1º de janeiro de 1955: surge a liga camponesa de Vitória de Santo Antão (PE), pioneira na reforma agrária

Liga camponesa formada por arrendatários no Engenho Galileia conquistaria, em 1959, primeira desapropriação no Brasil.

liga camponesa
Fotgrafia: Wikimedia Commons

Guilherme Daroit

Do fogo morto de um engenho de açúcar desativado, nasceria, nos anos 1950, a chama da luta pela reforma agrária no Brasil. Arrendatárias há anos das terras do Engenho Galileia, em Vitória de Santo Antão (PE), as famílias que ali plantavam criariam, em 1955, a Sociedade Agrícola e Pecuária de Plantadores de Pernambuco (Sappp). Inicialmente pensada como órgão de apoio mútuo em meio à penúria na qual viviam os agricultores, a sociedade conquistaria a primeira desapropriação para reforma agrária no país, e desataria uma rede de ligas camponesas pelo interior brasileiro.

Eram cerca de 140 as famílias foreiras no Galileia, que pagavam uma quantia ao proprietário do antigo engenho de açúcar para utilizar o terreno. A situação se complicaria em meados da década de 1950, quando muitas delas não mais conseguiriam pagar o foro, sendo ameaçadas de expulsão. Como solução, criariam em 1954 a Sappp com o objetivo de viabilizar um fundo para os funerais, a aquisição de implementos e a reivindicação de ajuda do governo.

Proprietário da terra, Oscar Beltrão seria o presidente, até ser convencido de que aquela iniciativa tendia ao comunismo. Com isso, abandonaria o apoio, retomando as ameaças de aumento no custo dos arrendamentos e de expulsão das famílias envolvidas. Mesmo sem vinculação real, a Sappp logo passaria a ser chamada de liga por seus detratores, unindo a sua trajetória àquela das Ligas Camponesas formadas pelo Partido Comunista do Brasil (PCB) na década anterior, como forma de dificultar a sua aceitação junto à sociedade.

O traço em comum entre as duas gerações de ligas camponesas residia no camponês José dos Prazeres, um dos fundadores da Sappp, que havia participado anteriormente da Liga de Iputinga, em Recife.

Sem apoio no engenho, os foreiros buscariam a ajuda de advogados, e a encontrariam no poder legislativo local. Então deputado estadual pelo Partido Socialista Brasileiro (PSB) e conhecedor da causa campesina, Francisco Julião assumiria a defesa dos agricultores, que institucionalizariam a Sappp em 1º de janeiro de 1955. Naquele mesmo ano, organizariam o primeiro Congresso de Camponeses de Pernambuco, reativando a ideia das ligas camponesas e atraindo interesse da imprensa para a causa.

Em 1957, Julião protocolaria projeto de lei para desapropriação da Galileia, buscando transferir a posse para as famílias que integravam a liga camponesa de Vitória de Santo Antão. O projeto só seria aprovado em dezembro de 1959, e sancionado dois meses depois, em fevereiro de 1960, naquele que é entendido como o primeiro caso de desapropriação de terras para reforma agrária no Brasil.

Em 1961, as ligas já se espalhavam pelo Nordeste e por outras regiões do Brasil, com 25 núcleos apenas em Pernambuco. Naquele ano, seria fundado o Conselho Nacional das Ligas Camponesas, com núcleos em 13 estados, sendo o maior deles o de Sapé, na Paraíba, com cerca de 10 mil membros em seu auge. Ainda no governo João Goulart, porém, as ligas começariam a perder espaço para o sindicalismo rural, mais próximo ao poder público. A pá de cal viria com o golpe militar de 1964, após o qual as principais lideranças das ligas seriam presas, mortas ou sairiam do país, encerrando a trajetória iniciada no Engenho Galileia.

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