Há 10 anos, era promulgada a Emenda Constitucional nº 72, a chamada PEC das Domésticas, que estendeu direitos previstos na CLT à categoria
Igor Natusch
Há sete anos, direitos fundamentais para o ambiente de trabalho brasileiro eram finalmente estendidos às trabalhadoras domésticas. Por meio da Emenda Constitucional nº72, promulgada no dia 2 de abril de 2013 e conhecida até hoje como PEC das Domésticas, direitos como FGTS, seguro-desemprego, adicional noturno, hora extra, salário-família e jornada semanal de 44 horas passaram a fazer parte do horizonte de de um dos setores mais precarizados do universo de trabalho do país. Uma mudança que, é claro, ainda precisa avançar um longo caminho até sua efetiva aplicação.
Segundo dados da Pesquina Nacional de Amostragem por Domicílio (Pnad) do IBGE, o Brasil alcançou, no último trimestre de 2019, o número recorde de 6,3 milhões de brasileiras atuando no serviço doméstico. Dessas, 97% são mulheres, a maioria negras e de baixa escolaridade – e apenas 1,7 milhão dessas trabalhadoras atua com carteira assinada. A uma realidade marcada pela informalidade e pela baixa remuneração, soma-se a organização sindical precária e a vulnerabilidade no local de trabalho, com alta incidência de assédio e comportamento abusivo por parte dos patrões.
Antes de 2013, é possível dizer que essa enorme massa de trabalhadoras vivia uma situação permanente de subemprego, com elementos típicos de uma cultura escravagista. A primeira legislação sobre o tema no Brasil é de 1830, e limitava-se a tratar da prestação de serviços feitos por brasileiros ou estrangeiros, dentro ou fora do Império. A Lei Áurea, por sua vez, não tinha qualquer caráter de proteção ao trabalho, de forma que a situação de escravos e escravas nas propriedades dos senhores não chegou a sofrer grandes alterações.
Em 1916, o Código Civil disciplinou o contrato mediante retribuição para prestação de serviços – o que, por analogia, foi aplicado frequentemente a questões relativas ao trabalho doméstico. A conceituação das trabalhadoras domésticas viria em 1941 (Decreto-Lei nº 3.078), mas elas só começaram a ter direitos regulamentados em 1972, quando a Lei nº 5.859 trouxe o acesso à Previdência, férias anuais e assinatura em carteira de trabalho. A Constituição de 1988 garantiu alguns direitos, como aposentadoria por tempo de contribuição e 13º salário, e a Lei nº 11.324/2006 agregou descanso semanal remunerado, garantias de emprego à trabalhadora gestante e vedação a descontos salariais por iniciativa do empregador.
Mas foi apenas a partir das mudanças constitucionais de 2013 que essas mulheres foram equiparadas aos demais empregados celetistas, tendo direito aos mesmos benefícios de todos que trabalham com carteira assinada. O problema, a partir de então, é garantir que esses direitos sejam respeitados – além de romper com a ampla tendência de trabalho informal, potencializada pela crise econômica e pelos elevados índices de desemprego.
A Emenda Constitucional nº72 foi regulamentada em 2015, por meio da Lei Complementar nº 150. No final de 2017, o Decreto Legislativo nº 172 fez do Brasil um dos signatários da Convenção 189 e da Recomendação 201 da Organização Internacional do Trabalho (OIT) – o que não mudou muita coisa na prática, já que o Brasil atende a exigência de equiparar domésticas aos demais trabalhadores, mas evita retrocessos enquanto essa assinatura estiver em vigor.