Não, a Finlândia não é um “paraíso capitalista”

No país mais feliz do mundo, o governo possui quase um terço da riqueza do país e 90% dos trabalhadores são cobertos por um contrato sindical. Pode não ser o socialismo, mas também não é um “paraíso capitalista”, como o New York Times afirmou ridiculamente no fim de semana.

Matt Bruenig

Fonte: Jacobin Brasil
Tradução: Cauê Ameni
Data original da publicação: 10/12/2019

No fim de semana, Anu Partanen e Trevor Corson publicaram um artigo no New York Times argumentando que a Finlândia é, claramente, um “paraíso capitalista”. O artigo é muito familiar para quem acompanha esse debate. Eles observam que a Finlândia tem altos impostos e um generoso Estado de bem-estar, mas depois diz que o país é bastante capitalista e talvez até mais capitalista do que os EUA.

Ao contrário da maioria das pessoas que escrevem esse tipo de defesa, os autores aqui não estão sendo maliciosos. Partanen e Corson estão tentando abrir os olhos dos norte-americanos para as glórias de um estado social abrangente e acha que subestimar os outros aspectos socializados da economia finlandesa é uma boa maneira de fazer isso. Ela pode muito bem estar certa sobre sua estratégia retórica, mas, em última análise, não é verdade que o modelo econômico da Finlândia seja apenas o capitalismo comum, com generosos benefícios sociais.

Para começar, o governo finlandês possui quase um terço da riqueza do país. Para que os Estados Unidos correspondam a esse valor, o governo dos EUA precisaria expropriar cerca de US$ 35 trilhões em ativos privados para a propriedade pública.

Os finlandeses também têm um grande setor público, o que significa que não apenas a riqueza é muito mais socializada, mas também a produção. Cerca de um quarto dos trabalhadores finlandeses estão empregados em serviços do governo, como assistência infantil, médica e educacional. Outros 7% estão empregados em empresas estatais como a companhia aérea nacionalizada do país, a Finnair.

Os Estados Unidos precisariam deslocar 24,7 milhões de trabalhadores do setor privado para o público para começar a parecer com a Finlândia. Também seria necessário expandir seu portfólio de empresas estatais além do serviço postal, Amtrak e Tennessee Valley Authority, para incluir itens como American Airlines, Exxon Mobil e Verizon.

Fora das áreas explicitamente socializadas de propriedade e produção públicas, a Finlândia também possui um movimento trabalhista amplo e poderoso que claramente dá aos trabalhadores finlandeses um poder significativo sobre a economia do país. Cerca de 90% dos trabalhadores finlandeses são cobertos por um contrato sindical. Para elevar os trabalhadores estadunidenses aos níveis finlandeses, seria necessário sindicalizar mais 119 milhões de trabalhadores.

Como vimos algumas semanas atrás, os finlandeses sindicalizados também não são meros membros de um sindicato ou jornal. Em novembro, em resposta a 700 trabalhadores dos correios que receberam um corte salarial, cerca de 60.000 trabalhadores (em um país de 2,2 milhões de trabalhadores) entraram em greve em solidariedade, fechando portos, ferrovias, ônibus e companhias aéreas. Os cortes salariais foram cancelados e o primeiro-ministro renunciou após tentar enganar o povo. Outros 100.000 trabalhadores finlandeses devem entrar em greve esta semana, causando perdas de centenas de milhões de euros na produção, como parte das negociações de contratos no setor industrial.

Nada disso, entretanto, significa dizer que a Finlândia é uma sociedade socialista completa. Definitivamente poderia e deveria ser mais socializado e de esquerda do que é. Mas, ao dizer isso, não devemos perder de vista a diferença entre a Finlândia e os Estados Unidos. Para corresponder ao modelo econômico finlandês, os Estados Unidos precisariam não apenas construir um estado social-democrático de bem-estar, mas também socializar US$ 35 trilhões em ativos, sindicalizar 120 milhões de trabalhadores e transferir 25 milhões de trabalhadores para o setor público.

Por mais que os moderados gostem da postura de admiradores da Finlândia e do modelo nórdico em geral, eles nunca parecem muito interessados em promover propostas mais radicais para mover os EUA nessas direções socializadoras.

Matt Bruenig é o fundador do People’s Policy Project.

7 Responses

  • É curioso observar que os Candidatos Socialistas nos Estados Unidos, caso de Bernie Sanders, estão a enganar os eleitores dizendo que a Filândia e os restante paíes Países Escandinavos são socialistas e elogia o seu sistema de saúde, sabendo nós que para além do Sector Público também há o sector Privado e que os trabalhadores pagam elevados impostos para sustentar o Sector da Saúde e a Segurança Social.
    Por outro lado em todos os Países Escandinavos, tomando a Suécia como modelo, também têm Listas de Espera e têm falta de trabalhadores na área da Saúde, em especial enfermeiras(os) !!!

  • A Finlândia deve se socializar mais, devem criar imediatamente conselhos operários e colocar os meios de produção nas mãos da classe trabalhadora. Isso para que a economia fique menos dependente do mercado exportador de petróleo, e fortalecendo o trabalho interno. A Finlândia parece ser o único país que pode se tornar verdadeiramente comunista. O país estaria então pronto para servir de modelo para o mundo, levando a humanidade a um futuro mais humano e sustentável em que a tecnologia possa atingir níveis extraordinários que nenhum tecnocrata capitalista jamais pensou. Desejo sorte aos trabalhadores finlandeses para que consigam tirar o resto da aristocracia burguesa do poder.

  • Essas comparações da Finlândia com o Estados Unidos não faz sentido nenhum, a população da Finlândia é Cerca de 6 milhões de habitantes, estados unidos é mais de 330 milhões.

  • Um dos segredos do capitalismo é sua resiliência. O capitalismo pode “suportar” até certo grau elevado de interferência do estado no mercado.
    De certa forma, pode-se dizer que o capitalismo existe em níveis diferentes em diferentes países e regiões. A Finlândia defende a propriedade privada e é um país de capital aberto, que segue e respeita as regras do comércio internacional. No socialismo não existe propriedade privada alguma e o capitalismo inexiste.

    • Sim é resiliênte, sempre focado em garantir bilhões para uma mínima parcela da sociedade mundial, e deixar milhões de pessoas na pobresa. Essa é a resiliência do capital!

      VIVA O SOCIALISMO DOS PAISES NORDICOS!

      • Que socialismo dos países nórdicos? Os caras são exemplos na saúde, segurança, ranking de felicidade e etc. Salario mínimo é 1300 euros isso é quase 8k em reais, cara. Desenvolvimento do pais foi através do crescimento dos meios de produção e tecnologia, fora as empresas de capital aberto. isso não tem nada haver com socialismo. você quer é transformar a Finlândia como modelo socialista, até porque você não nenhum, coisa que nunca vai ter.

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *