Bancada ruralista dificulta fim de escravidão moderna, diz historiador

O historiador Jean Hébrard acaba de editar um número inteiro da revista online do Centro de Pesquisas sobre o Brasil Colonial e Contemporâneo, da Escola de Altos Estudos em Ciências Sociais (EHESS), em Paris, sobre a escravidão moderna no Brasil.

“Não é só um problema brasileiro”, diz o historiador. Ele explica que há várias facetas para definir o tema, como “perda de liberdade”, ou seja, de mobilidade, e “perda de dignidade”. Segundo Hébrard, é difícil quantificar o problema no Brasil, mas certamente “são mais de dez mil pessoas” nessa situação. “Pode ser 40 mil, 50 mil, não sabemos”.

Ele comenta que os únicos dados concretos são dos inquéritos realizados pelo Ministério do Trabalho, que por sua vez, só acontecem por meio de denúncias. “Mas claro que sabemos que os casos ultrapassam o número de denúncias”.

O historiador diz que o passado escravagista é muito forte no Brasil, último país do mundo a abolir a escravidão, em 1888. “Muito mais que na França”, compara. Hébrard conta que em 2003 o Congresso pensou em uma nova definição para o trabalho escravo, a partir de três noções básicas: de perda de mobilidade, condições degradantes e tempo de trabalho debilitante.

Força da bancada ruralista

Mas essas tentativas de mudanças sofrem cada vez mais a intervenção da poderosa bancada ruralista, alerta o historiador. Ele cita a proposta de fazendas que poderiam ser requisitadas com indenização, caso o proprietário fosse condenado. Em 2014, surgiu o projeto de tomada de propriedade sem indenização, mas que foi prontamente barrado pelos parlamentares ruralistas.

No Brasil, conta Hébrard, todas as regiões estão sujeitas à escravidão moderna. “Não é um problema só da zona rural, existe também em cidades grandes, como São Paulo, onde bolivianos trabalham na indústria têxtil para gigantes internacionais, como Zara”, diz.

Ele comenta que a soja e o açúcar não utilizam muito o trabalho escravo, pois é um setor totalmente mecanizado. “O trabalho escravo entra no momento do desmatamento, ou seja, na indústria madeireira e na produção de carvão”, acrescenta.

Fonte: RFI
Texto: Marília Alencar
Data original da publicação: 28/06/2017

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