Reforma da previdência: os moinhos de vento do Governo

Sistema é sustentável, mas o que há é a erosão das fontes de receita.

Luiz Roberto Pires Domingues Júnior

Fonte: Jota
Data original da publicação: 04/02/2018

Quixotesca, na falta de melhor definição, a jornada do Governo para derrubar a previdência social: o anunciado rombo de R$268,7 bilhões de reais, no ano de 2017, sendo R$182,4 bilhões do Regime Geral de Previdência Social – RGPS e R$ 86,3 bilhões do Regime Próprio de Previdência Social da União – RPPSU, é somente uma fração da história que teima em ser mal contada pelo governo.

É bom recordar que o relatório final da CPI da Previdência Social, divulgado no final do ano passado, caracterizando que não há déficit estrutural do sistema de previdência social – RGPS e RPPSU foi aprovado por unanimidade e contou com o voto da bancada do governo representada pelo Senador Romero Jucá (PMDB/RR).

Mas, diante do diagnóstico confirmado de bipolaridade deste governo, cumprimos mais uma vez com o dever de esclarecer a real situação da previdência social e perguntar quais são os reais motivos do governo em, teimosamente, apresentar esses números.

Ao apresentar os dados do rombo, conclui-se de forma aritmética que as despesas suplantaram as receitas. A pergunta que devemos fazer é: quais os elementos foram considerados pelo governo como despesa? Ao observarmos as leis orçamentárias dos anos anteriores, verifica-se constante alteração dos itens que compõem os elementos de despesa. Por exemplo: Como está caracterizada a questão da previdência dos militares? Pois, devemos lembrar, os militares da reserva compõem despesa do orçamento fiscal e não pode ser incluído em qualquer obrigação previdenciária, pois os mesmos não contribuem para a previdência. Quem não contribui, não é segurado!

Outro ponto que merece destaque é o do índice de incremento do “rombo” do RPPSU, que, comparado com 2016, foi de 11,9%. Se os elementos de despesa colocados pelo governo forem os mesmos, nos dois anos (2016/2017), a única possibilidade de expansão dos gastos do RPPSU é o aumento do número de aposentadorias no ano de 2017 comparado com o ano de 2016, pois não há outra forma de aumentar as despesas. Considerando que o último dado publicado pelo governo é o de janeiro de 2017, mesmo sendo em um boletim que se diz mensal, não há maneira de se apurar os números das despesas feitas com o RPPSU, passando a ser um dogma federal que se aceita ou não.

No ano passado o governo fez uma verdadeira “blitz” sobre os auxílios-doença, uma vez que somente este item de despesa representava 44% do universo de obrigações financeiras do INSS e mais de um milhão de benefícios foram cancelados. Como uma ação que visa reduzir despesas, e que alcança os objetivos propostos, não surte nenhum efeito, pois o incremento de despesa apresentado é de 10% no RGPS – entre 2016/2017. A única explicação possível é a de que a produtividade paga aos médicos peritos, que foram custeadas com recursos da seguridade social, tenha custado mais que o benefício gerado, o que seria, no mínimo, uma incoerência econômica.

Se os elementos de despesa não apresentam justificativa plausível para o seu incremento, conclui-se, portanto, que o “rombo” é originário na outra variável da equação, ou seja, a receita. A redução da receita destinada ao RGPS amplia o suposto déficit, pois com despesa igual ou com incremento natural e forte redução de receita, a conta fica vermelha, como qualquer dona de casa concluiria.

Qual o impacto do REFIS, programa de refinanciamento de dívidas tributárias, na receita do RGPS no ano passado e quais serão seus efeitos para os anos vindouros – já que a renúncia prevista pela receita no recolhimento de impostos e tributos é da ordem de mais 400 bilhões de reais?

Os produtores rurais tiveram no período redução de alíquota para 1,2%, sem alteração do “modus operandi” de arrecadação. Qual foi o impacto nas receitas?

Polícia Federal apresentou projeção, durante a CPI da Previdência, de fraudes anuais da ordem de 23 bilhões de reais – sem que nenhuma política governamental efetiva tenha sido instituída para acabar com esse descalabro. A quem interessa que a Polícia Federal continue a enxugar esse gelo?

Temos ainda as políticas de desonerações, que impactam nas receitas. Qual o motivo de não haver nenhum movimento governamental para as suas extinções?

Relativamente aos devedores contumazes da previdência persiste a dúvida: porque a efetividade de recuperação de créditos anunciada é tão marginal – menos de 5%?

O relatório da CPI da Previdência demonstra de forma clara que o sistema é sustentável, mas o que há é a erosão das fontes de receita e que a arma usada para combater a destruição da receita é provocar terrorismo para promover a retirada de direitos dos trabalhadores e o seu futuro. O governo está lutando contra os trabalhadores e não nas causas do desequilíbrio, que vem principalmente das receitas e não das despesas. Temos um sistema de previdência estruturalmente sustentável, mas que está sendo desmontado de forma massiva com a produção de déficits financeiros.

Há diferença clara entre a realidade e os moinhos de vento que o governo teima em combater. Rombo de 260 bilhões de reais, ou 146 bilhões ou 80 bilhões são números produzidos pelo governo para atender a um único objetivo que é o de justificar a reforma, não precisando ter nenhuma ligação com a realidade.

Luiz Roberto Pires Domingues Júnior é consultor da Diretoria de Assuntos Previdenciários do Sinal e indicado para compor a CPI da Previdência, no Senado Federal.

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