Configurações atuais do mundo do trabalho e as repercussões na vida dos trabalhadores: diálogos entre Harvey, Schumpeter e Sennett

Eduardo Girão Santiago

Fonte: XVIII Encontro Nacional de Economia Política, Belo Horizonte, 28 a 31 de maio de 2013.

Resumo: A partir da análise crítica sobre a degradação do trabalho e dos preocupantes índices de desemprego no mundo, divulgados pela Revista Trabajo da OIT, referentes aos anos de 2011 e 2012, o artigo ora apresentado traz para o diálogo teórico os seguintes autores: David Havey, que contextualiza o novo mundo do trabalho mediante o conceito de acumulação flexível de capital; Joseph Schumpeter e a sua teoria do desenvolvimento econômico, baseada no empreendedorismo e na destruição criadora e Richard Sennett, que analisa de forma transdisciplinar as repercussões dos novos atributos do novo capitalismo (flexibilidade, riscos, empreendedorismo, novas tecnologias, reengenharia) na vida dos trabalhadores. Partimos da hipótese de que as vertentes teóricas desses pensadores dialogam e se complementam para explicar que a preservação da acumulação flexível de capital no novo capitalismo suplantou qualquer possibilidade de ética do trabalho e de relações sociais laborais mais humanizadas, afetando a trajetória pessoal daqueles que estão inseridos nesta nova ordem global.

Sumário: Introdução | 1. Crise do fordismo, acumulação flexível e mudanças no mundo do trabalho | 2. O empreendedorismo schumpeteriano no sistema de relações sociais de trabalho flexível | Conclusão | Notas | Referências

Introdução

A Organização Internacional do Trabalho (OIT) divulgou em 2011 que dois terços das economias avançadas tornaram a apresentar retração no nível de emprego e que a recessão mundial que se alastra retardará a recuperação dos mercados de trabalho. Tal situação pode ser comprovada mediante um olhar nas estatísticas que indicam mais de um bilhão de trabalhadores em todo o mundo estarem sobrevivendo em precárias condições de trabalho.

Para se aquilatar a dimensão deste problema, cerca de 206 milhões de trabalhadores no mundo estão desempregados (OIT, 2012). O informe dessa agência internacional, relativo ao ano de 2012, alerta para o fato de que o mundo se defronta com o desafio urgente de criar 600 milhões de empregos para a próxima década para assegurar o desenvolvimento sustentável e a coesão social.

Diante destes indicadores da OIT, formula-se o seguinte questionamento: qual a perspectiva mundial para um processo civilizatório aceitável quando se sabe que, um em cada três trabalhadores no mundo está desempregado ou vive na pobreza? (OIT, 2012).

Todo o quadro há pouco referido tem gerado um mal-estar social que decorre da percepção da crise do capitalismo contemporâneo e do aumento do desemprego. É a própria OIT que revela, em seu informe de 2011, pesquisa que denota o descontentamento da população entrevistada acerca da debilidade dos mercados de trabalho em diversos quadrantes do Planeta.

Assim, na Europa Central, Oriental, e na África subsaariana, os níveis de insatisfação situam-se entre 70 e 80%. No Oriente Médio e no norte da África, 60% dos entrevistados revelaram grandes preocupações com a questão do desemprego. Egito, Jordânia e Líbano (epicentro de recentes protestos sociais e políticos) declararam que mais de três quartos de sua população estão descontentes com a situação dos seus mercados de trabalho.

Até mesmo nas economias avançadas o problema se apresenta de forma preocupante, marcadamente na Grécia, Itália, Portugal, Eslováquia e Espanha, onde mais de 70% dos seus cidadãos demonstraram inquietações com o mercado laboral.

Vale observar que, mesmo em algumas regiões como o sudeste da Ásia e da América Latina, que vêm apresentando uma evolução relativamente confortável em termos de geração e manutenção de empregos, a OIT registrou o fato de 50% da população chinesa ter demonstrado preocupação com as relações laborais, enquanto que em alguns países da América Latina e Caribe (República Dominicana, Equador, Haiti, Nicarágua e Uruguai) o grau de insatisfação com o mercado de trabalho superou os 60% (OIT, 2011).

Em vista do cenário há pouco descrito formulamos a hipótese de que o mesmo decorre das novas configurações da chamada acumulação flexível e dos seus determinantes como a supervalorização do capital e suas ondas especulativas; do imperativo permanente da competitividade das economias nacionais; da proeminência do empreendedorismo e do estímulo ao auto-emprego nas políticas públicas de trabalho e da escassez cíclica de postos de trabalho, bem como da incapacidade de as economias gerarem ou reporem o nível de emprego tradicional.

Vive-se uma era schumpeteriana marcada pela “destruição criativa” e pela incessante revolução tecnológica, resultando sociedades que naturalizaram o infortúnio dos sobrantes do capital que não conseguem se inserir no mercado de trabalho.

O artigo ora apresentado buscará fundamentações teóricas que poderão apresentar respostas e explicações para a compreensão da configuração atual do mundo do trabalho e das suas consequências na vida das pessoas. Assim, desenvolveremos aqui uma análise dialógica envolvendo os fundamentos da chamada acumulação flexível de capital de David Harvey com a abordagem do desenvolvimento econômico lastreado no empresário empreendedor de Schumpeter. Em seguida, traremos à tona, para o diálogo, a narrativa de Richard Sennett sobre os efeitos das tramas contemporâneas do capital que impelem os “homens schumpeterianos ideais” a serem flexíveis, flutuando na vida à deriva.

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Eduardo Girão Santiago é Professor Adjunto do Departamento de Ciências Sociais da Universidade Federal do Ceará.

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