Classe trabalhadora à brasileira

Da imigração operária e das primeiras greves à CLT. Da resistência à ditadura à luta contra o desmonte neoliberal. No Primeiro de Maio, vale revisitar a história das lutas laborais no Brasil, e seu grande desafio: como enfrentar as mudanças no mundo do trabalho?

Ricardo Antunes

Fonte: Outras Palavras
Data original da publicação: 30/04/2019

Nas origens do proletariado brasileiro

Os primeiros núcleos industriais no Brasil surgiram em meados do século XIX, vinculados às atividades predominantemente manufatureiras, mas foi com a Primeira Guerra Mundial que houve um avanço significativo no processo de industrialização. Foi nesse momento que se intensificou o fluxo migratório, especialmente europeu, em busca de trabalho no país.

Foi nesse contexto de advento dos primeiros núcleos industriais que se desenvolveu inicialmente a influência anarco-sindicalista, bem como a socialista e posteriormente a comunista. Em 1922, sob influência da Revolução Russa, foi fundado o Partido Comunista Brasileiro (PCB), que, em sua origem, foi herdeiro de forte influência anarquista, uma vez que seus principais fundadores eram quase todos egressos do movimento libertário. Vale lembrar que o socialismo reformista, sob influência da Segunda Internacional, não teve presença marcante no Brasil.
Em verdade, havia uma forte disputa de hegemonia, inicialmente entre o anarco-sindicalismo e o reformismo oficialista, designado de “sindicalismo amarelo”, e, depois da fundação do PCB, com os comunistas.

Foi por meio do surto industrial, no início do século XX, que se deu a expansão da classe operária, especialmente nos ramos têxtil, metalúrgico, alimentício etc. É bom enfatizar, entretanto, que, dada a particularidade da subordinação e dependência estrutural do capitalismo brasileiro aos países centrais e hegemônicos, o padrão de acumulação de base taylorista e fordista teve desde sua origem um caráter periférico, subordinado e hipertardio em relação àquele que se desenvolveu nos Estados Unidos e na Europa Ocidental, sustentando-se sempre na vigência de um enorme processo de superexploração do trabalho, que combinava, de modo intensificado, a extração absoluta e relativa da mais-valia, oferecendo forte incentivo para a acumulação industrial nascente.

A emergência do getulismo: uma “revolução” sem revolução

Foi sob essa contextualidade que eclodiu a chamada Revolução de 1930 e o advento do getulismo, ou varguismo, e sua política de industrialização do país. Pela primeira vez, estruturava-se um projeto burguês nacionalista, cujo eixo da política social era voltado para a cooptação da classe trabalhadora e sua subordinação aos interesses do capital e do Estado.

Início do longo período getulista, a Revolução de 1930 constituiu um movimento político-militar que foi algo mais do que um golpe e menos do que uma revolução (burguesa). Economicamente industrializante, estava estruturada por meio de um Estado forte e centralizado e, especialmente após o golpe do Estado Novo, em 1937, assumiu clara feição ditatorial e bonapartista que perdurou até 1945, quando Vargas foi deposto por outro golpe de Estado. Reeleito pelo voto direto em 1950, nessa nova fase o governo Vargas tornou-se mais reformista e menos ditatorial.

Tal experiência foi marcante para o movimento operário brasileiro, pois durante o getulismo erigiu-se uma legislação trabalhista que foi essencial para a viabilização do projeto de industrialização do país. Há décadas os trabalhadores brasileiros vinham lutando pelo direito de férias, pela redução da jornada de trabalho, pelo descanso semanal remunerado, pelo direito à greve e à liberdade de organização, entre outras bandeiras que pautavam a luta operária. Vargas, entretanto, ao atender tais reivindicações, procurou apresentá-las como se fossem uma dádiva aos trabalhadores, assemelhando-se a uma forma de Estado benefactor.

