Ditadura Militar no Brasil: debatendo os ataques à autonomia sindical e aos direitos trabalhistas

Cleier Marconsin

FonteEm Pauta, Rio de Janeiro, v. 12, n. 33, p. 45-63, 1º sem. 2014.

ResumoO texto trata dos direitos trabalhista e sindical durante a Ditadura Militar e no processo das lutas pelo seu fim. Entendendo a história como solo vivo onde se movem as classes sociais em seus conflitos e lutas, os direitos do trabalho são tratados como parte intrínseca dos direitos sociais e como conquistas dos trabalhadores na sociedade capitalista, em confronto com as necessidades da acumulação monopolista, no processo mesmo de reconhecimento da questão social. Durante a autocracia burguesa, a perda de direitos conquistados arduamente pelos trabalhadores brasileiros ocorreu através da repressão e da cooptação. Entretanto, setores combativos resistiram, fortalecendo-se quando a crise internacional do capital rebate em sua dinâmica e, com movimentos grevistas, apressaram o processo de transição. Fechando o ciclo das lutas pelo fim da Ditadura, a Constituição Federal de 1988 trouxe conquistas para os direitos do trabalho, mas sua materialização tem sido dificultada e até obstaculizada pela burguesia.

SumárioIntrodução | 1. Golpe Militar e autocracia burguesa: ataque aos direitos trabalhistas e cerco à autonomia sindical | 2. A crise do capital incide sobre a autocracia burguesa: as lutas por direitos ganham a cena política novamente | Considerações Finais | Referências

Introdução

Este texto traz o debate sobre as condições dos direitos do trabalho durante a Ditadura Militar no Brasil, cujo golpe que a instaurou completou 50 anos em 1º de abril de 2014, e as lutas sociais que fizeram parte de seu fim. Intenciona-se, assim, contribuir, no âmbito do Serviço Social, para a construção de um bloco de análise crítica sobre as condições dos direitos do trabalho, no Brasil, tendo como foco as legislações trabalhista e sindical nesse período.

Sem a pretensão de esgotar a temática, ao perscrutar a realidade numa perspectiva de totalidade, tendo a história como solo vivo onde se movem as classes sociais em seus conflitos e lutas, os direitos do trabalho são tratados, aqui, como parte intrínseca dos direitos sociais e como conquistas dos trabalhadores na sociedade capitalista em confronto com as necessidades da acumulação monopolista, no processo mesmo de reconhecimento da questão social. Ao mesmo tempo, embora seu recorte espacial seja a sociedade brasileira, e o temporal, a Ditadura Militar, procura-se mostrar a relação de sinergia que existe entre os direitos conquistados aqui e aqueles conquistados pelos trabalhadores dos países capitalistas centrais, onde esse modo de produção hoje hegemônico tem origem. Ou seja, busca-se entender a gênese dos direitos do trabalho nos países de origem do capitalismo, centros nervosos das revoluções burguesas e das primeiras lutas dos trabalhadores contra a exploração, seu espraiamento pelas sociedades periféricas que se industrializam de acordo com suas peculiaridades, enfrentando as dificuldades inerentes à luta de classes que se processam nelas, com foco no Brasil.

Com início ainda no século XIX, mas principalmente no século XX, o protagonismo dos trabalhadores foi fundamental para a ampliação dos direitos de cidadania (civis e políticos) à sua classe, como liberdade de reunião, de partidos, de filiação partidária e outros, antes restritos aos proprietários. Nesse mesmo caminho se deu a conquista dos direitos sociais; dentre eles, os do trabalho, contra a vontade da burguesia, que foi responsável pela criação daqueles referentes à cidadania, restritos à sua classe, na medida em que os trabalhadores ganharam consciência da importância do trabalho, na sociedade voltada para a acumulação do capital.

Uma forma inicial e mais elementar de luta encetada pelos trabalhadores esteve voltada contra as máquinas, através do movimento denominado luddismo, cujo nome derivou da sua liderança, Ned Ludd, um operário que desenvolveu essa estratégia, a qual foi superada pela organização sindical e adoção de outras, como a greve. Após esse momento, a diminuição da jornada de trabalho foi a primeira reivindicação a ganhar corpo na sociedade do capital. De fato, se é o tempo de trabalho socialmente necessário que viabiliza a mais-valia, seja na forma absoluta, seja na forma relativa, inicialmente, as lutas pela diminuição da jornada voltaram-se para barrar o exaurimento dos trabalhadores. Mas como a economia de força de trabalho é central para a acumulação capitalista, produzindo o exército industrial de reserva, as lutas voltaram-se, da mesma maneira, para a ampliação de postos de trabalho. Aos trabalhadores interessa limitar e encurtar a jornada de trabalho, contrapondo-se aos interesses da acumulação em ampliar o exército industrial de reserva. Assim, segundo Marx (1988):

A criação de uma jornada normal de trabalho é […] produto de uma guerra civil de longa duração, mais ou menos oculta, entre a classe capitalista e a classe trabalhadora. Como a luta foi inaugurada no âmbito da indústria mais moderna, travou-se primeiro na terra natal dessa indústria, na Inglaterra. (p. 227)

Espraiando-se para outros países da Europa e das Américas, para Marx (1988, p. 181), a diminuição da jornada extensiva torna-se razão para a intensificação do trabalho, outra forma de extração de mais-valia absoluta, imposta pela burguesia para aumentar a produtividade. Mesmo assim, ele considera tal luta um marco na história da produção capitalista: é “uma luta entre o capitalista coletivo, isto é, a classe dos capitalistas, e o trabalhador coletivo, ou a classe trabalhadora”. Sendo um marco na luta de classes, ao longo do processo sócio-histórico, deu início, também, ao que Marx (1988) denomina de legislação fabril, precursora das legislações trabalhistas constituídas posteriormente.

Em meados do século XIX, as lutas estavam acirradas e os trabalhadores tinham a redução da jornada como centro, juntamente com outras questões que começaram a se colocar em função da ausência total de direitos vivida pela classe trabalhadora. É verdade que a derrota das revoluções proletárias de 1848 provocou um refluxo do movimento durante longo tempo, todavia, como aponta Netto (1992, p. 51) nos anos sessenta superasse o refluxo, “como o indica a Associação Internacional dos Trabalhadores”.

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Cleier Marconsin é Assistente Social. Doutora em Serviço Social. Professora-adjunta da Faculdade de Serviço Social (FSS) da UERJ. Pesquisadora do Observatório do Trabalho no Brasil/FSS/UERJ.

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