vara do Trabalho de Coronel Fabriciano, aplicou o entendimento do Supremo Tribunal Federal (STF) na Reclamação 59.795 e enviou o caso para a Justiça Comum, mais especificamente para o Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo (TJSP).
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Como o JOTA tem reportado, em reclamações constitucionais, a maioria dos ministros do STF adotou o entendimento de que cabe à Justiça Comum e não à Justiça do Trabalho avaliar os pedidos de vínculo de emprego nos casos em que há contratos entre pessoas jurídicas (pejotização), contratos de franquias e da nova economia (uberização).
Esta ala majoritária da Corte avalia que o STF já decidiu que há relações de trabalho diversas das de emprego, que é regida pela CLT, como foi definido nas ADI 3.961 (terceirização da atividade-fim) e ADI 5.625 (contrato de parceria em salões de beleza), ADPF 324 (terceirização), ADC 48 (terceirização), ADC 66 (prestação de serviços intelectuais por pessoas jurídicas para fins tributários e previdenciários) e RE 958.252, tema 725 de repercussão geral (terceirização). E como há um contrato de natureza civil entre as partes, caberia à Justiça Comum avaliar se há eventual fraude.
No caso, o motorista afirmava que foi imotivadamente dispensado em dezembro de 2022, já que foi surpreendido com o bloqueio de seu perfil na Uber, o que impede de realizar corridas, de forma que ele deveria receber as verbas rescisórias correspondentes, previstas na CLT. Também requeria uma indenização de dano moral por submissão a um “regime servil”.
Mas a juíza Clarissa Rodrigues Alves, da 12ª Vara Cível de São Paulo, considerou que a relação estabelecida entre as partes tem natureza civil, não estando a Uber obrigada a manter cadastrado em sua plataforma qualquer pessoa como motorista, o que se insere no princípio da liberdade de contratar, como prevê o artigo 421 do Código Civil.
A juíza entendeu que a Uber demonstrou o excesso de recusas de trajetos por parte do autor, além de posturas inadequadas e pouco educadas junto aos clientes, condutas que violam os termos do contrato entre as partes e que levaram à suspensão da conta.
“Importante destacar que a ré, como pessoa jurídica prestadora de serviço, possui responsabilidade objetiva sobre as atitudes de seus prepostos perante terceiros e, consequentemente, tem liberdade para rescindir o contrato com aqueles motoristas que descumprem as normas previamente estabelecidas por ela, colocando em risco não apenas a sua reputação como a vida e integridade física de seus clientes”, escreveu a magistrada.
Desta forma, a juíza não vislumbrou “qualquer abusividade na desativação temporária da conta do autor, não havendo qualquer dano indenizável ante a ausência de ato ilícito”.
Procurada, a Uber afirmou que “motoristas parceiros são profissionais independentes e, assim como os usuários, podem cancelar qualquer viagem quando julgarem necessário. Cancelar excessivamente solicitações de viagens já aceitas, porém, representa abuso do recurso e configura violação ao Código da Comunidade por mau uso da plataforma, pois atrapalha o seu funcionamento e prejudica intencionalmente a experiência dos demais usuários e motoristas”.
Além disso, a Uber diz que “toma com absoluta seriedade a decisão de desativar uma conta da plataforma. Todas as desativações estão fundamentadas nas políticas e diretrizes da plataforma, como o Código da Comunidade, que foi criado para que a experiência com o aplicativo seja sempre positiva, segura e respeitosa tanto para motoristas parceiros quanto para usuários”.
“Temos processos rigorosos em nosso suporte, feito por humanos, que consideram diversos aspectos antes de tomar medidas em contas da plataforma. A menos que haja uma emergência, ameaça à segurança ou outra situação de risco, enviamos diversos comunicados ao motorista parceiro antes de desativar sua conta permanentemente. Desativações ocorrem na minoria das situações, e existem procedimentos para que seja solicitada revisão caso o parceiro entenda que houve alguma decisão equivocada”, diz a empresa.
O processo tramita com o número 0041081-17.2023.8.26.0100.
Fonte: Jota
Texto: Kalleo Coura
Data original da publicação: 12/07/2024