O apoio que recebia dos assalariados urbanos permitia o equilíbrio necessário para manter o seu projeto burguês respaldado em uma aliança policlassista. Expressando uma espécie de variante bonapartista nos trópicos, Vargas contava com o apoio das massas trabalhadoras para lhe dar sustentação em sua relação com as distintas frações das classes dominantes agrárias, além da nascente e ainda incipiente burguesia industrial. Mas, paralelamente à política de cooptação das massas, o getulismo combateu de maneira intensa as lideranças operárias e sindicais de esquerda, todos alvos de fortíssima repressão, acentuada depois da eclosão da Aliança Nacional Libertadora, de 1935.

No âmbito sindical havia uma clara oscilação no movimento sob liderança do PCB entre aceitar, de algum modo, certa presença do Estado na estrutura sindical e lutar pela plena autonomia, liberdade e independência sindicais frente ao Estado e à burguesia. Essa oscilação impediu que a oposição à estrutura sindical herdeira do getulismo – uma variante de sindicalismo de Estado – fosse efetivamente conquistada.

Isso configurou uma clara descontinuidade, nesse ponto, em relação ao movimento operário do pós-1964, que foi menos político em suas definições e mais confrontacionista em suas práticas e lutas. O que configura certo paradoxo: antes de 1964, o sindicalismo foi fortemente político e menos autônomo em suas ações. O movimento operário e sindical estruturava-se prioritariamente nas empresas estatais, como as ferroviárias, portuárias e marítimas, onde era maior a presença do PCB. No período de ressurgimento operário e sindical sob a ditadura militar, ao contrário, o (novo) sindicalismo foi menos político em sua conformação e definição e mais fortemente autônomo em suas ações.

É bom lembrar que frequentemente as bases operárias vinculadas ao PCB (ou fora dele) transbordavam o espaço limitado estabelecido pelo projeto nacional-desenvolvimentista, intensificando a luta de classes presente no chão das fábricas e das empresas. Foram particularmente importantes a greve geral de 1953, as inúmeras paralisações desencadeadas durante o governo Goulart por aumentos salariais e melhores condições de trabalho, como a greve geral de 1963, e ainda as distintas paralisações explicitamente políticas, que objetivavam conquistas democráticas e contrárias à tendência militar golpista, descontente com os rumos do governo.

Vivenciou-se naqueles anos um enorme avanço das lutas dos trabalhadores no campo, voltadas tanto para a realização da reforma agrária e do combate ao latifúndio e à concentração da propriedade agrária no Brasil como para a ampliação da legislação do trabalho no campo. Foi importante manifestação dessas lutas a criação, em 1955, da primeira Liga Camponesa, no Engenho Galileia, no Nordeste, liderada por Francisco Julião. A organização tinha como prioridade a defesa dos direitos dos trabalhadores rurais e, posteriormente, espalhou-se pelo nordeste brasileiro.

Esse avanço efetivo da luta dos trabalhadores rurais levou à fundação da Confederação Nacional dos Trabalhadores Agrícolas (Contag), em 1963, sob hegemonia do PCB, que fortaleceu ainda mais a luta dos camponeses e dos trabalhadores rurais pelo fim da concentração fundiária da terra. Foi a única confederação que não teve origem estatal e “pelega”, mas que era resultado concreto das lutas sociais no campo.

Foi nessa conjuntura que se deu a criação do Comando Geral dos Trabalhadores (CGT), resultado de várias greves ocorridas no início dos anos 1960 e que, sob a liderança do PCB, teve significativa influência no movimento operário e sindical, chegando inclusive a influenciar os militares de base, soldados e cabos que também ameaçavam sublevar-se. No cenário estudantil, a União Nacional dos Estudantes (UNE) ampliava as mobilizações, lutando pela reforma universitária e participando ativamente das lutas políticas do país.

Na esquerda, o quadro também começava a se alterar, ampliando o leque de organizações. No PCB, por exemplo, deu-se a cisão que levou ao PC do Brasil – que naquele período tinha relações com a China e sofria influência do maoismo –, além do advento de vários grupos e movimentos de esquerda, alguns ligados à Quarta Internacional ou à esquerda católica, entre outros.

Ampliavam-se as pressões tanto pelas “reformas de base” (reforma agrária, urbana, universitária etc.) quanto pela conquista do socialismo, contra a moderação do PCB e sua política nacionalista e policlassista.

