Memórias do subdesenvolvimento

Fotografia: Davidson Luna/Unsplash

A solução para o desenvolvimento do Brasil e o consequente aumento dos salários e da renda nacional vem de um aumento de produtividade no setor produtivo, não no comércio e serviços.

Bruno Machado

Fonte: A terra é redonda
Data original da publicação: 09/12/2020

Por que brasileiros graduados vão para os EUA serem garçons?

Uma questão curiosa que parece simples mas tem várias outras questões embutidas é o motivo de se ter uma vida financeira mais confortável como garçom nos EUA do que com um curso superior no Brasil, para grande parte daqueles que saem da faculdade.

O motivo, é claro, é que em muitos casos um salário de garçom, pedreiro, faxineiro ou babá em países ricos supera os salários exclusivos de determinadas profissões que requerem curso superior no Brasil ou em outros países pobres quaisquer. Mas o que pouca gente se questiona é o motivo desses salários serem maiores nos países ricos. Se um garçom faz exatamente a mesma coisa nesto Brasil e nos EUA e mesmo em períodos onde a taxa de desemprego do Brasil esteve tão baixa quanto a dos EUA a diferença salarial permaneceu tão grande, como pode haver salários tão diferentes?

Pode-se acreditar que o motivo é a moeda local ser mais forte ou valorizada mundialmente. Isso certamente é um fator importante, mas é uma consequência, não uma causa do motivo da diferença salarial entre os dois países. O motivo, na verdade, é que a produtividade do trabalho nos EUA é maior do que no Brasil. Mas por quê?

Poderíamos apontar diversos fatores como infraestrutura, nível educacional ou bom ambiente regulatório para os negócios. Será então que se tivéssemos as rodovias, ferrovias e fontes de energia elétrica americanas os garçons brasileiros seriam tão bem pagos quanto nos EUA? Ou se importássemos os alunos de lá por anos a fio, talvez? Ou simplesmente se copiássemos as regras de direito privado, tributário e empresarial daquele país? Claro que não.

Os garçons americanos ganham mais do que os brasileiros, em relação ao poder de compra dos salários em cada país, porque no setor produtivo (fora do setor de comércio e serviços ondem trabalham os garçons) a produtividade é maior por conta de um maior avanço tecnológico. Em outras palavras, ao longo dos anos as empresas americanas aprenderam a produzir coisas mais difíceis, que agregam mais valor à vida humana e têm maiores preços por isso, além de menos empresas no mundo saberem produzir esses bens complexos com mesma qualidade. Dessa maneira essas empresas foram aumentando seus lucros e conquistando mercados consumidores em países pelo mundo. Com maior produtividade, os trabalhadores dessas empresas do setor produtivo conseguem negociar maiores salários. Mas então, o que isso tem a ver com os garçons que servem mesas em Nova York?

Todas as empresas, do setor produtivo, comércio ou serviços, competem entre si por trabalhadores, levando a uma certa aproximação entre os salários de um setor em relação ao outro. Se a indústria paga bem, o comércio terá que elevar os salários ou ficará sem trabalhadores. Em resumo, o aumento da produtividade decorrente do avanço tecnológico leva a um aumento da produtividade do trabalho no setor produtivo que, por fim, eleva os salários também nos outros setores, como comércio e serviços.

Sabendo disso, fica claro que a solução para o desenvolvimento do Brasil e o consequente aumento dos salários e da renda nacional vem de um aumento de produtividade no setor produtivo, não no comércio e serviços. Nenhum país fica rico abrindo milhões de hamburguerias ou barbearias por toda parte. Comércio e serviços apenas captam a renda gerada pela riqueza produzida no setor produtivo, que não atoa tem esse nome. E se um país ocupa seus trabalhadores do setor produtivo somente em pecuária, agricultura e mineração — dentro de empresas que mesmo que fossem monopólios globais e atendessem sozinhas à demanda mundial por tais produtos mais simples não elevariam o PIB per capita brasileiro ao PIB americano — em vez de ensiná-los a produzir bens mais difíceis e com maior valor agregado como equipamentos médicos, mecânicos ou eletroeletrônicos, esse aumento de produtividade do trabalho necessário para se alcançar a riqueza se torna impossível dentro do comércio global, tornando impossível o crescimento da massa salarial nacional em termos reais.

