Barroso nega influência de lobbies empresariais, mas sua agenda mostra o contrário

Foto: Antonio Augusto/STF

Presidente do STF discursa como líder patronal em evento bancado por empresários.

Cássio Casagrande

Fonte: JOTA
Data original da publicação: 16/06/2025

Luís Roberto Barroso proferiu palestra no Guarujá, no último dia 7 de junho, na qual negou haver demasiada influência de lobbies empresariais junto a ministros do Supremo Tribunal Federal (STF), inclusive à sua própria pessoa, que recentemente foi filmada em animada festa na casa do principal executivo do iFood.

Contraditoriamente, a declaração foi feita em um evento organizado por “entidade civil” conhecida como Esfera Brasil, que vem a ser um think tank criado pelo baronato empresarial de São Paulo para incutir no judiciário o seu ideário liberal, antitrabalhador e antisindicato…

E, mais paradoxal ainda, após negar que seja influenciado pelo empresariado (de quem se compadeceu, por ser “vítima de preconceito” – não ria leitor), Barroso proferiu veemente discurso contra a “indústria de ações trabalhistas”, ao estilo de um líder patronal reacionário, vocalizando ideias propaladas pelos mais retrógrados plutrocratas brasileiros, ideias que aliás não encontram respaldo na realidade dos fatos.

Para rebater a percepção geral de que se reúne e atende frequentemente os ricos e poderosos do país, Barroso argumentou que “conversa com todo mundo”, inclusive “sindicatos e índios (sic)”.

Bem, diante desta novidade, fui dar uma olhada na agenda oficial do presidente do STF, disponibilizada no site da instituição, para o ano de 2025. Não encontrei ali indígenas, sindicatos ou líderes trabalhistas (exceto uma associação de servidores do judiciário, atendida duas vezes, por dever de ofício, evidentemente).

Em contrapartida, o presidente do STF recebeu ou se encontrou com líderes empresariais, ou ainda participou de eventos de interesse do empresariado nada menos do que 22 vezes! Tiveram o privilégio de serem recebidos no gabinete da presidência do STF, o CEO da Ambev, o presidente da Febraban, um representante da Indústria da Construção Civil, dentre outros.

Em viagem à Suíça no início do ano, Barroso arrumou tempo para se encontrar oficialmente com representantes das empresas Equinor e Google, ambas com muitos interesses econômicos no Brasil. Neste ano de 2025, o Senhor Barroso proferiu diversas conferências em eventos organizados para debater interesses empresariais, como a do último fim de semana no Guarujá, tendo, inclusive, no dia 26/02, falado no evento “BTG pactual CEO Conference”.

A propósito, pergunto ao leitor se acha normal o presidente da Suprema Corte proferir palestra exclusiva para uma empresa. Seria conveniente que o STF divulgasse se essa palestra foi remunerada ou não, bem como quem arcou com as despesas de transporte e hospedagem, uma vez que consta como compromisso oficial do presidente da Corte.

A parte mais inacreditável do discurso de Barroso foi sua afirmação de que juízes decidem apenas de acordo com o direito, sem qualquer influência do empresariado. A declaração beira o non sense, exatamente porque saída da boca de um magistrado que já afirmou, em autos de processo, que “ouviu de um amigo empresário” que é muito difícil fazer negócios no Brasil com a atual legislação trabalhista. Isso para não falar daquela afirmação estapafúrdia de Barroso de que o Brasil possuiria 98% de ações trabalhistas do mundo, informação falsa que chegou ao ministro por outro “amigo empresário”. Mas, claro, esses lobbies empresariais não afetam em nada a opinião dos magistrados, pois sabemos que são Deuses do Olimpo indiferentes às paixões humanas.

Cássio Casagrande é doutor em Ciência Política, professor de Direito Constitucional da graduação e mestrado (PPGDC) da Universidade Federal Fluminense (UFF). Procurador do Ministério Público do Trabalho no Rio de Janeiro. Visiting Scholar na George Washington University (2022).

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