Descontentes com o avanço da luta popular, os mais distintos setores burgueses, com o claro apoio norte-americano, em abril de 1964, desencadearam um golpe militar que marcou a longa noite da ditadura, prolongada até 1985. Os partidos de esquerda foram declarados ilegais, mantendo-se somente dois partidos oficiais. Houve intervenção em centenas de sindicatos, sendo que a CGT e a UNE também foram proibidas.

Temerosas frente ao avanço popular, as classes dominantes responderam com um golpe militar – em verdade, uma contrarrevolução, na precisa caracterização feita por Florestan Fernandes. Principiava, então, uma era de derrotas para as forças sociais oriundas do trabalho. A repressão ao movimento operário organizado, aos sindicatos, aos movimentos sociais rurais e às esquerdas abria caminho para a inserção ainda maior do Brasil no processo de internacionalização do capital.

Avança a contrarrevolução: o difícil (e longo) período da Ditadura Militar

Contrariamente ao teor nacionalista anterior, o golpe militar desenvolveu uma variante de Estado autocrático-burguês, fortemente repressivo em relação ao movimento operário e que gerou um projeto capitalista cujo padrão de acumulação industrial tinha uma estrutura produtiva bifronte. De um lado, estruturou-se a produção de bens de consumo duráveis, como automóveis, eletrodomésticos etc., para um mercado interno restrito e seletivo, composto pelas classes dominantes e por parcela significativa das classes médias, especialmente seus estratos mais altos. De outro, desenvolveu-se um polo voltado para a exportação, não só de produtos primários, mas também de produtos industrializados de consumo.

Foi nessa contextualidade que se gestou, em meados dos anos 1970, o chamado novo sindicalismo. Depois de vários anos de repressão e controle – intensificados a partir da eclosão das greves de Contagem (Minas Gerais) e Osasco (São Paulo), em 1968 –, pouco a pouco, em uma ação pautada por claros traços de espontaneidade (uma vez que havia razoável distanciamento entre essas ações que emergiram inicialmente no ABC paulista e os partidos de esquerda tradicionais), as greves foram sendo tecidas no solo fabril, especialmente na segunda metade dos anos 1970, o que levou, na década seguinte, à eclosão de um movimento operário e sindical de grande envergadura.

Tratava-se, então, do ressurgimento do movimento operário e sindical no Brasil, estruturado em bases relativamente distintas daquelas vigentes no período pré-1964. Se na fase anterior havia a prevalência dos trabalhadores das empresas estatais, nos anos 1970-1980 o principal núcleo das lutas operárias estava mais próximo do operariado metalúrgico, com destaque para o cinturão industrial do ABC paulista, um dos mais expressivos do mundo – uma espécie de Detroit brasileira –, onde originou-se a liderança de Luiz Inácio Lula da Silva.

As três greves operárias do ABC paulista, desencadeadas em 1978, 1979 e 1980, são exemplares desse novo patamar da luta de classes depois de uma dura fase de repressão. Finalmente, ressurgia uma fase de intensas greves, combinando paralisações dentro das fábricas, como em 1978, com ações coletivas de massa e confronto nas ruas, como em 1979 e 1980, cabendo ao operariado metalúrgico o papel de centralidade nessas lutas.

O movimento estudantil e a luta pela anistia e pela democratização da sociedade brasileira, em curso há vários anos, ganharam força e densidade por meio da explosão operária. Foi esse majestoso ciclo de greves, no fim da década de 1970, que criou as condições para que se deslanchasse uma fase espetacular das lutas sociais no Brasil, nos anos 1980. Entre elas, podemos destacar a ampliação e mesmo generalização desse ciclo, desencadeado pelos mais variados segmentos de trabalhadores, iniciando-se com os operários metalúrgicos e abarcando químicos, petroleiros, construtores civis, assalariados rurais, funcionários públicos, professores, bancários, médicos etc., em um vasto movimento de massas que se notabilizou ainda pela eclosão de várias greves gerais por categoria (como a dos bancários, em 1995), greves com ocupação de fábricas (como a da General Motors, em São José dos Campos, em 1985, e a da Companhia Siderúrgica Nacional, em Volta Redonda, em 1988), além de uma gama enorme de greves por empresas, que se espalharam por todo o país.