Além disso, a diferença salarial entre garçons nos EUA e no Brasil, que leva brasileiros com ensino superior a abandonem o país para servir pratos ou dirigir carros nos EUA, nos mostra que qualquer riqueza gerada na sociedade vem do trabalho humano, seja ele físico ou intelectual. Para que parte dos trabalhadores americanos deixem de consumir seu tempo de trabalho na produção de sapatos para produzirem smartphones ou drones, outros trabalhadores tiveram que estudar e trabalhar para criar tais equipamentos, ao longo de anos, até que se construísse o capital — capital que na prática é trabalho passado acumulado (prédios, estradas, know how tecnológico, patentes) junto com aquilo existente na natureza por si só (como o petróleo ou o ouro) — para que uma parte maior da massa de assalariados pudesse ter empregos mais produtivos e, finalmente, possibilitar um salário e poder de compra maiores aos garçons americanos ou brasileiros que mudaram para lá.

Apesar de ficar claro que a riqueza é explicada pela produtividade do trabalho físico e intelectual, independente do sistema de produção adotado, é importante lembrar que grande parte da concentração de riqueza nos países ricos vem do superlucro de suas empresas, possibilitado pela globalização e superexploração do trabalho em países pobres. Além da existência de fronteiras que possibilitam a diferença salarial entre mercados de trabalho de países ricos e pobres.

Nosso atraso tecnológico impede altos salários fora dos altos cargos burocráticos

O Brasil está décadas atrasado em relação ao domínio tecnológico de nossas empresas, em relação ao mundo desenvolvido economicamente. O processo de desindustrialização do Brasil que ocorre desde o Plano Real intensificou esse atraso, apesar de seu enorme sucesso em estabilizar a moeda e a inflação.

Com esse atraso tecnológico, os altos salários no país estão muito restritos a cargos burocráticos em gerências e diretorias de empresas e nos altos cargos do setor público brasileiro. Sendo assim, de forma geral, para ter acesso a um alto salário no Brasil é necessário conquistar ou ser colocado em um cargo burocrático no setor público ou privado. Como os cargos burocráticos de empresas privadas são cargos de confiança ou relacionados a informação privilegiada, esse alto escalão do setor privado fica restrito a famílias herdeiras de grandes empresas ou setores restritos com acesso a informação privilegiada no mercado, como certos departamentos de universidades específicas. Do outro lado, os altos cargos no setor público são quase totalmente preenchidos por membros da classe média alta, que tem acesso a melhor educação e aos melhores cursos preparatórios. Não sem razão, metade dos ingressantes em escolas de elite das Forças Armadas são filhos de militares, e esse processo se repete em diversos órgãos do serviço público do Brasil.

Os salários médios e baixos ficam para os profissionais técnicos, inclusive os com enorme capacitação e experiência no setor produtivo e de serviços. Dessa forma, os melhores profissionais técnicos capacitados do país (que têm muito mais a oferecer à sociedade do que burocratas dos setores público ou privado) acabam fadados a salários medíocres ou saem do país. Na área acadêmica, onde a capacitação técnica é ainda mais intensa do que nas empresas do setor produtivo, o que se observa são ótimos profissionais indo estudar e trabalhar em países ricos, no processo apelidado de fuga de cérebros.

Brasil não será democrático enquanto for mero exportador de commodities

Países dependentes de exportação de commodities como o Brasil e maior parte dos países do sul global, que têm suas economias voltadas aos setores de serviços simples, agropecuária e mineração, não costumam ser países com instituições tão fortes e nem tão democráticos quanto os países europeus e do norte do planeta em geral. Isso acontece pois, no capitalismo o poder econômico é o principal instrumento de poder da sociedade, incorporando os poderes políticos e militares dentro de si na maioria dos lugares. Com poucas atividades econômicas dominantes, a elite econômica de um país como o Brasil acaba sendo muito concentrada, o que impede a democracia de funcionar de forma mais próxima de uma democracia plena, como acontece em quase todos os países desenvolvidos.

Com o poder econômico altamente concentrado, as ilhas de poder dentro dos setores políticos e militares de cada país do sul global acaba sendo também pouco dispersas, causando uma concentração de poder quase feudal nesses países. A saída dessa estrutura e o caminho para uma sociedade mais democrática seria a diversificação da economia, o que só ocorre após um processo de industrialização e avanço tecnológico, como ocorreu no Reino Unido e nos EUA séculos atrás e nos Tigres Asiáticos mais recentemente na história. Acontece que, com uma elite econômica concentrada e poderosa, mudanças nesse sentido que causariam grandes mudanças também na divisão de poder dentro da sociedade não acontecem, pois são impedidas por essa elite ligada a agropecuária e mineração, seja através de boicotes, golpes militares ou institucionais ou apenas campanhas midiáticas.

