Educação e trabalho: como desenvolver uma relação virtuosa?

Marcio Pochmann

Fonte: Educação e Sociedade, Campinas, v. 25, n. 87, p. 383-399, maio/ago. 2004.

Resumo: Este artigo discute as relações entre educação e trabalho. A tese principal é que a reestruturação da educação necessita articular o estágio de desenvolvimento econômico e a expectativa média de vida da população.

Sumário: 1. Apresentação | 2. O jovem na crise do mercado de trabalho | 3. Dinâmica educacional e do mercado de trabalho | 4. Avanço na expectativa média de vida e educação | 5. Experiência exitosa de políticas de inclusão social | 6. Considerações finais | Notas | Referências bibliográficas

1. Apresentação

Durante a década de 1990, o Brasil apresentou uma melhora não desprezível nos seus índices educacionais quantitativos. Reduziu a taxa de analfabetismo e aumentou o nível médio de escolaridade, ainda que a um ritmo menor do que nas décadas anteriores.

Da mesma forma, a expectativa média de vida da população continuou elevando-se. Diante das mudanças tecnológicas, com várias inovações no campo da saúde, entre outros, aumenta-se, mais rapidamente do que em outros períodos, o tempo médio de vida da população, alterando significativamente a situação da juventude.

Paralelamente a tudo isso, acentuaram-se os níveis de desemprego, assim como a precariedade, o sobretrabalho e a deterioração dos níveis renda, especialmente entre as faixas etárias mais jovens. Com a continuidade ao longo dos anos de 1990 da manifestação da crise do desenvolvimento econômico brasileiro – a mais longa desde 1840 –, a degradação do mercado de trabalho persistiu mais acentuadamente.

Em função desse cenário, como se apresentou a relação entre educação e trabalho? O objetivo deste artigo é o de desenvolver o argumento de que a deterioração das condições de funcionamento do mercado de trabalho, ao invés de ser contida pela melhoria educacional, contribuiu para o desperdício e o desgaste de habilidades educacionais em atividades precárias e de baixa qualidade.

Em contrapartida, a persistência do desempenho tão desfavorável do mercado de trabalho induziu ainda mais as segmentações ocupacionais, excluindo os mais pobres dos empregos nos segmentos educacionais mais elevados. De certa forma, ampliou-se consideravelmente o processo discriminatório no interior do mercado de trabalho, sobretudo entre distintas faixas etárias (jovens e adultos), raças e gênero.

Tal círculo vicioso impediu que a educação revelasse o seu potencial transformador das relações humanas e da agregação de valor à produção no Brasil. No contexto de emergência da sociedade do conhecimento, os requisitos educacionais do emprego ampliaram-se.

Entretanto, a incapacidade de superação da crise do desenvolvimento econômico nacional, associada ao ciclo de financeirização da riqueza e à estagnação dos investimentos, especialmente nos setores mais intensivos em tecnologia, estimulou mais ainda a disparidade extrema entre os distintos níveis de renda. Assim, o Brasil terminou afastando-se das oportunidades de assimilação das tendências potencialmente positivas da sociedade do conhecimento, posto que se caracteriza cada vez mais como uma sociedade de baixos salários voltada à exportação de bens primários (agronegócios) e de consumo ostentatório de serviços pessoais de poucas famílias ricas.

Sair deste círculo vicioso é vital para que o país possa participar de forma mais dinâmica do novo cenário internacional e ampliar o dinamismo interno, o que favorece que a educação passe a significar novamente oportunidades redobradas de ascensão social e, não como hoje, uma defesa, aliás profundamente precária contra a elevação do desemprego e a queda do nível de renda.

Não parece ser por outro motivo que o país vive um quadro de guerra civil não declarada, com homicídios praticados anualmente no Brasil representando 9,4% de todos os assassinatos no mundo. Também com a massa humana sem trabalho, que representa quase 5% do desemprego mundial, apesar de o país significar somente 2,8% de toda a população do globo terrestre, ganhou nova dimensão a emigração de brasileiros, especialmente aqueles de maior escolaridade, para outras nações com melhores horizontes de mobilidade social.

Em síntese, o presente artigo procura evidenciar os principais desafios colocados à população brasileira, fundamentalmente ao jovem num mundo do trabalho tortuoso como o verificado desde o último quartel do século passado. Da mesma forma trata-se também de buscar relacionar particularmente as variáveis como educação e trabalho, em busca de nova inclusão social já em curso no país.

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Marcio Pochmann é professor licenciado do Instituto de Economia e pesquisador do Centro de Estudos Sindicais e de Economia do Trabalho da Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP); secretário do Desenvolvimento, Trabalho e Solidariedade do Município de São Paulo.

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