A década de 1980 vivenciou o desenvolvimento de quatro greves gerais nacionais, sendo que a mais expressiva ocorreu em março de 1989, paralisando aproximadamente 35 milhões de trabalhadores – a mais abrangente greve geral da história do movimento operário brasileiro. Além desses traços fortes, o avanço da organização sindical dos assalariados rurais se ampliou significativamente, permitindo a reestruturação organizacional dos trabalhadores do campo. O sindicalismo rural, nessa nova fase, desenvolveu-se com forte presença da esquerda católica, que influenciou, posteriormente, o nascimento do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), em 1984.

Foi nesse mesmo ciclo que presenciamos o surgimento das centrais sindicais, como a Central Única dos Trabalhadores (CUT), fundada em 1983 e inspirada, em sua origem, em um sindicalismo classista, autônomo e independente do Estado. Herdeira das lutas sindicais das décadas anteriores, especialmente dos anos 1970, a CUT resultou especialmente da confluência entre o novo sindicalismo, nascido no interior da estrutura sindical daquele período (do qual o Sindicato dos Metalúrgicos de São Bernardo era melhor exemplo), e o movimento das oposições sindicais (de que foram exemplos o Movimento de Oposição Metalúrgica de São Paulo (MOMSP) e a Oposição Metalúrgica de Campinas), que atuavam fora da estrutura sindical oficial e combatiam seu sentido estatal, subordinado, atrelado e verticalizado, além de importantes setores do sindicalismo e das oposições sindicais que atuavam no campo, entre outras vertentes.

Dado o caráter estatista da estrutura sindical, procurou-se avançar também na organização operária nos locais de trabalho, por meio da criação das comissões de fábricas de que foram exemplos as comissões autônomas de São Paulo (como a da Asama, sob influência do MOMSP) e as comissões sindicais de fábricas do ABC (como a da Ford, vinculada ao Sindicato dos Metalúrgicos de São Bernardo).

Mas, se nos anos 1980 o sindicalismo brasileiro caminhou, em boa medida, no contrafluxo das tendências críticas presentes no sindicalismo dos países capitalistas avançados, já nos últimos anos daquela década começavam a despontar as tendências econômicas, políticas e ideológicas que foram responsáveis pela inserção de parcela significativa do sindicalismo brasileiro na onda regressiva, resultado tanto da intensidade da reestruturação produtiva do capital – dada a nova divisão internacional do trabalho na fase de mundialização do capital sob clara hegemonia financeira – quanto da emergência do neoliberalismo e sua virulência no universo ideopolítico, acarretando um refluxo no novo sindicalismo.

Do desmonte neoliberal à nova morfologia do trabalho e seus desafios

A complexa simbiose entre neoliberalismo e reestruturação produtiva trouxe consequências muito profundas para o universo da classe trabalhadora, o movimento sindical e a esquerda brasileira.

Mas esse processo não se deu sem resistência. Ao contrário, foi um período de muitas lutas sociais, iniciada com a histórica greve dos petroleiros de 1995, que procurava impedir o desmonte da Petrobras, bem como a destruição dos direitos sociais da categoria. Esta paralisação geral foi reprimida de maneira violenta pelo governo FHC, por meio do Exército, da polícia, do Judiciário, da mídia etc., todos fortemente articulados para derrotar os petroleiros. Algo similar ocorrera anteriormente na Inglaterra de Margaret Thatcher. Para consolidar o nefasto neoliberalismo britânico recém-iniciado, seu governo vilipendiou a heroica greve dos mineiros de 1983-1984, aprofundando o ideário e a pragmática neoliberais naquele país. O mesmo fez FHC no Brasil, uma década depois, na greve dos petroleiros que durou 31 dias e abalou o país.

Do mesmo modo, ocorreram inúmeras greves de resistência dos funcionários públicos, trabalhadores rurais e professores, entre outras categorias. A greve geral dos bancários de 1995 também teve enorme significado político e de confronto ao governo FHC e foi vitoriosa.