Uma das estradas para o desenvolvimento econômico, causado pela industrialização e avanço tecnológico, que também leva a uma maior democratização da sociedade, ocorre quando as elites locais concentradas precisam desenvolver tecnologicamente seu país para se defender de ameaças militares de outras potências ou para evitar que sua fatia no comércio global (parcela de exportações de produtos e serviços que circulam o planeta) seja reduzida pelo crescimento econômico de outra potência liderada por outra elite local de outro país.

Como a elite brasileira nunca ocupou nenhum papel de protagonismo no comércio global, a ponto de temer o surgimento e crescimento de alguma potência concorrente, e nem mesmo tem alguma ambição de crescer no comércio global e conquistar uma maior fatia da demanda global por produtos e serviços, o Brasil provavelmente permanecerá preso nessa estrutura econômica concentrada e nessa sociedade pouco democrática. Apenas uma mudança de mentalidade na elite econômica que venha a temer concorrentes de outros países ou uma mudança radical no pensamento dentro das Forças Armadas poderia dar ao Brasil uma chance de tentar se desenvolver economicamente e assim ser um país mais democrático também.

Votar é pouco: Brasil tem que ir às ruas como o Chile para realizar mudanças estruturais

A opinião mais frequente das pessoas sobre manifestações costuma ser dividida em dois grandes grupos: as que são céticas quanto ao poder do povo na rua em realizar mudanças concretas na sociedade e os que acreditam nessa força política como a mais forte e transformadora. Ainda assim, dentro do segundo grupo de pensamento, do qual faço parte, poucos se questionam como exatamente as manifestações populares exercem poder na estrutural de poder da sociedade capitalista.

Quando o povo sai as ruas exigindo mudanças por parte do Estado, o presidente, governador ou prefeito tem duas opções de atuação: aceitar as demandas ou reprimir os protestos. Como a tendência do sistema é a manutenção de poder, manifestações que ameacem a ordem costumam ser reprimidas em algum grau. O determinante é até que grau de violência as forças policiais e militares do Estado serão acionadas, e nos casos mais graves, aceitarão agredir o próprio povo. Quando o governante não está disposto a massacrar sua população, matando milhares de manifestantes sem piedade, manifestações de grande número costumam neutralizar o poder militar do Estado. Vale lembrar que o poder militar é a força mais eficiente e crua do exercício do poder, sendo seguida pelos poderes econômicos e político. Nesse caso específico de manifestação bem sucessivas, o poder político do povo organizado consegue suprimir o poder militar vigente em condições específicas e momentâneas.

Além disso, se manifestações populares tiverem adesão suficiente da sociedade, ou seja, da classe trabalhadora, protestos e greves ameaçam o poder econômico vigente do país, exercido pelas elites econômicas. O poder econômico, além de ser capaz de adquirir poder militar através de exércitos e armas, atua originalmente exercendo poder sobre a sociedade sendo dono dos meios de produção (empresas) e controladores dos meios de troca (bancos). Em situações específicas de greves bem sucedidas, esse poder econômico das elites também é neutralizado localmente, já que apenas o trabalho humano é capaz de gerar mais riqueza para a sociedade.

É basicamente por esses motivos que manifestações populares tem tanta força dentro da divisão de poder na sociedade capitalista, sendo capaz de determinar os rumos do país impondo sua vontade sobre os poderes militares dos exércitos e os poderes econômicos da elite capitalista. A má notícia é que manifestações populares com grande adesão, que resistam a agressão policial e que organizem pautas objetivas são raras na história de qualquer país. E para piorar a má notícia, geralmente essas condições só surgem em situações de grave crise social, como foi o caso do Chile que gerou uma nova constituinte através de protestos pacíficos em massa.

As divergências entre PT e PDT são pouco importantes na real política

Não é segredo para ninguém que a tese principal do PDT de Ciro Gomes é que o melhor para o Brasil é um projeto nacional de desenvolvimento, com coordenação e incentivo do Estado em parceria com o mercado. O intuito seria transformar a atual burguesia nacional agrária e financista em uma burguesia agrária, financista mas também industrial e científica. O problema dessa tese é sua realização além da vitória nas urnas. Tanto o poder econômico vigente quanto o poder militar atual são contrários a essas mudanças e preferem manter seus status de poder da maneira como está posta hoje. Diferente dos EUA que na Guerra Civil tinha uma burguesia industrial contraposta a uma burguesia agrária, e diferente de países como Venezuela e Bolívia onde através de insurgências nacionalistas dentro do Exército foi mudado o tabuleiro de poder do país através do poder militar, o Brasil não tem uma ala desenvolvimentismo nem na burguesia nem nas Forças Armadas.

