Trabalhadores do Facebook e estresse pós-traumático

Existem profissões que em tempos foram tomadas como ficção científica. Se há uns anos ficção era passar os dias em frente a uma tela, em contato com conteúdos traumatizantes produzidos por pessoas, para ganhar a vida, aqui está a virada para a realidade.

Os muitos moderadores que trabalham com o Facebook e Youtube, contratados pela empresa Accenture, foram submetidos a assinar documentos em como entendem que o seu trabalho pode causar perturbação de estresse pós-traumático (PSPT). Essa perturbação caracteriza-se por episódios de dissociação da realidade. Certos sujeitos ou memórias são capazes de tirar a pessoa do presente, fazendo-a passar outra vez por aquilo que a traumatizou. PSPT (PTSD em inglês) é associado a perturbações de sonho e de ansiedade elevada e tem uma alta comorbilidade com perturbações depressivas.

“Constantemente atualizamos a informação que passamos às pessoas para garantir que elas tenham uma compreensão clara do trabalho que realizam”, disse a empresa em comunicado. Este não aponta o dedo às consequências na saúde mental dos trabalhadores, mas tenta tornar a situação legítima ao revelar que é transparente. É claro que compreender os riscos do trabalho não atenua as suas consequências.

A Google e o Facebook admitem ainda não terem analisado os documentos, no entanto exigem à Accenture que providencie suporte psicológico aos trabalhadores, algo que não acontece. Ao mesmo tempo, o Facebook é alvo de processos na Califórnia e na Irlanda por parte de antigos trabalhadores. Estes dizem terem sofrido graves danos psicológicos na sua função de moderadores. Agressões físicas, tortura animal e pedofilia fazem parte daquilo que esses trabalhadores filtram todos os dias em vídeos e imagens: um dia normal de trabalho.

No Facebook, rede social com 1,6 mil milhões de utilizadores diários, a gigante Accenture emprega 15 mil moderadores por todo o mundo, direta e indiretamente. Imagine-se o número total de trabalhadores para essa função tendo em conta o resto de plataformas existentes na internet. Uma profissão fantasma, irreconhecida e esquecida pela maioria, cujos problemas diários ficam silenciados por acordos de confidencialidade às empresas. O esquema está montado.

Tendo em conta a realidade das redes sociais, das plataformas on-line e da sua dimensão, já está mais que na altura de começar a derrubar as paredes que cobrem e escondem as dificuldades e limitações de direitos desses trabalhadores. Não existe justiça em sacrificar a saúde mental pelo lucro gerado através da experiência do utilizador. Existe uma necessidade de colocar em prática novos métodos dignos e justos.

Fonte: Esquerda, com ajustes para o Português do Brasil
Texto: Ernesto Oliveira
Data original da publicação: 11/02/2020

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