Merece particular destaque a ação de luta e resistência do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), o mais importante movimento social e político do Brasil. Sendo dotado de uma estruturação nacional solidamente organizada pela base, sua ação de confronto à propriedade privada da terra permite aos trabalhadores vislumbrar uma vida cotidiana dotada de sentido. Por meio dessa luta vital – a posse da terra como resgate do sentido da vida –, o MST tem confrontado fortemente a política econômica dominante no país, tendo inclusive realizado uma maciça campanha popular contra a Área de Livre Comércio das Américas (Alca). Do mesmo modo, seu combate aos transgênicos e sua ação ambiental de preservação da natureza contra a lógica destrutiva do agronegócio também têm sido decisivos.

Sendo o mais importante movimento social e político do país, o MST vem auxiliando na organização de outros movimentos populares, como dos sem teto e sem casa e dos desempregados, além de desempenhar um importante papel nas lutas sociais latino-americanas e participar, por meio da Via Campesina e do Fórum Social Mundial, das lutas antiglobalização.

Mas, se foi possível vivenciar esse significativo avanço do MST, é preciso lembrar que a década de 1990 – que denominei de a era da desertificação neoliberal no Brasil – foi pouco a pouco tornando mais defensivo o novo sindicalismo que, por um lado, enfrentava o sindicalismo neoliberal, presente na Força Sindical, e, por outro lado, sofria as consequências da influência oriunda do sindicalismo social-democrático europeu, cada vez mais presente no interior da CUT.

Esse sindicalismo contratualista, embora procure apresentar-se como a alternativa possível para o combate ao neoliberalismo, distancia-se de maneira crescente da alternativa socialista que foi decisiva na fundação da CUT e se aproxima da agenda neoliberal, como demonstram vários exemplos da sua prática no Brasil recente.

Os setores claramente socialistas e anticapitalistas encontraram-se, em 2007, ou aglutinados na Coordenação Nacional de Lutas (Conlutas), criada em 2005 e aberta não só aos sindicatos, mas também à organização dos movimentos e das lutas sociais, ou na Intersindical, tendência também de esquerda, porém de perfil mais acentuadamente sindical e que, em 2007, discutiu se devia manter-se dentro ou buscar novas alternativas fora da CUT, tendência esta que parece ser majoritária.

A vitória eleitoral de Lula e do Partido dos Trabalhadores nas eleições de 2002, bem como a política sindical que se desenvolveu, procurou envolver diretamente os sindicatos na gestão dos fundos de pensão e dependentes de recursos estatais, medidas cujas consequências são profundas quando se trata de definir o sentido geral da ação sindical e sua autonomia e independência. De um sindicalismo de confrontação transita-se, então, para uma modalidade de sindicalismo negocial.

Os desafios sindicais são, então, de grande monta. Há um (novo) desenho compósito, heterogêneo e multifacetado que caracteriza a nova morfologia do trabalho no Brasil. Além das clivagens entre trabalhadores estáveis e precários; de gênero, geracionais e étnicas; entre trabalhadores qualificados e desqualificados; empregados e desempregados; além da necessidade imperiosa de superar o produtivismo por uma concepção ambiental que articule ecologia e socialismo, temos ainda as estratificações e fragmentações que se acentuam em função do processo crescente de internacionalização do capital, entre tantos outros desafios.

Essa nova morfologia do trabalho, da qual indicamos aqui apenas alguns pontos centrais, não poderia deixar de ter repercussões junto aos organismos de representação dos trabalhadores. Para concluir, desejamos somente registrar que a nova morfologia do trabalho vem significando também um novo desenho das formas de representação das forças sociais do trabalho. Se as indústrias taylorista e fordista são parte mais do passado do que do presente (ao menos enquanto tendência), como imaginar que um sindicalismo verticalizado possa representar esse novo e compósito mundo do trabalho?

Recuperar, no início deste século XXI, um novo sentido de classe, de base e de autonomia dos sindicatos talvez seja seu desafio mais fundamental.

Nota:

O trecho acima é um capítulo de O continente do labor, de Ricardo Antunes, publicado pela Editora Boitempo.

Ricardo Antunes é um sociólogo marxista brasileiro. Atualmente é professor titular da Universidade Estadual de Campinas.

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