Já o projeto do PT de Lula, não crê nessa transformação estrutural proposta por Ciro Gomes e acredita que o Brasil deve seguir um caminho de exportador de commodites com menor desigualdade de renda. É um projeto menos ambicioso e talvez mais realista, entretanto, é muito pouco transformador para a população brasileira.

Acontece que, o que separa Ciro de Lula, do ponto de vista de projeto de país, é a crença ou descrença na possibilidade de uma burguesia desenvolvimentista surgir no país. Ambos os lados sabem que para o Brasil se tornar um país desenvolvido teria que repetir o que está fazendo a China hoje e fizeram a Coreia e Taiwan no passado recente e os EUA e o Reino Unido no passado mais distante, ou seja: política industrial, com compras governamentais, subsídios a setores, engenharia reversa e restrições de importações pontuais.

Sendo assim, um governo Lula-Ciro, Lula ou só de Ciro seria praticamente igual, já que Ciro não tem poder para fazer as transformações que deseja e Lula sequer fala no assunto por saber dessa realidade. O único fator que poderia causar a transformação que Ciro Gomes deseja, um projeto nacional de desenvolvimento, seria o povo nas ruas. Protestos de rua pacíficos (já que os violentos não têm apoio massivo da população) que resistam as agressões policiais e permaneçam nas ruas por dias ou até semanas, em uma greve geral. Só assim os poderes econômicos (que depende da exploração do trabalho para ser exercido) e os poderes militares (que não teriam coragem de provocar uma chacina nas ruas) seriam neutralizados e “derrotados” pelo poder político do povo. Situação semelhante ocorreu no Chile recentemente onde o povo exigiu uma nova constituinte.

Levando tudo isso em consideração, toda divergência entre Lula e Ciro e entre PT e PDT é totalmente irrelevante para a real política do Brasil, já que o fator determinante para uma transformação real no país seria a adesão da população como um todo ao projeto nacionalista. Ao ponto de estar disposta a ir as ruas apanhar da polícia e fazer greve correndo o risco de perder seu emprego. A questão é: existe a possibilidade de tal consciência de classe e de nação tão forte surgir no país, ou Lula e sua experiência estão certos em serem mais humildes em buscar apenas um país agrário exportador com mais distribuição de renda?

A soberania nacional só vem com a obtenção de armamento nuclear

A soberania nacional não vem através da liberdade interna de eleger seus próprios presidentes e parlamentares, como pensam os mais ingênuos. Entretanto, também não vem da autossuficiência energética ou da independência econômica de outros países, como acham os um pouco menos ingênuos. A soberania nacional vem através do poder militar, que é a forma de poder soberana acima dos poderes políticos e econômicos.

No contexto militar global atual, exércitos equipados, navios e aeronaves não são suficientes para se ter um poderio suficiente para se prevenir de boicotes, ataques e intervenções estrangeiras de potenciais imperialistas. Apenas os armamentos nucleares, mais especificamente, as bombas atômicas, garantem a soberania nacional. Isso é provado historicamente pela China, Rússia, Irã e até mesmo pela Coreia do Norte, que só não foram dominados pelos EUA por conta de terem esses armamentos disponíveis para defesa. Já que os EUA, além de ter muitos armamentos nucleares, já usou os seus devastando o Japão, como todo mundo sabe.

Se o Brasil vier um dia a tentar ser um país desenvolvido, ou seja, competir com os países ricos do mundo nos mercados de produtos de média e alta tecnologia (como equipamentos hospitalares, derivados do petróleo, medicamentos, automóveis, aeronaves e eletrônicos em geral), precisará ter soberania nacional, já que faz parte do capitalismo a tendência de oligopolização e a expulsão de qualquer um que venha a ser um concorrente dos players já estabelecidos e que lucram no mercado global. Para conseguir sequer tentar se desenvolver com um plano nacional de desenvolvimento com política industrial, fato que é difícil de dar certo em quais condições como o próprio passado brasileiro e o da Índia já demonstraram, o Brasil precisaria ter apoio geopolítico, e por consequência militar, da Rússia ou da China, únicos capazes de frear o imperialismo estadunidense. A Coreia e Taiwan tinham os EUA, Hong Kong e Cingapura a China, nós não temos nenhuma potência que garanta uma soberania suficiente para um desenvolvimento econômico, ou seja, inserção nas cadeias mais altas do comércio global.

Entretanto, depender de submissão a potências menos nocivas que os EUA, que é o caso da Rússia e, principalmente, da China, não seria uma solução ideal para o Brasil. Já que, ainda assim não garantia a soberania do país. Sendo assim, a soberania nacional só seria concretizada através da obtenção e produção de armamentos nucleares, quando isso for possível na história, se um dia for.

