Retratos de uma sociedade em transformação

Fenômenos do universo do trabalho foram analisados no Congresso da Sociedade Brasileira de Sociologia em Porto Alegre. Fotografia: Ass. Imprensa SBS/Facebook

Estudar, analisar e tentar compreender os fenômenos sociais são tarefas que demandam tempo e dedicação dos pesquisadores. Durante o 17º Congresso Brasileiro de Sociologia, realizado em Porto Alegre entre os dias 20 e 23 de julho passado, diversos pesquisadores apresentaram diferentes estudos relacionados ao mundo do trabalho.

Nossa reportagem acompanhou as apresentações do grupo “Trabalho, sindicalismo e ações coletivas”, que no dia 22 de julho, sob coordenação dos professores Marco Aurélio Santana (UFRJ) e Ruy Gomes Braga Neto (USP), que contou com apresentações da professora e socióloga Lorena Holzmann (UFRGS) e da desembargadora e pós-doutora em economia Magda Biavaschi (aposentada do TRT4, UNICAMP).

A professora Holzmann apresentou o trabalho intitulado “A informalidade é inerente ao trabalho por conta própria? Uma investigação qualitativa confrontando as estatísticas”. Partindo dessa interrogação, ela entrevistou pessoas que atuam em pequenos estabelecimentos (prestadores de serviços, produtores que vendem sem intermediários e comércio de rua fixo) na cidade em Porto Alegre, bairro Bom Fim.

Lorena apontou algumas características desses entrevistados: aposentados, trabalham com alvarás, possuem idade avançada e executam atividades que aprenderam de maneira autodidata ou com a família.

A pesquisadora destacou três casos: de uma vendedora de flores, que afirmava ter um bom rendimento; um vendedor de cachorro-quente, que considerava sua atividade um prazer e não um trabalho; e uma consertadora de guarda-chuvas, que afirmava não contribuir para o INSS pelo motivo de que o Governo pagaria aposentadoria de qualquer maneira.

Holzmann considerou que esses trabalhadores informais, trabalhando por conta própria, possuem uma ética própria do trabalho. Apurou que eles são comprometidos com seus clientes, mas não possuem associativismo, são culturalmente pobres, individualistas e pouco politizados.

Já Magda Biavaschi apresentou um trabalho em coautoria com Alisson Droppa (UNICAMP) chamado de “Relações de trabalho no capitalismo contemporâneo e a terceirização: a dinâmica da regulamentação dessa forma de contratar no Brasil e o papel da Justiça do Trabalho”.

Partindo do eixo temático da terceirização, os pesquisadores questionam como o estado responde a questão utilizando como fonte os processos judiciais. Magda Biavaschi apontou que, pelo fato de ainda não existir legislação específica, esse “vácuo” foi normatizado pelo Tribunal Superior do Trabalho (TST) na Súmula 331 em 1993.

Realidade em transformação exige muito estudo para compreender o fenômeno - Facebook/ Ass. de Imprensa SBS.
Realidade em transformação exige muito estudo para compreender o fenômeno. Fotografia: : Ass. de Imprensa SBS/Facebook

Ela lembrou que, em 2011, foi fundado o Fórum Permanente em Defesa dos Direitos dos Trabalhadores Ameaçados pela Terceirização, do qual ela faz parte, com o objetivo de antagonizar a PL 4330, atualmente em apreciação pelo Senado Federal. A principal conclusão da pesquisa, segundo ela, é que a Justiça de Trabalho é hoje um dos principais focos de resistência à terceirização no Brasil.

No dia 23 de julho, último dia do encontro em Porto Alegre, acompanhamos também a mesa redonda “Etnografia operária e historiografia do trabalho: diálogo metodológicos”, de caráter mais teórico, que chamou a atenção para a posição do pesquisador em pesquisa sociológica na área do trabalho. Teve como palestrantes Ruy Braga e José de Sousa Martins, ambos da USP, Marco Aurélio Santana (UFRJ) e Roberto Verás (UFPB).

José de Sousa Martins, autor do livro “A aparição do demônio na fábrica”, mostrou a relevância do sociólogo de se identificar como sujeito social e, ainda mais importante, do sociólogo compreender suas limitações de compreensão do fenômeno social.

Sousa Martins entende que o trabalhador sabe mais que o pesquisador e este deve compreender e captar tal sabedoria através de uma etnografia baseada na ética científica e na humildade.

Para Ruy Braga, que dedicou grande parte de seu trabalho à observação participante dos trabalhadores de call centers, há necessidade do cientista social depurar suas ingenuidades através da constante reflexão sobre o método de pesquisa. Na apresentação, ele utilizou como exemplo uma hipótese havia formulado sobre esses trabalhadores, que fariam parte da “classe trabalhador neoliberal” (despolitizada), hipótese essa invalidada com a primeira greve dos teleoperadores em 2008. Essa situação gerou a necessidade de reformular suas hipóteses e perceber com um outro olhar esses trabalhadores.

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