Ações na Justiça devem aumentar após PEC das Domésticas, dizem juristas

A Proposta de Emenda Parlamentar número 66, popularmente chamada de PEC das Domésticas, foi regulamentada depois de dois anos de sua publicação, em 2012, mas as polêmicas devem continuar. Segundo especialistas em relações de trabalho, é provável que haja uma judicialização no médio prazo.

Entre as principais mudanças estipuladas pela PEC estão indenização em demissões sem justa causa, pagamento de horas extras, conta no FGTS e a alíquota de recolhimento do INSS.

Hoje, no Brasil, menos de 28% dos empregados domésticos são contratados com registro em carteira. Segundo dados da PNAD 2013, do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), 6,4 milhões desses trabalhadores (92,6%) são mulheres.

Para Fabíola Ferrari, advogada do Sindicato das Empregadas e Trabalhadores Domésticos da Grande São Paulo (SINDoméstica-SP), a PEC representa um grande avanço, mas a batalha agora é contra a desinformação. “O empregado doméstico é uma categoria que vem conquistando direitos a conta-gotas. Tem gente que trabalha 30 anos numa mesma casa e sai com uma mão na frente e outra atrás. Ao passo que outros profissionais gozam de diversos benefícios, se aposentam e têm renda. A aprovação da PEC acaba com essa injustiça ao formalizar e profissionalizar a função tão desrespeitada há décadas.”

O professor de Direito do Trabalho da Universidade de São Paulo (USP), Estêvão Mallet, acredita, no entanto, que não será fácil assegurar a eficácia da legislação aprovada. “Trata-se de uma profissão difícil de fiscalizar, de controlar as horas trabalhadas e isso, com certeza, levará a um aumento da judicialização”, afirma.

Para Mallet, a lei também tem alguns excessos, como a exigência de controle de ponto – não o pagamento de hora extra, que ele considera um avanço – , e a exigência de pagamento antecipado de multa de 40% por dispensa injustificada. “Isso onera o contratante diferente de uma empresa, por exemplo, que só paga depois da demissão.”

O professor também critica a redução do pagamento do INSS. Antes, o pagamento integral de INSS do empregador era de 12%; com a lei, passa para 8%, como forma de diminuir os encargos. “Quem vai pagar é a sociedade; não acho justo.”

Mesmo com esses pontos considerados negativos, o professor vê a nova legislação como um avanço. “É muito importante que se reconheça os direitos fundamentais da empregada. Além disso, tratar da profissionalização melhora a rotina de trabalho.”

Daniela Goldenstein, advogada especialista em direito do trabalho, também acredita que haverá aumento dos processos jurídicos. “Em três, quatro anos, teremos um efeito rebote, pois a pessoa física vai ser nocauteada com as atribuições jurídicas impostas. Não sou contra a regularização e formalização, mas ficou faltando pontos importantes. O poder judicário tem um problema: o Legislativo não sabe fazer lei, é pouco qualificado.”

Fabíola Marques, presidente da Comissão de Estudos de Direito Processual do Trabalho do Instituto dos Advogados de São Paulo (IASP) acredita no aumento da judicialização ao passo em que os direitos se tornem mais conhecidos. “Na prática, isso vai dar muita confusão no começo. Tenho visto a tendência da pessoa física, no caso o contratante, procurar os serviços de um contador. É um problema, porque ele não é formado em direito, sabe os meandros tributários, mas não conhece a parte jurídica.”

Uma boa ajuda deve vir do Simples Doméstico – forma de recolhimento dos encargos para o trabalhadores domésticos, que será utilizado pelo empregador e deverá ser finalizado pelo governo em até 120 dias a contar da data de publicação da PEC, ocorrida em 2 de junho. “Espero que seja realmente simples. Valores de impostos e encargos já aumentaram consideravelmente. A maior parte dos empregadores que não descontava o INSS, agora vai descontar do empregado. Tem muita coisa ainda por acontecer”, avalia Fabíola Marques.

Babás

Um dos pontos controversos é se uma babá ou empregada doméstica terá de registrar a pessoa que cuida de seus filhos enquanto está cuidando das crianças da patroa ou patrão. “Como a lei vale para todos, terá de registrar e pagar os encargos, horas extras, mas apenas se o trabalho for executado dentro da casa do contratante, como define a lei”, explica Fabíola Ferrari, do SINDoméstica-SP.  Isso significa que se a empregada doméstica leva os filhos para que fiquem na casa da vizinha, o trabalho da vizinha não é considerado como trabalho doméstico.”

A lei complementar 150 define o empregado doméstico como pessoa ou família que presta serviço no âmbito residencial dessa família. “Ou seja, tem de trabalhar dentro da casa de outra pessoa para se estabelecer a relação doméstica. Nesse caso, a PEC das Domésticas não se encaixa a essa relação da babá ou vizinha que leva o filho da empregada doméstica para sua própria casa. Nesse caso, como há uma prestação de serviço, pode haver complicações na esfera civil, mas não é emprego doméstico.”

O professor Mallet lembra outro ponto: só existe trabalho doméstico se for realizado pelo menos três vezes por semana. Antes era o Tribunal Superior de Justiça que julgava esses casos para estabelecer vínculo, agora é a lei. “Também são considerados domésticos locais equiparados a casas, como sítio ou carro. Por esse motivo, motoristas e caseiros se encaixam, por exemplo”, afirma Mallet.

A advogada do sindicato das domésticas lembra ainda que PEC avançou no sentido de fazer um contrato parcial, para jornadas de trabalho menores, ou de meio período. “Assim, todo profissional doméstico ganhou a possibilidade de trabalhar menos horas, desde que tenha sido feito um acordo. Então o salário, recolhimentos e encargos ficam menores. Paga-se proporcional. O que falta muitas vezes é informação.”

Fonte: IG
Texto: Maíra Teixeira
Data original da publicação: 17/06/2015

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