Bolsonarismo conseguiu em anos o que a esquerda fracassa há décadas: superar a grande mídia

A esquerda tenta há décadas combater a narrativa política emitida em uníssono pelos grandes veículos de mídia do país. Através dos sindicatos, movimentos sociais e palestras em universidades. Acontece que, no mundo atual, sem sindicalização, nada disso atinge a massa populacional do Brasil. Já a direita bolsonarista, conseguiu criar uma onda impressionante e uma ideologia dominante que apesar de ter pontos em comum com a narrativa da mídia hegemônica, se difere muito dela e se propagou pelo Brasil de forma muito mais eficiente que as estratégias de consciência de classe e nacionalismo da esquerda.

O cerne dessa estratégia de comunicação bolsonarista é atuar através das emoções, principalmente do medo. Para que isso se concretizasse usou-se personagens simplórios, imagens impactantes e frases de efeito. Personagens como Bolsonaro Mito, Lula Ladrão, Ciro e a impressora de dinheiro, e outros, possibilitaram a disseminação de mensagens contrárias aos líderes da esquerda enquanto tornavam seu líder perfeito e messiânico.

Além dos personagens, usou-se muito de imagens impactantes, como memes fazendo comparações desonestas, fotografias assustadoras de lugares totalmente diversos do que diziam as legendas, vídeos curtos tirados de contexto, e etc. Também usou-se muito de frases de efeito que se repetem entre os adeptos do bolsonarismo como “o Brasil vai virar a Venezuela”, “o PT quebrou a Petrobrás e o Brasil” e aquela famosa usada sempre que alguma crítica era dirigida à família Bolsonaro: “mas e o PT, e o Lula?”. As estratégias tanto de ataque quanto de defesa do bolsonarismo podiam ser acionados por personagens, imagens ou vídeos curtos e frases de efeito. Diferente da esquerda que debate em fóruns de duas horas e textos de vinte minutos.

Para combater o bolsonarismo, a esquerda não precisa fazer muito, já que esse movimento vem se desgastando naturalmente por seu fracasso natural como prática política e pela oposição da mídia hegemônica contra Bolsonaro. O que a esquerda precisa é superar a narrativa da grande mídia, daquilo que é repetido na Globo, na Globo News, no SBT, na Band, na Record e nos maiores canais do YouTube sobre política (todos de direita). Se não o dizer, uma chapa Moro-Huck terá grandes chances em 2022, por exemplo.

Isso depende de uma estratégia semelhante a do bolsonarismo, ainda que sem o lado desonesto e corrupto da primeira. Nas redes, a esquerda precisa criar personagens simples (heróis e vilões), imagens impactantes (a desigualdade e pobreza do Brasil são naturalmente chocantes) e gerar suas próprias frases de efeito simplistas mas que transmitam a mensagem que a esquerda precisa passar. Precisa também ter redes de transmissão pelos Facebook e WhatsApp como o bolsonarismo tem, mesmo que através de robôs pagos a empresas duvidosas (vale lembrar que na campanha Dilma x Aécio os robôs já vinha sendo usados).

Convencer a classe trabalhadora de que ela é explorada pela classe proprietária, de que não existe meritocracia no Brasil, de que o governo é a única forma de assunção de poder dos pobres para recuperar aquilo que foi tomado deles pelos ricos e de que o Brasil não será rico vendendo feijão e comprando avião, não é impossível, só não pode ser feito apenas através de textos longos e chatos como esse. O bolsonarismo, infelizmente, deu uma aula a esquerda brasileira, tão academicista.

Apêndice

Como toda tese, há exceções. Alguns países são dependentes de commodites (quando mais de 50% de suas exportações são commodities), porém têm alto PIB per capita. Isso ocorre em países com grande quantidade de minérios raros, em volumes enormes e/ou de qualidade muita alta. Junto com uma população muito pequena, acabam tendo um PIB per capita alto. É o caso da Austrália, da Nova Zelândia e do Chile. Entretanto, em países sem essa sorte em riquezas naturais exorbitantes e de alto preço no mercado e com populações numerosas, a industrialização e o avanço tecnológico são o único caminho para o desenvolvimento econômico. Há também países com posições geográficas muito vantajosas e que têm sua economia dependente de outro país próximo e exportador de bens de alto valor agregado, que é o caso de Hong Kong e de Cingapura. Como o Brasil não se encaixa em nenhum desses casos, nossa única saída é lutar por um projeto nacional de desenvolvimento e por um avanço tecnológico, acompanhado de uma soberania nacional.

Bruno Machado é engenheiro.

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