Terceirização afronta direito do trabalho, diz pesquisadora

Fotografia: Charles Soveral/DMT

por Charles Soveral

Uma forte ameaça que afronta os direitos sociais dos trabalhadores e um retrocesso nas relações de trabalho. Essa é a definição do processo de terceirização feita pela professora e pesquisadora da Universidade Federal da Bahia (UFBA), Maria da Graça Druck, no último dia 29 de outubro, em Curitiba (PR), durante uma mesa-redonda de debates do XIII Encontro Nacional da Associação Brasileira de Estudos do Trabalho (ABET).

Com pós-doutorado na Université Paris XIII, Maria da Graça Druck centrou, nos últimos anos, o foco de seus estudos nos processos de flexibilização, precarização, reestruturação produtiva, terceirização, informalidade e sindicatos. Ela lembra que o atual movimento que busca aprovar o Projeto de Lei 4330/2004, a PL da Terceirização, como está sendo conhecida, ressurgiu na pauta do Congresso Nacional a partir de pressão de setores conservadores, como a Confederação Nacional da Indústria (CNI), a qual editou em 2012 a obra 101 medidas para modernizar as relações trabalhistas.

Segundo ela, o conjunto de sugestões propostas no documento da CNI desestrutura totalmente a Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), fazendo prevalecer uma antiga máxima neoliberal que diz que o “negociado prevalece sobre o legislado”. Maria da Graça considera que, atualmente, o Brasil vive o que ela chama de “epidemia” da terceirização, que se espalha por todos os setores produtivos do país. “Nasceu no campo, nas áreas rurais, e se transferiu para o setor urbano. Onde a terceirização mais cresceu nos últimos anos foi no setor público e no setor de saúde, que acaba por tornar precário o trabalho de todos os que são e até dos que não são terceirizados. No setor público, ainda ocorre uma visível perda de qualidade dos serviços com duplo prejuízo para a sociedade”, comenta ela.

A pesquisadora lembra ainda que a atual composição do Congresso Nacional, de perfil mais conservador, é favorável à aprovação da PL 4330, que só não se transformou em lei em decorrência da grande mobilização nacional que vem adiando a votação do projeto. “Os setores empresariais vêm defendendo este projeto para garantir o que eles [empresários] chamam de segurança jurídica e que propõe a total flexibilização dos contratos de trabalho”, assinala Maria da Graça.

Entre as razões apontadas pela pesquisadora para o ressurgimento deste movimento neoliberal, está a defesa do chamado Acordo Coletivo Especial, que encontrou eco em alguns setores do movimento sindical. “Todos os argumentos usados pela CNI para a desregulamentação da CLT e a suposta modernização das relações de trabalho foram também defendidos pelo Acordo Coletivo Especial, apoiado pelo Sindicato dos Metalúrgicos do ABC Paulista”, completa ela.

Lógica financeira

Maria da Graça Druck ressalta que a transformação das relações de trabalho que acontece no Brasil segue um movimento internacional de precarização, o qual obedece à lógica financeira, que não se limita apenas ao universo econômico, mas passa a contaminar toda a sociedade. “Esta lógica determina o curto prazo como elemento-chave. A ideia do curtíssimo prazo passa a dominar tudo. No campo do trabalho, isso tem implicações bastante graves. Há mudanças nos tipos de empregos, nos vínculos que se criam, que passam a ser provisórios. E isso reconfigura a precarização no mercado de trabalho. Nós tivemos, dos anos 90 para cá, uma generalização desta lógica para praticamente todos os setores, impondo uma instabilidade que, antes, era mais do mercado informal, mas que, hoje, atinge até os empregos mais qualificados”, enfatiza a pesquisadora.

Para Maria da Graça, a precarização é um fenômeno de múltiplas faces. Além do mercado de trabalho – a face mais conhecida –, a precarização envolve também o processo de organização do trabalho, que só piorou nos últimos anos com o estabelecimento de metas e pressão por resultados imediatos. Ela lembra que a saúde do trabalhador se agravou, basta ver que o volume de acidentes de trabalho só aumentou em todo o país, isto considerando apenas os números de casos notificados, e, para fechar o cerco de perdas, há ainda a quebra da identidade coletiva dos trabalhadores, a qual é um elemento importante, que impõe um conjunto de valores que individualiza as responsabilidades dos trabalhadores, enfraquecendo o coletivo.

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